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18 de abril de 2024No último dia 26 de abril, a Câmara dos Deputados aprovou emenda à Medida Provisória nº 1.089/2021 (a MP do Voo Simples) que retoma a franquia pelas companhias aéreas no despacho de bagagens.O texto insere o inciso XV no artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), reputando ser prática abusiva a cobrança de taxas pelo despacho de um volume de bagagem de até 23 quilos em voos nacionais e de até 30 quilos em voos internacionais. A redação da MP aprovada pela Câmara, que resultou no Projeto de Lei de Conversão (PLV) 5/2022, e também aprovada pelo plenário do Senado em 17 de maio, e os debates acerca das vantagens e desvantagens do retorno da franquia de bagagens dividem opiniões.
Em março de 2017, a partir da vigência da Resolução nº 400/2016, a Agência Nacional da Aviação Civil (Anac) autorizou a cobrança pelo despacho de bagagens, independentemente do seu peso, ponderando que o serviço configura contrato acessório ao de transporte de passageiros (artigo 13, caput). Em contrapartida, determinou que as companhias aéreas assegurassem franquia mínima de 10 quilos de bagagem de mão por passageiro (artigo 14, caput). O argumento utilizado como justificativa para tal foi o de que as novas regras impactariam na redução do preço das passagens aéreas e permitiriam a entrada das companhias aéreas low cost (baixo custo) no país.
Tais questões, contudo, não se concretizaram. Os consumidores brasileiros passaram a pagar mais caro pelas passagens aéreas, arcando ainda com eventuais taxas para despacho de bagagens e valores de alimentação a bordo. Também não se observou o ingresso no mercado interno de empresas estrangeiras low cost, continuando-se com o protagonismo das companhias aéreas nacionais Azul, Gol e Latam — nem mesmo a Itapemirim, que adveio com a proposta de se tornar uma low cost,teve êxito.
Na audiência pública realizada no Senado em 05 de maio, parlamentares ponderaram que o setor já prestou, em tempos pretéritos, melhores serviços com preços menores e melhor atendimento a bordo. E o advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Walter Faiad, referiu não ser mais possível aceitar-se promessas como essas, asseverando que, em razão das dimensões continentais do país, os brasileiros necessitam muitas vezes despachar bagagem, diferentemente, por exemplo, dos cidadãos suíços em suas viagens nacionais.
Em sentido diverso, o presidente da Associação Brasileira de Empresas Aéreas (Abear), Eduardo Sanowicz, afirmou que a bagagem gratuita seria um falso mito, porquanto, quando vigente a franquia, dividiam-se os custos entre todos os passageiros, de modo que \”quem fazia viagem curta e de bate-volta pagava para os demais\”. Já o secretário nacional de Aviação Civil, Ronei Saggioro Glanzmann, apontou que o retorno da franquia vai contra o objetivo da MP de incentivar a concorrência no setor, e o diretor-presidente da Anac, Juliano Alcântara Noman, complementou que a cobrança de bagagens alinhara o país ao mercado internacional.
A Associação Internacional de Transportes Aéreos (Iata) se manifestou, dias antes, no sentido de que a retomada da franquia desencoraja investimentos de empresas internacionais, reduz a competitividade e viola acordos internacionais (em especial o Tratado de Céus Abertos.Outras entidades que representam companhias aéreas, tais como a Abear, a A4A (Airlines for America), a Alta (Latin America and Caribbean Air Transport Association) e a Jurcaib (Junta dos Representantes das Companhias Aéreas Internacionais do Brasil),igualmente argumentam que o retorno da franquia contraria o Acordo de Céus Abertos entre Estados Unidos e Brasil e o Acordo de Céus Abertos da Comissão Latino-Americana de Aviação Civil (Clac) ante a interferência governamental nos preços de serviços das transportadoras aéreas.
Entende-se que a medida não viola os mencionados acordos internacionais.Isso, porque os tratados sobre \’céus abertos\’ são nada mais do que uma política avançada pelos Estados Unidos ao final da década de 1970 que visa impedir a criação de obstáculos para a aviação civil, a qual contempla, hoje, uma serie de tratados internacionais bi, pluri e multilaterais firmados entre nações. Assim, destinam-se a flexibilizar a soberania estatal no que tange a decisões adotadas para a aviação civil comercial, seja em relação à criação de rotas, acesso igualitário às instalações aeroportuárias, capacidade de atendimento, frequência,seja em relação à fixação de preços, fomentando um serviço acessível, contínuo e equilibrado.
Entre os seus objetivos estão o estímulo à concorrência e o aumento da eficiência empresarial e da segurança no setor, além da elevação do bem-estar coletivo em função do tipo de serviço prestado, o que toca, portanto, na abertura do setor ao acesso de novas empresas e na liberdade de preços dos bilhetes, mas com limites. A aplicação destes documentos preza, assim, pela liberdade comercial para o desenvolvimento do setor \”sem ônus significativos ao consumidor\” e, consoante refere o Departamento de Estado dos EUA, tais acordos \”são pró-consumidor, pró-concorrência e pró-desenvolvimento\”.
A determinação por lei de franquia de bagagem para um volume de 23 ou 30 quilos não só se alinha aos mencionados objetivos, como também respeita a prevalência do CDC, haja vista que, mesmo que esses tratados prevejam a liberdade de estipulação de tarifas sobre bagagens despachadas, no Brasil, seriam internalizados com peso de Lei Ordinária por não versarem sobre direitos humanos, e ainda que supervenientes ao CDC, em caso de choque normativo, eles não prevaleceriam em virtude de a lei consumerista ser norma de Ordem Pública (artigo 1), o que lhe garante aplicação preferencial no ordenamento interno brasileiro.
Reitere-se, no mais, que, enquanto vigente a cobrança pelo despacho de bagagens, em primeiro lugar,não houve ingresso massivo de companhias low cost. Além da situação da Itapemirim já referida, no transporte internacional de passageiros podem-se citar quatro empresas apenas: FlyBondi, argentina, que já não opera mais no país em razão de problemas em seu país de origem; Jet Smart, chilena, que ainda não voltou a operar no Brasil após a decretação do Estado Pandêmico; Norwegian, europeia, que deixou de operar no país em função de reestruturação interna; e Sky Airlines, chilena, que depende da desaceleração da pandemia de Covid-19 para voltar a operar no Brasil. Ou seja, não será a franquia um divisor de águas, tal como no passado pré-pandêmico não o fora.
Tampouco houve, em segundo lugar, a esperada redução do preço das passagens, um dos aspectos cruciais considerados pelo Senado quando da confirmação do texto da Câmara em relação à franquia de bagagens. O próprio governo federal chegou a afirmar que, antes da pandemia de Covid-19 estourar, o motivo pelo qual alguns trechos internacionais partindo do Brasil estarem diminuindo de preço foi a redução da faixa de lucro das empresas, haja vista o oferecimento de um maior número de opções ao consumidor. Ou seja, foi a concorrência que ensejou a diminuição dos preços antes praticados, e não a possibilidade de cobrança por bagagem despachada.
Ao que tudo indica, não é a franquia de bagagens que obsta tais questões, mas sim o elevado custo do querosene, de tarifas aeroportuárias, de tributos e de despesas operacionais.Não é por outra razão que a alteração realizada pela Câmara, agora confirmada pelo Senado, combate alguns destes pontos, a exemplo da extinção de tarifas aeroportuárias devidas pelas companhias aéreas e passageiros pelo uso da infraestrutura, modificando a Lei Federal nº 6.009/73, que aponta a cobrança de tarifas de embarque, conexão, pouso e armazenagem. Ocorre que este valor não é repassado às companhias aéreas que operam no país, o que faz com que este não seja um ponto combatido por elas.
No que toca às empresas, o PLV apenas assegura o direito dos passageiros de despachar volume único de bagagem (de até 23 ou 30 quilos, a depender do destino) sem desembolsar taxa extra, assegurando maior transparência na relação entre consumidor e transportador e evitando que o valor final se torne demasiadamente elevado, o que poderia inclusive levar à contínua retração na demanda pelo serviço em meio a um cenário ainda muito atingido pelos impactos da pandemia, fato certamente indesejado pelo setor.
De se recordar, no mais, que,em abril, as empresas aéreas que operam no mercado interno aumentaram o valor do despacho de bagagens sob a justificativa da Guerra da Ucrânia e do aumento do valor do querosene para a aviação, na tentativa de readequar os preços praticados no setor, os quais — registre-se — já se encontravam entre 40% e 50% mais caros quando em comparação com o mês anterior. Essa medida foi largamente questionada por Procons de diversos estados justamente porque, sem o devido esclarecimento quanto aos valores discriminados dos itens que compõem o serviço, estar-se-ia potencialmente diante de conduta abusiva e não-transparente. Afinal, o serviço em si seria o mesmo. As empresas não responderam.
Considerando, pois, que o retorno da franquia de bagagem despachada não implica interferência do governo no preço das passagens, não reduz a concorrência, não viola acordos internacionais e tampouco tem o condão de, por si só, afastar o interesse de transportadoras low cost no mercado interno, e que o Congresso Nacional tem o dever constitucional (artigo 5º, XXII) de assegurar os interesses do consumidor, parte vulnerável da relação, tem-se que correta e adequada a manutenção pelo Senado da modificação aprovada na Câmara.
Agora, em que pese o PLV voltar à Câmara em virtude de outras modificações realizadas pelos Senadores, no ponto da gratuidade, o texto não poderá mais ser alterado. Por outro lado, posteriormente, ele seguirá à sanção presidencial, de modo que a medida poderá ser vetada pelo Presidente, tal como já o fez em junho de 2019. Apesar disso, esperamos que isso não ocorra. Até mesmo porque, entendemos que as alterações advindas deste projeto vão ao encontro dos interesses dos passageiros e também das transportadoras, pois são assegurados distintos avanços ao setor aéreo, além de, é claro, resgatar-se direito importante dos consumidores no ambiente pós-pandêmico.