CCJ do Senado aprova indicados para o CNJ
28 de maio de 2009O Golpe dentro do golpe
1 de junho de 2009Faz cerca de 15 dias que o balanço do frigorífico JBS Friboi do primeiro trimestre está gerando repercussões no mercado. Porém, os comentários são sobre o que falta no demonstrativo de resultado. A companhia, a maior de carne bovina do mundo, fez um empréstimo de US$ 200 milhões a uma empresa do controlador, de confinamento de boi, mas não forneceu explicações sobre o tema.
A questão só foi notada porque a conta de créditos com partes relacionadas (pessoas ou empresas ligadas ao grupo) do balanço patrimonial subiu de R$ 54,6 milhões para R$ 455,9 milhões, entre dezembro de 2008 e março deste ano.
A despeito de expressivo aumento de 735%, a JBS não faz nenhuma menção ao tema nos comentários de resultados e nem mesmo nas notas explicativas. Tanto as regras da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) como as do Novo Mercado exigem o detalhamento desse tipo de operação, conhecido como contrato com partes relacionadas.
Consultada ontem à tarde, a empresa forneceu comunicado a respeito do mútuo e suas condições. No entanto, não esclareceu os questionamentos a respeito da decisão de não detalhar as informações em seu balanço no Brasil, relativo ao primeiro trimestre.
O assunto só surgiu no mercado porque investidores e analistas interessados questionaram a empresa sobre a alta expressiva na conta em questão.
O tema vem gerando desconforto entre acionistas minoritários. Empréstimos entre companhias do mesmo grupo, conhecidos como mútuos, são tradicionalmente mal recebidos pelo mercado.
O incômodo é maior quando a transferência ocorre da empresa aberta para a companhia fechada do controlador. A operação é vista como uma migração de recursos imprópria já que a empresa listada na bolsa tem outros sócios (minoritários), enquanto a companhia fechada é apenas do controlador.
O caso em questão tem mais uma peculiaridade que acirra o debate: as condições do empréstimo. A concessão de recursos foi feita a Libor mais 2,5%, (pouco mais de 4%), condição melhor do que a própria JBS conseguiu recentemente numa emissão de bônus com vencimento em 2014 – obteve US$ 700 milhões pagando um rendimento de 13% aos emprestadores.
O empréstimo da JBS foi feito pela subsidiária americana por um prazo de três anos à companhia J&F Oklahoma, uma sociedade de propósitos específicos ligada ao controlador e que é dona dos animais engordados nos Estados Unidos. Essa companhia ficou com o gado que era da empresa americana Five Rivers, adquirida no ano passado pela JBS. No entanto, a Five Rivers continuou responsável pela engorda do boi.
Essa estratégia de separação de ativos teve como objetivo preservar o balanço da JBS Friboi já que a atividade de engorda é de capital intensivo e poderia contaminar a situação financeira da empresa aberta.
Mas, para ficar com o gado da Five Rivers, cerca de 800 mil cabeças, a J&F Oklahoma pagou US$ 800 milhões. Desse total, US$ 600 milhões foram obtidos com uma linha específica subsidiada nos Estados Unidos e o restante foi completado pelo empréstimo da JBS, que manteve a taxa atrativa americana – Libor mais 2,5%.
Essas informações constam, segundo a companhia, da nota explicativa da subsidiária americana JBS Five Rivers e da J&F Oklahoma. Os dados fornecidos ao Valor pela empresa são de nota publicada nos Estados Unidos.
O balanço consolidado da JBS de março mostra que a empresa teve receita líquida de R$ 9,3 bilhões e lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (lajida) de R$ 211,5 milhões. Os três primeiros meses do ano fecharam com prejuízo de R$ 322,7 milhões. A companhia tinha dívida bruta de R$ 5,9 bilhões e caixa de R$ 1,8 bilhão.
Os investidores compreenderam a opção da empresa. No entanto, ficaram descontentes com o mútuo e, especialmente, com a falta de transparência. Isso porque a companhia não optou por comunicar a questão voluntariamente, embora tenha esclarecido o assunto em riqueza de detalhes quando procurada por analistas e investidores.
Quando consultada, inclusive, conforme apurou o Valor, afirmava aos investidores que comunicaria o tema ao mercado em fato relevante, o que não ocorreu embora a discussão esteja ocorrendo há cerca de duas semanas.
Pelas regras do Novo Mercado, espaço da Bovespa dedicado a companhias com maior compromisso com governança corporativa, os contratos com partes relacionadas devem ser relatados ao mercado. Há uma divulgação padronizada desses dados, no formato de uma tabela. A abertura dos dados deve ocorrer sempre que a operação for de valor superior a R$ 200 mil ou igual ou superior a 1% do patrimônio líquido da empresa – que estava em R$ 5,7 bilhões em março.
A companhia deve informar o objeto do contrato, o prazo, o valor e as condições nesse relatório padronizado. O último levantamento deste tipo apresentado pela JBS Friboi à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e à Bovespa é de 11 de março e não traz a informação sobre este mútuo.
Além das regras do Novo Mercado, desde dezembro do ano passado, há uma deliberação da CVM – de número 560 – que obriga o detalhamento deste tipo de operação nas notas explicativas do balanço das companhias.
Antes disso, já havia regulamentação da autarquia para contratos com partes relacionadas. No entanto, em função do processo de convergência contábil dos padrões nacionais ao internacional IFRS, a regra ganhou nova versão. Com isso, houve aumento da transparência exigida.