O momento que a economia brasileira atravessa chama a atenção dos investidores estrangeiros e desperta o interesse de fundos globais, que veem no País uma oportunidade de ganhos nesse momento de aversão ao risco no mercado internacional. O interesse vai desde a tradicional compra de participação em organizações até propostas mais inusitadas, como a oferta pública alternativa, proposta de aquisição especial e IPO estruturado de empresas brasileiras nos Estados Unidos. Segundo estimativas de Patrice Etlin, diretor da Advent International, os fundos de private equity têm o recorde de US$ 11 bilhões disponíveis para investir no Brasil.
Todas elas se mostram bastante sedutoras, mas algumas geram controvérsias entre os especialistas. Até porque eles defendem que o mercado brasileiro já é desenvolvido o suficiente para dar liquidez a essas empresas. Nos últimos anos, as companhias ganharam sócios estrangeiros sem tirar o pé do País. É só olhar para as ofertas de ações que chegaram a atrair mais de 70% de capital externo, considerando o total de papéis colocado no mercado pelas companhias. “Vale muito mais a pena ficar aqui e listar ações via BM&FBovespa”, avalia a advogada Camila Goldberg Cavalcanti, do escritório Barbosa, Müssnich & Aragão.
Um fundo de private equity dos Estados Unidos, que prefere não ter o nome da carteira revelado e é representado no Brasil pelo escritório de advocacia Alves & Associados, chega com a intenção de fazer o que ele chama de IPO estruturado. No primeiro passo, a empresa, normalmente de pequeno porte, faz uma colocação privada de ações para o próprio fundo, de US$ 5 milhões. Na prática, é uma permuta privada de papéis com uma empresa americana. Com isso, o grupo brasileiro passa a ser acionista da organização americana que, consequentemente, torna-se “proprietária” da empresa verde-amarela. Em seguida, o fundo promete fazer a abertura de capital dessa empresa nos EUA. “Isso talvez fosse viável para uma empresa pequena e de nicho, se existisse oportunidade nos Estados Unidos, ou para companhias de países com mercados não tão desenvolvidos, como no Paraguai”, sugere Roberto Corrêa da Fonseca, superintendente da Itaú Corretora.
No início deste ano, bancos e butiques de investimentos começaram a ofertar a APO (oferta pública alternativa, na sigla em inglês), fundindo uma empresa brasileira com um grupo internacional de capital aberto. Também começaram a aparecer as chamadas SPACs – special purpose acquisition companies, nas quais investidores se tornavam sócios de companhias criadas com o propósito específico de realizar aquisições no Brasil. Depois, essas empresas captam recursos no mercado em um IPO, saindo do papel diante de algum negócio realizado durante um determinado período. Nos dois casos, até agora, não se ouviu falar de empresas brasileiras que tenham feito tais operações.
“Há muito dinheiro no mercado americano. Mas a intenção de abrir o capital via bolsas dos EUA é menos clara na estratégia. O que temos ouvido é a engenharia reversa: uma empresa aberta faz a fusão com um grupo brasileiro, que já fica listado no mercado americano”, observa Sidney Chameh, presidente da Associação Brasileira de Private Equity & Venture Capital (ABVCAP). Mesmo com o ceticismo do mercado, o fundo de private equity americano que propõe o “IPO estruturado” espera para 2011 amarrar três negócios de seis em vista. No ano que vem, a meta vai de 12 a 15 operações. “O orçamento anual separado para esses negócios é de US$ 75 milhões a US$ 80 milhões”, conta o advogado Rodney Alves, do escritório Alves & Associados, com sede em Los Angeles.
Regras norte-americanas podem elevar despesas com a negociação
Ao abrir o capital lá fora, as empresas têm que ter ciência de que estarão sujeitas à legislação de lá. Erica Gorga, professora de Mercado de Capitais da Fundação Getulio Vargas (FGV), lembra que, se a empresa não for isenta às novas regras de abertura de capital nos EUA, que passaram a valer no mês passado, o ingresso naquele mercado não é vantajoso.
“Se a organização não for isenta estará sujeita a cumprir obrigações de compliance, entre outras regras, que podem gerar um custo de no mínimo US$ 1 milhão por ano”, explica ela. “Não é um número tão desprezível assim.”
Pela nova regra, as empresas isentas são aquelas que atrairiam até 15 investidores para captar até US$ 25 milhões. Segundo o advogado que representa o fundo americano no Brasil Rodney Alves, as empresas que toparem ingressar neste negócio podem captar entre US$ 15 milhões e US$ 40 milhões – nesta opção, a empresa já estaria fora da lista de isenção conforme as novas regras. E o preço das ações pode variar entre US$ 3,00 e US$ 5,00, de acordo com as previsões de Alves.
Bolsa quer reduzir custos para acesso
O segmento de acesso voltado para empresas menores da BM&FBovespa, o Bovespa Mais, ainda é uma promessa. Apenas a Nutriplan está listada. No início deste ano, a expectativa era ganhar mais um integrante com o IPO da CAB Ambiental, pertencente ao Grupo Galvão Engenharia, que não foi para frente.
A burocracia e o alto custo envolvido na abertura de capital são algumas das justificativas para o insucesso do Bovespa Mais. Esforços estão sendo feitos para diminuir o valor do IPO para grupos menores, que atualmente gira em torno de 7% do volume captado, de acordo com Cristiana Pereira, diretora de Relacionamento com Empresas e Institucionais da BM&FBovespa. Para captações superiores a R$ 500 milhões, o custo varia de 4% a 5%. “Se o IPO de pequenas e médias empresas custasse de 5% a 6% já estaria bom”, entende Cristiana. Independentemente de uma possível redução, o custo ao mercado de acesso no Brasil ainda é menor que em outros países, como a Inglaterra, de 7,5%, e o Canadá, de 14%.
A presidente da Comissão de Valores Mobiliários, Maria Helena Santana, observou recentemente que a média de operações de captação no mercado acionário brasileiro é muito alta, de US$ 620 milhões na média, quando comparada a outros países. Nos EUA, é de US$ 246 milhões.
Outro dado que confirma a forte predominância de IPOs de grande valor no Brasil é que o País figura entre os três maiores no ranking global em volume captado nessas operações. Já em número de operações, Maria Helena cita que a colocação do Brasil oscila entre o 10º e o 20º lugar. Um dos caminhos para melhorar esse cenário seria um mercado mais forte de fundos de venture capital (carteiras que compram participações em empresas de menor porte).