DURANTE O JULGAMENTO DO RE –
RECURSO EXTRAORDINÁRIO MOTIVADO POR AGRAVO O STF – EM DECISÃO
PUBLICADA EM 31 DE JULHO DE 2013 – POR MEIO DE SEU MINISTRO RELATOR, DR.
MINISTRO CELSO DE MELLO CITOU A DOUTRINA E ENSINAMENTOS DO PROF.
ÉDISON FREITAS DE SIQUEIRA (TEXTO EM AZUL NO MEIO DA EMENTA),
A FIM DE JUSTIFICAR ACÓRDÃO QUE JULGOU IMPROCEDENTE O APELO DA UNIÃO
FEDERAL – ABAIXO SEGUE O DESTAQUE DA EMENTA, PORQUE – ESTA –
EXCEPCIONALMENTE – FAVORECE AOS CONTRIBUINTES – EM UM PAÍS ONDE TEM
SIDO COMUM O PODER JUDICIÁRIO, DE PRIMEIRA E SEGUNDA INSTÂNCIA, ATUAR
MAIS COMO UM ÓRGÃO AUXILIAR DO PODER EXECUTIVO DO QUE UM PODER SOBERANO E
INDEPENDENTE DA REPÚBLICA – ASSIM, VALE A TRANSCRIÇÃO INTEGRAL DA
EMENTA:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 736.155 (1776)
ORIGEM AMS – 00116740220074058100 – TRIBUNAL REGIONAL
FEDERAL 5A. REGIAO
PROCED. CEARÁ
RELATOR MIN. CELSO DE MELLO
RECTE.(S) UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL
RECDO.(A/S) GRAFICA E EDITORA ASSIS ALMEIDA LTDA
ADV.(A/S) NORBERTO RIBEIRO DE FARIAS FILHO
EMENTA: SANÇÕES POLÍTICAS NO DIREITO TRIBUTÁRIO.
INADMISSIBILIDADE DA UTILIZAÇÃO, PELO PODER
PÚBLICO, DE MEIOS GRAVOSOS E INDIRETOS DE
COERÇÃO ESTATAL DESTINADOS A COMPELIR O
CONTRIBUINTE INADIMPLENTE A PAGAR O TRIBUTO
(SÚMULAS 70, 323 547 DO STF). RESTRIÇÕES ESTATAIS,
QUE, FUNDADAS EM EXIGÊNCIAS QUE TRANSGRIDEM OS
POSTULADOS DA RAZOABILIDADE DA
PROPORCIONALIDADE EM SENTIDO ESTRITO, CULMINAM
POR INVIABILIZAR, SEM JUSTO FUNDAMENTO, O
EXERCÍCIO, PELO SUJEITO PASSIVO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA, DE ATIVIDADE
ECONÔMICA OU PROFISSIONAL LÍCITA. LIMITAÇÕES ARBITRÁRIAS
QUE NÃO PODEM SER IMPOSTAS PELO ESTADO AO CONTRIBUINTE EM
DÉBITO, SOB PENA DE OFENSA AO “SUBSTANTIVE DUE PROCESS OF LAW”.
IMPOSSIBILIDADE CONSTITUCIONAL DE O ESTADO LEGISLAR DE MODO
ABUSIVO OU IMODERADO (RTJ 160/140-141 –
RTJ 173/807-808 – RTJ 178/22-24). O PODER DE TRIBUTAR –
QUE ENCONTRA LIMITAÇÕES ESSENCIAIS NO PRÓPRIO
TEXTO CONSTITUCIONAL, INSTITUÍDAS EM FAVOR DO CONTRIBUINTE
– “NÃO PODE CHEGAR À DESMEDIDA DO PODER DE DESTRUIR” (MIN.
OROSIMBO NONATO, RDA 34/132). A PRERROGATIVA
ESTATAL DE TRIBUTAR TRADUZ PODER
CUJO EXERCÍCIO NÃO PODE COMPROMETER
A LIBERDADE DE TRABALHO, DE COMÉRCIO E DE
INDÚSTRIA DO CONTRIBUINTE. A SIGNIFICAÇÃO TUTELAR, EM NOSSO
SISTEMA JURÍDICO, DO “ESTATUTO
CONSTITUCIONAL DO CONTRIBUINTE”.
DOUTRINA. PRECEDENTES. RECURSO
EXTRAORDINÁRIO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO.
DECISÃO O litígio em causa envolve
discussão em torno da possibilidade
constitucional de o Poder Público impor restrições, ainda que
fundadas em lei, destinadas a compelir o contribuinte
inadimplente a pagar o tributo e que
culminam, quase sempre, em decorrência do caráter
gravoso e indireto da coerção utilizada pelo Estado,
por inviabilizar o exercício, pela empresa devedora, de atividade
econômica lícita. Cabe acentuar, neste ponto,
que o Supremo Tribunal Federal tendo presentes os
postulados constitucionais que asseguram a livre prática
de atividades econômicas lícitas CF, art. 170, parágrafo
único), de um lado, a liberdade de
exercício profissional (CF, art. 5º, XIII), de outro –
considerando, ainda, que o Poder Público dispõe
de meios legítimos que lhe permitem tornar
efetivos os créditos tributários -, firmou orientação
jurisprudencial, hoje consubstanciada em enunciados
sumulares (Súmulas 70, 323 e 547), no sentido de
que a imposição, pela autoridade fiscal, de
restrições de índole punitiva, quando motivada tal limitação
pela mera inadimplência do contribuinte,
revela-se contrária às liberdades públicas ora
referidas (RTJ 125/395, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI).
Esse entendimento – cumpre enfatizar – tem sido
observado em sucessivos julgamentos proferidos
por esta Suprema Corte, quer sob aégide do anterior regime
constitucional, quer em face da vigente
Constituição da República (RTJ 33/99, Rel. Min. EVANDRO LINS – RTJ
45/859, Rel. Min. THOMPSON FLORES – RTJ 47/327,
Rel. Min. ADAUCTO CARDOSO – RTJ 73/821, Rel. Min.
LEITÃO DE ABREU – RTJ 100/1091, Rel. Min. DJACI
FALCÃO – RTJ 111/1307, Rel. Min. MOREIRA ALVES – RTJ
115/1439, Rel. Min. OSCAR CORREA – RTJ 138/847, Rel. Min.
CARLOS VELLOSO – RTJ 177/961, Rel. Min. MOREIRA
ALVES – RE 111.042/SP, Rel. Min. CARLOS MADEIRA,
v.g. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. ICMS:
REGIME ESPECIAL.
RESTRIÇÕES DE CARÁTER PUNITIVO.
LIBERDADE DE TRABALHO. CF/ 67, art. 153, § 23;
CF/88, art. 5º, XIII. I. – Regime especial de
ICM, autorizado em lei estadual: restrições e
limitações, nele constantes, à atividade comercial do
contribuinte ofensivas à garantia constitucional da liberdade de
trabalho (CF/67, art. 153, § 23; CF/88, art. 5º,
XIII), constituindo forma oblíqua de cobrança do tributo
assim execução política, que a jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal sempre repeliu
(Súmulas nºs 70, 323 e 547). II. – Precedente
do STF: ERE 115.452-SP, Velloso, Plenário
04.l0.90, ?DJ? de 16.11.90. III. – RE não
admitido. Agravo não provido. RE 216.983-AgR/SP,
Rel. Min. CARLOS VELLOSO – grifei É certo – consoante adverte a
jurisprudência constitucional do Supremo
Tribunal Federal – que não se reveste de natureza absoluta a
liberdade de atividade empresarial, econômica ou
profissional, eis que inexistem, em nosso
sistema jurídico, direitos garantias impregnados de
caráter absoluto:
OS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS NÃO TÊM CARÁTER ABSOLUTO.
Não há, no sistema constitucional brasileiro,
direitos ou garantias que se revistam de
caráter absoluto, mesmo porque razões de relevante
interesse público ou exigências derivadas do princípio de
convivência das liberdades legitimam, ainda que
excepcionalmente, a adoção, por parte dosórgãos estatais, de
medidas restritivas das prerrogativas individuais ou
coletivas, desde que respeitados os termos estabelecidos
pela própria Constituição O
estatuto constitucional das liberdades públicas, ao delinear o
regime jurídico a que estas estão sujeitas – e
considerado o substrato ético que as informa –
permite que sobre elas incidam limitações de ordem
jurídica, destinadas, de um lado, a proteger a integridade do
interesse social , de outro, a assegurar a
coexistência harmoniosa das liberdades, pois
nenhum direito ou garantia pode ser exercido em detrimento da ordem
pública ou com desrespeito aos direitos e
garantias de terceiros. RTJ 173/807-808, Rel.
Min. CELSO DE MELLO, Pleno A circunstância de
não se revelarem absolutos os direitos
garantias individuais proclamados no texto constitucional não
significa que a Administração Tributária possa
frustrar o exercício da atividade empresarial ou
profissional do contribuinte, impondo-lhe exigências gravosas, que, não
obstante as prerrogativas extraordinárias
que (já garantem o crédito tributário,
visem, em última análise, a constranger o devedor a satisfazer
débitos fiscais que sobre ele incidam.
O fato irrecusável, nesta matéria, como já
evidenciado pela própriajurisprudência desta Suprema Corte, é que o
Estado não pode valer-se de meios indiretos
de coerção, convertendo-os em instrumentos de
acertamento da relação tributária, para, em função
deles – e mediante interdição ou grave
restrição ao exercício da atividade empresarial,
econômica ou profissional – constranger o contribuinte a
adimplir obrigações fiscais eventualmente em
atraso. Esse comportamento estatal – porque
arbitrário inadmissível – também tem
sido igualmente censurado por autorizado magistério
doutrinário (HUGO DE BRITO MACHADO, “Sanções Políticas no
Direito Tributário”, “in” Revista Dialética de
Direito Tributário nº 30, p. 46/47): Em Direito
Tributário a expressão sanções políticas corresponde
a restrições ou proibições impostas ao contribuinte, como forma
indireta de obrigá-lo ao pagamento do
tributo, tais como a interdição do
estabelecimento, a apreensão de mercadorias, o regime
especial de fiscalização, entre outras
Qualquer que seja a restrição que implique
cerceamento da liberdade de exercer atividade
lícita é inconstitucional, porque contraria o
disposto nos artigos 5º, inciso XIII, e 170, parágrafo único, do
Estatuto Maior do País.
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São exemplos mais comuns de sanções políticas a
apreensão de mercadorias sem que a
presença física destas seja necessária para a
comprovação do que o fisco aponta como ilícito; o denominado
regime especial de fiscalização; a recusa de
autorização para imprimir notas fiscais; a
inscrição em cadastro de inadimplentes com as restrições daí
decorrentes; a recusa de certidão negativa de débito
quando não existe lançamento consumado contra
o contribuinte; a suspensão e até o cancelamento da
inscrição do contribuinte no respectivo cadastro, entre
muitos outros Todas essas práticas são
flagrantemente inconstitucionais, entre outras
razões, porque: ) implicam indevida restrição ao direito de exercer
atividade econômica, independentemente de
autorização de órgãos públicos, assegurado pelo
art. 170, parágrafo único, da vigente Constituição Federal;
) configuram cobrança sem o devido processo legal, com grave
violação do direito de defesa do contribuinte,
porque a autoridade que a este impõe a restrição
não é a autoridade competente para apreciar se a exigência é ou
não legal.” (grifei)
Cabe
referir, a propósito da controvérsia suscitada no
recurso extraordinário em questão – retenção de
mercadoria importada -, a lição de EDISON FREITAS
DE SIQUEIRA, em obra monográfica que versou o tema
das chamadas “sanções políticas” impostas ao contribuinte
inadimplente Débito Fiscal – análise crítica e
sanções políticas”, p. 61/62, item 2.3, 2001,
Sulina): Portanto, emerge incontroverso o fato
de que uma empresa para que possa exercer suas
atividades, necessita de sua inscrição estadual,
bem como de permanente autorização da expedição de notas fiscais
sendo necessário obter nas Secretarias da
Fazenda de cada estado da federação onde
vendam seus produtos, o respectivo reconhecimento de
direito à utilização de sistemas especiais de arrecadação, bem como na
transferência de créditos acumulados, além da
obtenção da respectiva Autorização para
Impressão de Documentos Fiscais (AIDF), em paraleloàs notas fiscais.
Salienta-se que qualquer ação contrária do Estado, quanto
à concessão e reconhecimento dos direitos
inerentes às questões no parágrafo anterior
referendadas, constitui ?sanção política?, medida despótica e própria
de ditadores, porque subverte o sistema legal
vigente. Nesse sentido, vale tecer
algumas considerações do efetivo
SIGNIFICADO DA NOTA FISCAL para uma empresa ou profissional que
mantenha a atividade lícita ?trabalho?, até porque, o
instrumento alternativo posto à disposição
do contribuinte, notas fiscais avulsas, é situação
equivalente à marginalidade, além de tratar-se
de meio absolutamente inviável a uma
atividade econômica significativa (volumosa).
A importância da nota fiscal ou AIDF para o
desenvolvimento das atividades comerciais de uma
empresa seja ela de indústria ou comércio,
decorre do fato de que somente por meio destas é que se torna possível
oficializar e documentar operações de circulação
de mercadorias, a ponto de que sem essas, a
circulação de mercadoria é atividade ilícita, punível,
inclusive, com a respectiva apreensão das mesmas.
Neste sentido, revela-se, pois, totalmente imprópria à figura da nota
fiscal avulsa, solução muito justificada por fiscais de ICMS e
Procuradores de Estado em audiências que
solicitam ao Poder Judiciário, mas que, na prática,
constitui artimanha muito maliciosa que só serve para
prejudicar o contribuinte, em circunstância
totalmente defesa em lei, como adiante ficará
elucidado. Não raro, a fiscalização
aponta, como recurso em situações de
desagrado ao contribuinte, o uso das chamadas ?notas
fiscais avulsas?. Fazem-no, por certo,
por desconhecimento de toda a gama de obtusa
burocracia que envolve a sua expedição, ou pretendendo iludir
os órgãos do Poder Judiciário, caso esses sejam
chamados a impor ?poder de controle? contra
exacerbação do exercício do poder de tributar, por parte do Poder
Executivo.” (grifei)
Cumpre assinalar, por oportuno, que essa
percepção do tema prestigiada pelo saudoso e
eminente Ministro ALIOMAR BALEEIRO (“Direito
Tributário Brasileiro”, p. 878/880, item n. 2, 11ª ed., atualizado por
Misabel Abreu Machado Derzi, 1999, Forense), é também
compartilhada por autorizado magistério
doutrinário que põe em destaque, no exame dessa
matéria, o direito do contribuinte ao livre exercício de
sua atividade profissional ou econômica,
cuja prática legítima – qualificando-se como
limitação material ao poder do Estado – inibe a Administração
Tributária, em face do postulado que consagra a
proibição de excesso (RTJ 176/578-580 Rel. Min.
CELSO DE MELLO), de impor, ao contribuinte inadimplente,
restrições que configurem meios gravosos
e irrazoáveis destinados a constranger, de
modo indireto, o devedor a satisfazer o crédito tributário
(HUMBERTO BERGMANN ÁVILA, “Sistema Constitucional
Tributário”, p. 324 326, 2004, Saraiva; SACHA
CALMON NAVARRO COÊLHO, “Infração Tributária e
Sanção”, “in Sanções Administrativas Tributárias”, p.
420/444, 432, 2004, Dialética/ICET; HUGO DE
BRITO MACHADO SEGUNDO, “Processo
Tributário”, p. 93/95, item n. 2.7, 2004, Atlas;
RICARDO LOBO TORRES, “Curso de Direito Financeiro e
Tributário”, p. 270, item n. 7.1, 1995, Renovar,
v.g. censura a esse comportamento
inconstitucional, quando adotado pelo Poder
Público em sede tributária, foi registrada, com extrema
propriedade, em precisa lição, por HELENILSON
CUNHA PONTES (“ Princípio da Proporcionalidade
e o Direito Tributário”, p. 141/143, item n.
2.3, 2000, Dialética): O princípio da
proporcionalidade, em seu aspecto necessidade
torna inconstitucional também grande parte das sanções
indiretas ou políticas impostas pelo Estado
sobre os sujeitos passivos que se encontrem em
estado de impontualidade com os seus deveres tributários. Com efeito, se
com a imposição de sanções menos gravosas, e até
mais eficazes (como a propositura de medida
cautelar fiscal e ação de execução fiscal), pode
Estado realizar o seu direito à percepção da receita pública
tributária, nada justifica validamente a
imposição de sanções indiretas como a negativa de
fornecimento de certidões negativas de débito, ou inscrição em cadastro
de devedores, o que resulta em sérias e graves
restrições ao exercício da livre iniciativa
econômica, que vão da impossibilidade de registrar atos societários
nos órgãos do Registro Nacional do Comércio até a
proibição de participar de concorrências
públicas.
O Estado brasileiro, talvez em exemplo único em
todo o mundo ocidental, exerce, de forma
cada vez mais criativa, o seu poder de
estabelecer sanções políticas (ou indiretas), objetivando compelir o
sujeito passivo a cumprir o seu dever
tributário. Tantas foram as sanções
tributárias indiretas criadas pelo Estado brasileiro que deram origem a
três Súmulas do Supremo Tribunal Federal.
Enfim, sempre que houver a possibilidade
de se impor medida menos gravosa à
esfera jurídica do indivíduo infrator, cujo efeito seja
semelhante àquele decorrente da aplicação de sanção
mais limitadora, deve o Estado optar pela
primeira, por exigência do princípio da
proporcionalidade em seu aspecto necessidade.
………………………………………………………………………………………….
As sanções tributárias podem revelar-se
inconstitucionais, por desatendimento à
proporcionalidade em sentido estrito (…), quando a
limitação imposta à esfera jurídica dos indivíduos, embora
arrimada na busca do alcance de um
objetivo protegido pela ordem jurídica, assume uma
dimensão que inviabiliza o exercício de outros
direitos e garantias individuais, igualmente
assegurados pela ordem constitucional.
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Exemplo de sanção tributária claramente
desproporcional em sentido estrito é a
interdição de estabelecimento comercial ou industrial
motivada pela impontualidade do sujeito passivo tributário
relativamente ao cumprimento de seus
deveres tributários. Embora contumaz devedor
tributário, um sujeito passivo jamais pode ver aniquilado
completamente o seu direito à livre iniciativa em
razão do descumprimento do dever de recolher os
tributos por ele devidos aos cofres públicos. O Estado deve responder
impontualidade do sujeito passivo com o lançamento e
a execução céleres dos tributos que entende
devidos, jamais com o fechamento da unidade
econômica.
Neste sentido, revelam-se flagrantemente
inconstitucionais as medidas aplicadas, no
âmbito federal, em conseqüência da decretação do
chamado ?regime especial de fiscalização?. Tais medidas, pela gravidade
das limitações que impõem à livre iniciativa
econômica, conduzem à completa impossibilidade
do exercício desta liberdade, negligenciam, por completo, o
verdadeiro papel da fiscalização tributária em um Estado
Democrático de Direito e ignoram o
entendimento já consolidado do Supremo Tribunal
Federal acerca das sanções indiretas em matéria tributária.
Esta Corte, aliás, rotineiramente afasta os
regimes especiais de fiscalização, por
considerá-los verdadeiras sanções indiretas, que se chocam frontalmente
com outros princípios constitucionais,
notadamente com a liberdade de iniciativa
econômica.” (grifei) É por essa razão que EDUARDO FORTUNATO BIM, em
excelente trabalho dedicado ao tema ora em
análise (“A Inconstitucionalidade das Sanções
Políticas Tributárias no Estado de Direito: Violação ao ?Substantive
Due Process of Law? (Princípios da Razoabilidade e
da Proporcionalidade) in” “Grandes Questões
Atuais do Direito Tributário”, vol. 8/67-92, 83, 2004,
Dialética), conclui, com indiscutível acerto, “que as
sanções indiretas afrontam, de maneira
autônoma, cada um dos subprincípios da
proporcionalidade, sendo inconstitucionais em um Estado de Direito,
por violarem não somente este, mais ainda o
?substantive due process of law?grifei.
Cabe relembrar, neste
ponto, consideradas as referências
doutrinárias que venho de expor, a clássica advertência de OROSIMBO
NONATO, consubstanciada em decisão proferida pelo
Supremo Tribunal Federal (RE 18.331/SP), em
acórdão no qual aquele eminente e saudoso
Magistrado acentuou, de forma particularmente expressiva, à maneira
do que já o fizera o Chief Justice JOHN MARSHALL,
quando do julgamento, em 1819, do célebre caso
“McCulloch v. Maryland”, que “o poder de tributar não
pode chegar à desmedida do poder de destruir” (RF 145/164 – RDA
34/132), eis que – como relembra BILAC PINTO,
em conhecida conferência sobre Os Limites do
Poder Fiscal do Estado” (RF 82/547-562, 552) – essa
extraordinária prerrogativa estatal traduz, em essência,
“um poder que somente pode ser exercido
dentro dos limites que o tornem compatível com a
liberdade de trabalho, de comércio e de indústria e com o direito de
propriedade” (grifei Daí a
necessidade de rememorar, sempre, a função tutelar do
Poder Judiciário, investido de competência institucional
para neutralizar eventuais abusos das
entidades governamentais, que, muitas vezes
deslembradas da existência, em nosso sistema jurídico, de um
“estatuto constitucional do contribuinte”,
consubstanciador de direitos e garantias
oponíveis ao poder impositivo do Estado (Pet 1.466/PB, Rel. Min. CELSO
DE MELLO, “in” Informativo/STF nº 125),
culminam por asfixiar arbitrariamente, o
sujeito passivo da obrigação tributária, inviabilizando-lhe
injustamente, o exercício de atividades legítimas, o
que só faz conferir permanente atualidade às
palavras do Justice Oliver Wendell Holmes, Jr.
The power to tax is not the power to destroy while this Court sits”),
em dictum segundo o qual, em livre tradução, “o
poder de tributar não significa nem envolve o
poder de destruir, pelo menos enquanto existir esta Corte
Suprema”, proferidas, ainda que como “dissenting opinion”, no
julgamento em 1928, do caso “Panhandle Oil Co. v.
State of Mississippi Ex Rel. Knox (277 U.S.
218). Não se pode perder de perspectiva, neste
ponto, em face do conteúdo evidentemente
arbitrário da exigência estatal ora questionada na
presente sede recursal, o fato de que, especialmente quando se
tratar de matéria tributária, impõe-se, ao
Estado, no processo de elaboração das leis,
observância do necessário coeficiente de razoabilidade, pois, como se
sabe, todas as normas emanadas do Poder Público
devem ajustar-se à cláusula que consagra, em sua
dimensão material, o princípio do “substantive due
process of law” (CF, art. 5º, LIV), eis que, no tema em questão, o
postulado da proporcionalidade qualifica-se como
parâmetro de aferição da própria
constitucionalidade material dos atos estatais, consoante tem proclamado
a jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal (RTJ 160/140-141 – RTJ 178/22-24,
v.g. O Estado não pode legislar abusivamente. A
atividade legislativa está necessariamente
sujeita à rígida observância de diretriz fundamental,
que, encontrando suporte teórico no princípio da proporcionalidade,
veda os excessos normativos e as prescrições
irrazoáveis do Poder Público. O princípio da
proporcionalidade – que extrai a sua justificação
dogmática de diversas cláusulas constitucionais, notadamente daquela
que veicula a garantia do ?substantive due
process of law? – acha-se vocacionado a inibir e
a neutralizar os abusos do Poder Público no exercício de suas
funções, qualificando-se como parâmetro de
aferição da própria constitucionalidade
material dos atos estatais. A norma estatal,
que não veicula qualquer conteúdo de
irrazoabilidade, presta obséquio ao postulado da
proporcionalidade, ajustando-se à cláusula
que consagra, em sua dimensão material, o
princípio do ?substantive due process of law? CF, art. 5º, LIV).
Essa cláusula tutelar, ao inibir os efeitos
prejudiciais decorrentes do abuso de poder
legislativo, enfatiza a noção de que a prerrogativa de
legislar outorgada ao Estado constitui atribuição
jurídica essencialmente limitada, ainda que o
momento de abstrata instauração normativa possa
repousar em juízo meramente político ou discricionário do legislador.
RTJ 176/578-580, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno
Em suma: a prerrogativa institucional de
tributar, que o ordenamento positivo
reconhece ao Estado, não lhe outorga o poder de
suprimir (ou de inviabilizar) direitos de
caráter fundamental, constitucionalmente
assegurados ao contribuinte, pois este dispõe, nos
termos da própria Carta Política, de um sistema de
proteção destinado a ampará-lo contra eventuais
excessos cometidos pelo poder tributante ou
ainda, contra exigências irrazoáveis veiculadas em diplomas normativos
por este editados. A
análise dos autos evidencia que o acórdão proferido pelo E.
Tribunal Regional Federal da 5ª Região ajusta-se à
orientação prevalecente no âmbito do
Supremo Tribunal Federal, reafirmada em julgamentos
emanados desta Suprema Corte (RE 413.782/SC,
Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Pleno – RE
374.981/RS, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RE
409.956/RS, Rel. Min. CARLOS VELLOSO – RE 409.958/RS,
Rel. Min. GILMAR MENDES RE 414.714/RS, Rel.
Min. JOAQUIM BARBOSA – RE 424.061/RS, Rel. Min.
SEPÚLVEDA PERTENCE – RE 434.987/RS, Rel. Min.
CEZAR PELUSO, v.g. Sendo assim, e tendo
em consideração as razões expostas,conheço do presente
agravo, para negar seguimento ao recurso extraordinário, eis
que o acórdão recorrido está em harmonia com diretrizjurisprudencial
prevalecente nesta Suprema Corte (CPC, art. 544, § 4º, II, “
na redação dada pela Lei nº 12.322/2010).
Publique-se.
Brasília, 27 de junho de 2013.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator