O Supremo Tribunal Federal (STF) está prestes a retomar um dos julgamentos mais aguardados pelos tributaristas, pelos contribuintes interessados e pelo governo. Trata-se da decisão sobre a exclusão, ou não, do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) da base de cálculo da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins). O julgamento está suspenso desde agosto de 2006, quando o ministro Gilmar Mendes pediu vista do processo. Naquele momento, 6 dos 11 ministros do STF já haviam votado pela exclusão e apenas 1 a favor do Fisco.
O resultado, aparentemente, garante a vitória da tese da exclusão, cujo impacto sobre o sistema tributário e para as finanças públicas seria imenso. A exclusão imporia ao governo pesadas perdas de receita e abriria caminho para novas demandas judiciais, envolvendo outros casos de incidência de tributos sobre tributos. Um sistema tributário ruim, oneroso e de grande complexidade para o contribuinte ficaria ainda mais complicado, se isso vier a ocorrer. O governo tem esperança de que, com o voto de Mendes, um ou mais ministros que votaram pela exclusão revejam a decisão, invertendo o placar. Daí a grande expectativa com relação à manifestação de Mendes.
A questão tramita no STF há anos. O último pedido de vista, antes do de Gilmar Mendes, foi feito pelo então ministro Nelson Jobim e paralisou o exame do tema por sete anos. Tal demora não deve se repetir agora. “É melhor resolver logo esse problema“, disse o ministro Gilmar Mendes ao jornal Valor, sem, porém, especificar prazo para a apresentação de seu voto.
O pedido de vista abriu espaço para o Ministério da Fazenda realizar um trabalho de convencimento dos ministros do STF sobre a importância da decisão. Há algum tempo, o procurador-geral da Fazenda Nacional, Luís Inácio Adams, observou que, quando trata de questões controvertidas ou de grande impacto social ou financeiro, o STF demora para decidir. As sessões são longas e muitas vezes há pedido de vista. No caso da incidência da Cofins sobre o ICMS, no entanto, em cerca de meia hora, 7 ministros já haviam votado.
Por isso, Adams acredita que o memorial que o Ministério da Fazenda encaminhou aos ministros do STF, expondo as razões do governo e mostrando o impacto da decisão, pode convencer alguns dos que votaram contra o governo a rever seu voto.
Mas tudo depende do voto de Gilmar Mendes, no qual o governo põe grande esperança. E o governo tem motivos muito fortes para isso. Diversas estimativas foram feitas para a perda que o Fisco teria com uma decisão do STF favorável aos contribuintes. Segundo algumas contas, haveria perda acumulada de R$ 60 bilhões, mais uma quebra anual de até R$ 20 bilhões em relação ao que se arrecada hoje. Outras apontam perda anual de R$ 6,8 bilhões em arrecadação, além da necessidade do Fisco de restituir aos contribuintes R$ 20 bilhões.
São valores expressivos, que imporiam pesados cortes de despesas ou, como sempre ocorre em casos como esse, o aumento brutal de outros tributos para compensar a perda de arrecadação da Cofins. Além disso, o reconhecimento, pelo STF, de que tributo não pode incidir sobre tributo afetaria seriamente o sistema de impostos. Teria um grande efeito multiplicador, pois estimularia uma onda de ações contra a forma de cobrança de outros tributos.
Já há sentença em primeira instância determinando a exclusão do ICMS da base de cálculo do Simples. Há outros casos, listados pelo jornal Valor, que também podem ser questionados, como a inclusão da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido na base de cálculo do Imposto de Renda e do Imposto sobre Serviços no cálculo da Cofins.
Se prevalecer no STF o entendimento dos ministros que já votaram no caso da cobrança da Cofins sobre o ICMS, os contribuintes poderiam, além de questionar a incidência de tributo sobre tributo, pedir a restituição do que já pagaram em excesso.
São as conseqüências de um sistema tributário ruim que, por falta de reforma ampla, negociada e aprovada pelos meios normais, está sendo mudado pela Justiça, que dele vem retirando suas piores anomalias.
Fonte: O Estado de S. Paulo | Data: 8/5/2007