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18 de abril de 2024A execução de tutelas de urgência fora da sede da arbitragem é, internacionalmente, uma das áreas em que a eficácia do procedimento arbitral é colocada em xeque. Com o aumento do trânsito de pessoas e da transferência internacional de bens, as disputas internacionais estão, frequentemente, sediadas em locais onde nenhuma das partes possui ativos ou operações comerciais. Esse fato demanda, portanto, a execução de tutelas de urgência fora da sede da arbitragem.
Ocorre que as partes enfrentam, em regra, dois tipos de problemas: a indisponibilidade de recursos capazes de assegurar a referida execução ou a inexistência de mecanismos uniformizados para tal fim — como é a realidade do Direito brasileiro —, ocasionando exacerbada insegurança jurídica aos envolvidos.
Tendo em vista a ausência de posição expressa na legislação pátria, os últimos julgados e apontamentos doutrinários no Brasil demonstram, de fato, uma variedade de opções, quais sejam: 1) o uso da carta rogatória; 2) a execução da tutela de urgência via homologação de sentença estrangeira (\”sistema de assimilação\”) ou 3) a aplicação da carta arbitral.
Considerando o limitado escopo desse artigo, os autores esclarecem, desde já, que não almejam comprovar a inaplicabilidade das duas primeiras ferramentas para execução de tutelas de urgência estrangeiras no Brasil. Naturalmente, a evidente morosidade de tais métodos já militaria, por si só, pela sua inutilização.
O que esse estudo busca, na realidade, é incitar discussões no âmbito doutrinário e jurisprudencial sobre a necessária abertura do ordenamento pátrio ao mecanismo das cartas arbitrais. Essa inovadora ferramenta aportada em lei específica desde 2015 com a alteração na Lei nº 9.307, de 1996 procedida pela Lei nº 13.129 — Lei de Arbitragem brasileira (\”LArb\”) — instituiu a sistemática de intercâmbio e colaboração entre tribunais arbitrais e o Judiciário para o cumprimento de medidas constritivas e de urgência. E no âmbito da arbitragem internacional, ela foi privilegiada em relação à carta rogatória e ao sistema de assimilação para a cooperação nacional e internacional em matéria de tutelas de urgência. Assim dispõe o artigo 22-C da LArb:
\”Arigo. 22-C. O árbitro ou o tribunal arbitral poderá expedir carta arbitral para que o órgão jurisdicional nacional pratique ou determine o cumprimento, na área de sua competência territorial, de ato solicitado pelo árbitro. Parágrafo único. No cumprimento da carta arbitral será observado o segredo de justiça, desde que comprovada a confidencialidade estipulada na arbitragem\”.
Similarmente, determina o artigo 237, inciso IV, do Código de Processo Civil (\”CPC\”):
\”Artigo 237. Será expedida carta: […] IV – arbitral, para que órgão do Poder Judiciário pratique ou determine o cumprimento, na área de sua competência territorial, de ato objeto de pedido de cooperação judiciária formulado por juízo arbitral, inclusive os que importem efetivação de tutela provisória\”.
Como a LArb não limita o âmbito de aplicação da carta arbitral aos processos sediados no Brasil, não é apenas possível, mas necessário utilizá-la para procedimentos arbitrais com sede no território nacional e no exterior. Relembra-se que a sua natureza monista não é em vão: o seu corpo unitário de regras rege todos os tipos de arbitragem, envolvendo ou não partes brasileiras ou estrangeiras, tratando ou não de conflitos internos ou transnacionais.
Se assim não o fosse, enfrentaríamos a situação de impor formalidade adicional às cartas arbitrais proferidas no estrangeiro, mesmo inexistindo previsão específica para tanto. O que, claro, violaria princípios básicos hermenêuticos de que, quando existente norma mais atual e específica sobre determinado assunto, não se pode aplicar norma mais generalista, como seria o caso da aplicação analógica das cartas rogatórias.
Tanto é que o artigo 237 do CPC relaciona todos os tipos de mecanismos de cooperação existentes, especificando que a carta arbitral será aplicável quando o pedido de assistência for requerido pela jurisdição arbitral. Se o legislador quisesse integrar medidas arbitrais de urgência proferidas no exterior no dispositivo relativo às cartas rogatórias, poderia tê-lo feito. No entanto, assim não ocorreu, o que torna razoável afirmar que não há barreiras reais à aceitação do sistema de cartas arbitrais em procedimentos de arbitragem com sede fora do território brasileiro.
Na defesa da desburocratização de procedimentos em prol da eficácia da arbitragem, a recente Resolução do Conselho Nacional de Justiça (\”CNJ\”) foi promulgada — oriunda do julgamento do Ato Normativo nº 0006684-33.2021.2.00.0000, na 93ª Sessão Virtual, realizada em 24.09.2021 (\”Resolução\”). Além de destacar que \”cooperação judiciária constitui mecanismo contemporâneo, desburocratizado e ágil para o cumprimento de atos judiciais\”, esclareceu que \”[o]s pedidos de cooperação judiciária deverão ser encaminhados diretamente pelo(a) árbitro(a) ou órgão arbitral ao juízo cooperante\” via carta arbitral (artigo 2º, parágrafo único).
Por mais que a Resolução se refira sobretudo à cooperação nacional, o entendimento ali apontado pode ser também o aplicável para arbitragens com sede no exterior, tanto à luz dos argumentos expostos, quanto pelo fato de que nenhuma ressalva a esse respeito existe em seu texto.
Porém, o que significa defender, em termos práticos, a aplicação da carta arbitral para execução de tutelas de urgência proferidas em arbitragens com sede fora do Brasil?
De modo simples e objetivo, equivale dizer que, ao aplicar a carta arbitral para execução de tutelas estrangeiras, o pedido de assistência para satisfação da medida deverá ser encaminhado diretamente pelo tribunal arbitral ao juiz do foro de execução do pedido, sem a necessidade de realizar as inúmeras etapas homologatórias ou diplomáticas que são imperativas quando do uso, respectivamente, da carta rogatória e do sistema de assimilação. O que possibilita, por consequência, preservar a eficácia do procedimento internacional, sem esvaziar os pedidos de urgência das partes pela demora na sua satisfação.
Apesar de se reconhecer, por um lado, que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) possui a tradicional competência em matéria de cooperação internacional, pelo outro, se considerado 1) o critério de internacionalidade adotado pela LArb, 2) a possibilidade de análise difusa da ordem pública pelos juízes de primeira instância, bem como 3) a sistemática de execução em direito comparado, entende-se ser perfeitamente cabível a efetivação da tutela de urgência arbitral diretamente no foro de execução.
Em relação ao primeiro ponto, de acordo com o artigo 34 da LArb, uma sentença arbitral é estrangeira se proferida fora do território nacional. No entanto, a prática internacional optou por não caracterizar a própria sentença arbitral como nacional ou estrangeira, preferindo caracterizar o procedimento como tal, para apurar os efeitos jurídicos que dele decorrem.
A opção do legislador brasileiro apesar de mais objetiva e simples, permite que a internacionalidade da arbitragem seja, artificialmente, alterada pela localização da sede do procedimento, podendo, por sua vez, ser, convencionalmente, escolhida e até mesmo manuseada por acordo das partes. Por vias indiretas, a competência exclusiva do STJ em termos de homologação de sentença arbitral e exequatur de carta rogatória acaba também sujeita à autonomia das partes e à sua capacidade de escolha da sede da arbitragem — ou ao menos do local onde as decisões poderão ser proferidas.