O juiz da corte distrital de Columbia (EUA), John D. Bates, determinou, na última terça-feira, o desbloqueio de US$ 500 milhões das contas do banqueiro Daniel Dantas – acusado de uma série de crimes financeiros como lavagem de dinheiro – e de outros investidores do Banco Opportunity. Em janeiro, o Ministério da Justiça conseguiu bloquear mais de US$ 2 bilhões em contas bancárias mantidas no exterior e relacionadas à Operação Satiagraha. Desse total, US$ 500 milhões estão nos Estados Unidos.
Para o Ministério da Justiça, a decisão da Justiça americana abre um precedente grave porque pode criar a possibilidade de descongelamento de outros recursos do banqueiro e de demandas similares. Além disso, para o governo brasileiro, a decisão contrariaria a Convenção de Palermo, que prevê a colaboração mútua no combate de atividades criminosas, da qual os Estados Unidos são signatários. Para o secretário nacional de Justiça, Romeu Tuma Jr., a sentença dá “a sensação de que o crime compensa”.
A Justiça dos Estados Unidos decidiu descongelar a conta sob o entendimento de que o bloqueio só seria devido caso o banqueiro já tivesse sido condenado. O Ministério da Justiça, por outro lado, disse que o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI) já recorreu da sentença.
Em nota oficial, a Procuradoria da República no estado de São Paulo afirmou que a decisão é meramente formal e não avalia o mérito das investigações de lavagem de dinheiro e outros crimes que o dono do Opportunity e outras pessoas respondem no Brasil.
Para o procurador da República, Rodrigo de Grandis, responsável pelas investigações da Operação Satiagraha, o juiz John D. Bates proferiu a sentença determinando o desbloqueio, pois “não se debruçou sobre o mérito do caso e não analisou os motivos que levaram as autoridades brasileiras e norte-americanas a solicitar o bloqueio”. Para o procurador, “se o juiz americano entendesse que as provas brasileiras não eram boas, não teria decretado o bloqueio anteriormente”.
Segundo ele, a decisão do juiz Bates contraria, inclusive, as convenções internacionais assinadas pelos Estados Unidos em matéria de lavagem de dinheiro. “Tais questões ainda serão alvo de debate e as autoridades do Brasil e dos EUA enviarão esforços para manter os bloqueios de bens relativos ao Opportunity Fund nos Estados Unidos e em outros países”, afirmou.
O secretário Nacional de Justiça do Ministério da Justiça, Romeu Tuma Junior, também criticou o desbloqueio dos bens de Daniel Dantas e outros envolvidos na Operação Satiagraha nos Estados Unidos sustentando que a decisão “é uma afronta aos instrumentos internacionais, põe em xeque a cooperação jurídica de acordos internacionais e pode prejudicar outros casos nos quais o Brasil e os Estados Unidos estejam envolvidos judicialmente”, afirmou. Segundo ele, a sentença talvez obrigue a própria Organização das Nações Unidas (ONU) “a interferir nesta postura dos Estados Unidos”, disse.
De acordo com o advogado Antônio Sérgio Moraes Pitombo, do escritório Moraes Pitombo Advogados e que representa o Opportunity, o vazamento da sentença norte-americana representa “uma quebra do sigilo, que está previsto nas regras de cooperação internacional”. Segundo ele, a quebra do segredo no procedimento “não tem cabimento no que diz respeito ao ponto de vista de seriedade, já que se trata de uma instituição, que atinge o mercado financeiro e terceiros”, afirmou.
Histórico
A Operação Satiagraha, deflagrada pela Polícia Federal (PF) em julho de 2008, desarticulou uma quadrilha acusada de cometer crimes financeiros – lavagem de dinheiro, evasão de divisas, formação de quadrilha, uso indevido de informação privilegiada, gestão fraudulenta e corrupção ativa.
Ao todo, foram expedidos à época 24 mandados de prisão, entre os quais levaram à prisão o banqueiro Daniel Dantas, o investidor Naji Nahas e o ex-prefeito da capital paulista Celso Pitta. Todos foram, posteriormente, libertados, já que o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes concedeu habeas-corpus em favor deles.
De acordo com informações da Polícia Federal, o banqueiro Daniel Dantas utilizaria o Banco Opportunity para fraudar o mercado financeiro e, ainda, usava empresas de fachada para desviar dinheiro público.
A estimativa da Polícia Federal é de que o Banco Opportunity tenha movimentado um total de US$ 2 bilhões no paraíso fiscal das Ilhas Cayman no período entre 1992 e 2004.