O nível de endividamento das empresas brasileiras está entre os mais altos dos países emergentes, de acordo com o relatório Estabilidade Financeira Global, divulgado ontem pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). Apesar de o nível não ser considerado “preocupante”, o FMI alerta que a capacidade das companhias brasileiras de cumprir com as obrigações dos serviços de suas dívidas declinou, ao contrário de Chile, Indonésia e México, que apresentaram melhora. No caso do Brasil, o FMI mostra que a diferença de taxas (spread) pagas pelas empresas brasileiras para tomar recursos no exterior tem caído, enquanto o indicador de alavancagem, medido pela dívida total sobre o capital próprio, está em 79%, o maior nível entre todos os emergentes avaliados. Na Turquia, o mesmo indicador está em 57%, na Rússia em 56% e no México em 59%.
Após o Brasil, o país com taxa mais alta é a Índia, com 66%. Em uma tabela, o relatório ressalta que esse indicador piorou no Brasil na comparação com o período 2009/2013. “No geral, os níveis de alavancagem não parecem estar ainda em patamares críticos, mas alguns países e setores têm nível altos e crescentes de dívida que podem complicar o ajuste quando as condições financeiras eventualmente piorarem”, afirma o FMI no estudo. “O endividamento das empresas continua a crescer nos emergentes”, ressaltou o diretor do departamento monetário e de mercados de capitais do Fundo, José Viñals, em uma entrevista à imprensa ontem.
Ao mesmo tempo em que as empresas ficam mais alavancadas, a capacidade de fazer face ao serviço das dívidas é menor no Brasil que em outros emergentes. O indicador está em 3,1 vezes no Brasil, medido pela relação entre Ebitda (lucro antes dos impostos, juros, amortização e depreciação) e as despesas com juros. No México, o mesmo índice está em 6,5 vezes, na China em 6,6 vezes e na Rússia em 3,4. No caso brasileiro, o relatório ressalta que este indicador está se deteriorando na comparação com o período 2009/2013. Além disso, a desaceleração da atividade econômica em vários países comprometeu os ganhos das companhias, destaca o relatório.
BALANÇOS Muitas seguem com prejuízos em seus balanços. “Como consequência, em 2013, a participação total da dívida em risco por empresas fracas na Europa, Oriente Médio e América Latina continuou a crescer”, afirma o relatório, destacando que na China, a vulnerabilidade das empresas aumentou. As baixas taxas de juros nos países desenvolvidos nos últimos anos incentivaram a tomada de recursos no exterior por companhias de países emergentes, como as do Brasil, destaca o FMI.
Além disso, os juros próximos de zero e a liquidez elevada no mercado financeiro estimularam o apetite por risco dos investidores, que passaram a comprar mais bônus corporativos. No primeiro semestre de 2014, a emissão destes papéis cresceu 23%, de acordo com o documento, um dos níveis mais altos dos últimos semestres. O FMI não menciona no estudo setores ou empresas específicas mais endividadas no Brasil. O Fundo vem desde o início de 2013 alertando para a piora do endividamento das companhias nos emergentes. O aumento dos passivos em moeda estrangeiras das empresas, destaca o relatório Panorama Econômico Global divulgado ontem, eleva a exposição corporativa a riscos externos. Em abril, o FMI já havia alertado para a dificuldade de empresas de países como o Brasil de honrar seus passivos em caso de um cenário de estresse.
País não deve cumprir meta
O Brasil não deve cumprir este ano a meta de superávit primário estabelecida pelo governo, por conta da economia desaquecida, afirmou o Fundo Monetário Internacional (FMI) ao divulgar o relatório Monitor Fiscal, que traz estimativas sobre as contas públicas de vários países. A previsão é que o indicador brasileiro fique em 1,3% do Produto Interno Bruto (PIB) este ano, abaixo do objetivo de Brasília de 1,9%. Para 2015, a previsão do FMI é de melhora no superávit primário do setor público, para 2%, seguindo uma certa recuperação da economia brasileira.
Anteontem, os economistas da instituição já haviam cortado a previsão de crescimento do PIB do Brasil este ano, de 1,3% para 0,3%. Em 2015, se espera um número melhor, de 1,4%. Em 2016, o superávit primário subiria para 2,5%, de acordo com a estimativa do Fundo. O Monitor Fiscal traz ainda outras previsões para indicadores do Brasil, com melhora em algumas e piora em outras na comparação com o relatório que foi divulgado em abril pelo FMI, durante sua reunião em Washington. Para a dívida bruta, a expectativa é que fique em 65,8% do PIB este ano. No relatório anterior, a estimativa era de dívida de 66,7%.
Neste indicador, o Brasil tem número pior que outros países emergentes, que devem terminar o ano com índice médio de 33,7%, a metade do brasileiro. Em outros países, a previsão é que o México fique em 48,1% e a África do Sul em 47,3%. Para os desenvolvidos, a estimativa é de 80%. O FMI estima que o déficit nominal do Brasil deve ficar em 3,9% do PIB este ano. A estimativa é pior do que a feita em abril, com déficit de 3,3%. Em 2015, o indicador deve ficar em 3,1% do PIB, pior que o déficit de 2,5% previsto anteriormente.
Nos últimos seis meses, desde que divulgou o relatório fiscal anterior, o FMI avalia que o ambiente de baixas taxas de juros e volatilidade moderada no mercado financeiro mundial levou a um declínio das pressões nas finanças públicas em vários países. “Contudo, vulnerabilidades fiscais permanecem e novos riscos apareceram”, afirma o relatório divulgado ontem. Para os países avançados, a recomendação é que a política fiscal seja amigável ao crescimento econômico e a geração de empregos.
Nos países emergentes, os déficits e as taxas de endividamento permanecem relativamente moderadas, embora, no geral, acima da média de antes da crise financeira mundial de 2008, ressalta o FMI. A perspectiva de elevação dos juros em países desenvolvidos aliada ao menor crescimento potencial dos emergentes demanda um reforço do ambiente fiscal para lidar com riscos. “Nos emergentes, vulnerabilidades e riscos fiscais continuam a se acumular”, afirmou em entrevista o diretor do departamento de assuntos fiscais do FMI, Vitor Gaspar. Em alguns casos, disse ele, há riscos à sustentabilidade da dívida por conta de operações fora do orçamento público e garantias dos governos. “Muitos destes países têm em comum a necessidade de aumentar o crescimento potencial.”
Fluxo cambial positivo
Após a surpresa na última semana de agosto, que levou o saldo mensal para o terreno negativo (US$ 3,056 bilhões), o fluxo cambial fechou setembro no azul, segundo dados do Banco Central divulgados ontem. As entradas superaram as saídas em US$ 2,044 bilhões no mês passado. As operações financeiras responderam por metade desse resultado do período, com um ingresso líquido de US$ 1,022 bilhão, diferença entre entradas de US$ 45,931 bilhões e remessas de US$ 44,909 bilhões. No comércio exterior, responsável por outra metade do resultado, o saldo ficou positivo em US$ 1,021 bilhão, com importações de US$ 18,453 bilhões e exportações de US$ 19,474 bilhões. Nas exportações estão incluídos US$ 2,907 bilhões em Adiantamento de Contrato de Câmbio (ACC), US$ 6,699 bilhões em Pagamento Antecipado (PA) e US$ 9,868 bilhões em outras entradas.