Os fundos soberanos podem desempenhar um importante papel anticíclico na atual crise internacional e emergir como uma das mais importantes fontes de recursos para as empresas nos próximos anos. “Apesar da crise, os fundos soberanos continuam investindo em ações e a tendência é que invistam mais para melhorar a rentabilidade. Os títulos de governo como os dos Estados Unidos dão retorno baixo”, disse o professor de finanças Nuno Fernandes, do International Institute for Management Development (IMD), centro de estudos para executivos localizado em Lausanne, na Suíça.
Fernandes acaba de concluir estudo a respeito dos investimentos em ações dos fundos soberanos e o impacto nas empresas que receberam os recursos. O estudo cobriu 21,4 mil investimentos de fundos soberanos em ações de 7,7 mil empresas, em 58 países, de 2002 a 2007.
Segundo Fernandes, os fundos soberanos chegaram a somar um patrimônio de US$ 4 trilhões, antes da crise. A queda das bolsas reduziu em cerca de 25% essa carteira para a quantia ainda respeitável de US$ 3 trilhões, volume que é praticamente duas vezes o que possuem os fundos hedge e de private equity juntos. Foi uma queda inferior à média dos mercados, observou o professor. O estudo de Fernandes estima que os fundos soberanos vão administrar US$ 10 trilhões em 2015.
Os fundos soberanos continuam recebendo ingressos. As duas principais fontes de recursos são a receita obtida com o petróleo ou com exportações.
As empresas brasileiras podem se beneficiar especialmente da política de investimento dos fundos soberanos, disse Fernandes ao Valor em entrevista por telefone. Ele informou que os fundos soberanos têm investimentos em cerca de 30% das empresas brasileiras. Isso é o dobro do que ocorre em outros mercados. Em média, os fundos soberanos investem em 15% a 20% das empresas de outros países.
O estudo afirma que o investimento dos fundos soberanos tem uma “influência estabilizadora nas empresas e é avaliado positivamente pelo mercado”. Isso ocorre, segundo Fernandes, porque o investimento do fundo soberano reduz o custo de captação e protege a empresa de aquisições hostis por preços baixos. Além disso, seus contatos políticos ajudam as empresas a ampliar seus mercados.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) acaba de divulgar estudo dos pesquisadores Tao Sun e Heiko Hesse que vai exatamente na mesma direção. O estudo “Fundos soberanos e estabilidade financeira” relaciona três justificativas. Uma delas é o fato de os fundos soberanos não terem compromissos de curto prazo. Eles podem manter seus investimentos durante períodos de turbulência e até mesmo ir contra a aposta dominante do mercado. A injeção de capital sistemática dos fundos em importantes instituições financeiras entre 2007 e 2008 aumentou o estoque de capital dos bancos e reduziu o risco a curto prazo.
Outro motivo é o fato de os grandes fundos soberanos preferirem realocar seus ativos gradualmente para limitar o impacto negativo das oscilações de preços. Em terceiro, os fundos podem, como investidores de longo prazo, contribuir para melhorar a eficiência do mercado e reduzir a volatilidade.
De acordo com o estudo de Fernandes, as empresas que receberam investimentos de fundos soberanos aumentaram o retorno sobre o patrimônio de 11,2% para 15,7%; e o lucro antes dos impostos, juros, depreciação e amortizações (Ebitda) sobre os ativos passou de 11,2% a 11,7%.
O professor do IMD afirmou que ajudar as empresas em que investe a ampliar seus mercados é exatamente uma das linhas de atuação do fundo soberano brasileiro. “O Brasil montou seu próprio fundo soberano para ajudar as empresas a exportar e a crescer. Também vai ajudar empresas a terem melhor acesso ao mercado brasileiro”, afirmou.
O Brasil criou, no ano passado, seu fundo soberano com R$ 14,2 bilhões de patrimônio. Recentemente, esteve na mesa de discussão o uso desses recursos para financiar os investimentos das pequenas e médias empresas, que estão sofrendo mais acentuadamente o impacto da crise financeira internacional, como a escassez de crédito.
O estudo de Fernandes é categórico ao negar a existência de motivos políticos para os investimentos dos fundos soberanos. Segundo o professor, os fundos soberanos investem pouco em empresas de alta tecnologia e, em geral, assumem participações minoritárias. Acrescentou que as empresas que recebem recursos dos fundos soberanos registram melhoria operacional e na avaliação dos outros investidores, traduzida em um prêmio médio de 15% no valor de mercado da empresa.