O Professor Celso Ribeiro Bastos ensinava que “(…) em linhas gerais, o precatório é uma requisição judicial expedida ao Presidente do Tribunal pelo juiz da execução da sentença em que a Fazenda Pública foi condenada a pagamento de quantia certa, a fim de que sejam expedidas as necessárias ordens de pagamento às respectivas repartições competentes” (Comentários à Constituição Brasileira. São Paulo: Saraiva, 4º v., T. III, p. 47)
Quando da promulgação da Constituição Federal, a sistemática aplicável aos precatórios estava prevista no artigo 100 da CF, que determinava que quando houvesse sentença judicial transitada em julgado contra a Fazenda Pública, o pagamento seria realizado através de precatórios, por ordem cronológica de sua apresentação.
Além disso, estabelecia que os precatórios requisitados pelo Presidente do Tribunal onde o processo transitou em julgado até o dia 30 de junho de cada ano, deveriam ser pagos até o final do exercício seguinte, devidamente corrigidos.
Com o advento da Emenda Constitucional 30, de 13 de setembro de 2000, foi modificado o artigo 100 da Constituição Federale incluído o artigo 78 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT. As novidades trazidas pela EC 30/2000 podem ser assim resumidas:
a) aos precatórios pendentes de pagamento em 13/09/2000 (aqueles (i)já devidamente inscritos no Tribunal competente; (ii) os que Fazenda deixou de honrar a modo e tempo próprios e (iii) os regularmente inscritos que aguardam o momento de serem pagos) e aos que decorrem de ações iniciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999, vencidos e não pagos, foi conferida autorização para sua utilização na quitação de tributos da entidade devedora;
b) a concessão para decomposição de parcela do precatório, a critério do credor, ou seja, o vencedor de ação contra a Fazenda Pública pode escolher entre receber o crédito do precatório em uma parcela anual, ou em número maior de parcelas ao ano;
c) a permissão para a cessão de créditos decorrentes dos precatórios;
d) a estipulação do prazo máximo de dez anos para pagamento dos créditos, ou de dois anos quando se tratar de precatório original de desapropriação de único imóvel residencial do credor;
e) a determinação para que os precatórios sejam liquidados pelo seu valor real, em moeda corrente, acrescido de juros legais, em prestações anuais, iguais e sucessivas.
Posteriormente foi editada a Emenda Constitucional nº 62/2009 que mudou novamente o sistema de pagamento de precatórios pelos entes políticos.Pela nova Emenda Constitucional foram modificadas novamente as normas que tratam dos pagamentos de tributos, visto que foi inserido um método de compensação automático e obrigatório entre o credor originário (parte da ação) e a Fazenda Pública, que ocorre antes da própria expedição do precatório (tratada adiante).
Em vista disso, a Constituição Federal em vigor atualmente estabelece que: (i) os pagamentos das dívidas fazendárias serão feitos por meio de precatórios; (ii) estes obedecerão a ordem cronológica; (iii) quando da expedição dos precatórios, deles deverá ser abatido a título de compensação, valor correspondente aos débitos constituídos contra o credor original pela Fazenda Pública devedora, (iv) aos precatórios pendentes de pagamento em 13/09/2000 e aos que decorrem de ações iniciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999, vencidos e não pagos, foi conferida autorização para sua utilização na quitação de tributos da entidade devedora;(v) os valores devidos devem ser corrigidos monetariamente no lapso temporal que transcorrer entre a data da expedição do precatório de do efetivo pagamento; (vi) o credor pode ceder, total ou parcialmente, seus créditos em precatórios a terceiros, independentemente da concordância do devedor.
Poder Liberatório para Pagamento de Tributos
Como já se viu acima, pela dicção das normas constitucionais depreende-se que estas autorizam o sujeito passivo de tributo a extinguir o débito por meio de precatório. Contudo, não são todos os precatórios que tem poder liberatório para pagamento de tributos. Referida qualidade é atribuída apenas aos precatórios pendentes em 14/09/2000 (data de promulgação da EC 30/2000) e aos precatórios que decorram de ações iniciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999 vencidos e não pagos pela Fazenda devedora.
Assim, para o precatório tenha poder liberatório para pagamento de tributo, condição essencial é que tenha sido descumprido. Considera-se descumprido o precatório se a prestação anual a ser paga não tenha sido liquidada até o final do exercício (artigo 78, § 2º do ADCT).
Contudo há que se atentar que o pagamento do precatório ocorre em diversas parcelas anuais. Nesse aspecto, o Supremo Tribunal Federal já pacificou o entendimento de que, não satisfeita alguma das parcelas do precatório judicial, opera-se o poder liberatório para pagamento de tributos da Fazenda devedora no limite das parcelas vencidas. Ou seja, o vencimento de apenas uma parcela, não faz vencer toda a dívida e, assim, somente tem qualidade de liberar o pagamento de tributo a parcela que efetivamente não foi paga no seu vencimento.
Eis algumas ementas proferidas pelo STF nesse sentido:
“PRECATÓRIO JUDICIAL. PODER LIBERATÓRIO. 1. O benefício constante do § 2º do art. 78 do ADCT, na redação da EC 30/2000, incide apenas sobre as prestações não liquidadas e não sobre o total do débito constante do precatório. Precedente: ADI 2.851. 2. Agravo improvido.(SS 2589 AgR, Relator(a):Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 09/08/2006, DJ 22-09-2006 PP-00028 EMENT VOL-02248-01 PP-00166 LEXSTF v. 28, n. 335, 2006, p. 308-310)
EMENTA: CONSTITUCIONAL. PRECATÓRIO. COMPENSAÇÃO DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO COM DÉBITO DO ESTADO DECORRENTE DE PRECATÓRIO. C.F., art. 100, art. 78, ADCT, introduzido pela EC 30, de 2002. I. – Constitucionalidade da Lei 1.142, de 2002, do Estado de Rondônia, que autoriza a compensação de crédito tributário com débito da Fazenda do Estado, decorrente de precatório judicial pendente de pagamento, no limite das parcelas vencidas a que se refere o art. 78, ADCT/CF, introduzido pela EC 30, de 2000. II. – ADI julgada improcedente.(ADI 2851, Relator(a):Min. CARLOS VELLOSO, Tribunal Pleno, julgado em 28/10/2004, DJ 03-12-2004 PP-00012 EMENT VOL-02175-01 PP-00187 RIP v. 6, n. 29, 2005, p. 243-248 RDA n. 239, 2005, p. 463-467 RF v. 101, n. 378, 2005, p. 255-259 RTJ VOL-00193-01 PP-00106).
Cessão de Crédito
A Constituição Federal permite a cessão de créditos decorrentes dos precatórios independentemente da concordância do devedor, bem como autoriza também a cessão total ou parcial do crédito a terceiros, esta última por meio da decomposição de parcelas.
A legislação tributária infra-constitucional não trata especificamente da cessão de crédito, contudo a Resolução/CNJ 115/2010 reitera os termos da Constituição Federal afirmando que “o credor de precatório poderá ceder, total ou parcialmente, seus créditos a terceiros, independentemente da concordância do devedor”.
Contudo, deve se atentar que o fisco somente considera válida a cessão, depois de proferida decisão transitada em julgado em relação ao valor devido pela Fazenda. A Receita Federal tem desconsiderado as cessões de precatórios, quando não há certeza em relação ao quantum devido (Acórdão nº 03-32573 de 14 de Agosto de 2009 – Segunda Turma, DRJ/BSB)
No caso a cessão dever ser feita preferencialmente por instrumento público, nos termos do artigo 288 do Código Civil, que estabelece ser “ineficaz, em relação a terceiros, a transmissão de um crédito, se não celebrar-se mediante instrumento público, ou instrumento particular revestido das solenidades do § 1o do art. 654”.
A cessão de precatórios somente produzirá efeitos após comunicação, por meio de petição protocolizada, ao juízo de origem e à entidade devedora, antes da apresentação da requisição ao Tribunal (art. 16, § 3º da Resolução/CNJ 115/2010).
DIFICULDADES E CUIDADOS QUE DEVEM SER OBSERVADOS
Da Aplicação Imediata do Artigo 78 § 2º do ADCT
Não obstante previsto na Constituição Federal, ainda não existe lei no âmbito federal regulando o poder liberatório para pagamento de tributos dos precatórios.
No nosso entendimento, o poder liberatório do precatório não necessita de regulamentação por lei infra-constitucional para ser aplicado imediatamente. A Constituição Federal não autorizou o legislador ordinário a limitar ou exigir outras condições para que se perfaça o poder liberatório do pagamento de tributos pela Fazenda Pública devedora. A norma constitucional em questão se insere naquelas que não necessitam de complementação para surtir efeito.
Por outro lado, há que se atentar que a Receita Federal não tem entendimento unânime quanto à possibilidade de utilização imediata do precatório para pagamento de tributos. Algumas soluções de consultas e decisões administrativas consignam que apesar da Constituição Federal prever tal possibilidade, a matéria precisa ser regulamentada por norma infra-constitucional.
Abaixo seguem duas soluções de consulta. A primeira contrária e a segunda favorável ao detentor do precatório:
“Solução de Consulta nº 57 de 01 de Outubro de 2008- DISIT 04
EMENTA: COMPENSAÇÃO. TÍTULOS PÚBLICOS. TÍTULOS REPRESENTATIVOS DA DÍVIDA PÚBLICA FEDERAL. OBRIGAÇÕES DA ELETROBRÁS. PRECATÓRIOS. PRESTAÇÕES ANUAIS. TRIBUTOS E CONTRIBUIÇÕES FEDERAIS
As prestações anuais dos precatórios pendentes na data da promulgação da Emenda Constitucional nº 30, de 2000, ou decorrentes de ações iniciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999, caso não sejam liquidadas até o final do exercício a que se referem, poderão, em princípio, ser utilizadas na compensação de tributos da entidade política devedora, permitida a cessão dos créditos. No entanto, o direito à utilização das citadas prestações anuais dos precatórios da União, na compensação de tributos e contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, somente poderá ser exercido após a regulamentação do art. 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias pelo Congresso Nacional e/ou pelo Poder Executivo Federal”.
“Solução de Consulta nº 230 de 25 de Setembro de 2001- DISIT 08
ASSUNTO: Normas Gerais de Direito Tributário
EMENTA: As prestações anuais dos precatórios pendentes na data de promulgação da Emenda Constitucional nº 30, de 2000, e os que decorram de ações iniciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999, se não liquidadas até o final do exercício a que se referem, terão poder liberatório do pagamento de tributos da entidade devedora, permitida a cessão dos créditos. A compensação deverá ser requerida conforme disposto nas normas expedidas pela Secretaria da Receita Federal”.
Compensação de Precatórios com Débitos Constituídos Contra o Credor Original
A Constituição Federal permitiu que no momento da expedição dos precatórios o Poder Público abatesse unilateralmente o valor dos débitos líquidos e certos, inscritos ou não em Dívida Ativa constituídos contra o credor original pela Fazenda Pública devedora, inclusive parcelas vincendas de parcelamentos (art. 100, § 9º, da CF/88).
Somente não podem ser objeto de abatimento os débitos tributários cuja execução esteja suspensa em virtude de contestação administrativa ou judicial.
A regra foi criada para resguardar os créditos fazendários. Trata-se de direito do Fisco e o particular sequer participa do trâmite prévio à expedição do precatório, que ocorre apenas entre o Executivo e o Judiciário. Vale dizer, a Fazenda informa ao Tribunal sobre a existência de débitos, dentro do prazo decadencial de 30 dias, para que se efetive a compensação.
De se salientar que mesmo que tenha ocorrido cessão de créditos, será realizada eventual compensação de dívidas tributárias do credor originário.
Na prática ocorre o seguinte:
a) O juiz profere decisão garantindo ao titular original do crédito o pagamento através de um precatório, mas antes encaminhamento do precatório ao Tribunal, intimará a Fazenda Pública (ou outro ente devedor) para que informe, em 30 dias, sobre a existência de débitos constituídos contra o credor original pela Fazenda Pública devedora, incluídas parcelas vincendas de parcelamentos (art. 6º da Resolução/CNJ 115/2010);
b) Na hipótese da Fazenda não se manifestar ou deixar de apontar débitos do credor original, perderá o direito de abatimento (art. 6º da Resolução/CNJ 115/2010);
c) Se a Fazenda apontar algum débito do credor original de natureza tributária constituído em seu favor o juiz decidirá a questão, após ouvir a parte contrária, decidindo em seguida (art. 6º da Resolução/CNJ 115/2010);
d) Caso a decisão entenda que a Fazenda realmente tem um crédito tributário contra o vencedor da ação, ou seja, caso se apure que o particular e a Fazenda são ao mesmo tempo credor e devedor um do outro, as duas obrigações serão extintas, até onde se compensarem e o juiz emitirá certificado de compensação para fins de controle orçamentário e financeiro, juntando-os ao processo de expedição do precatório (art. 6º da Resolução/CNJ 115/2010);
e) A compensação se operará no momento da efetiva expedição do certificado de compensação, quando cessará a incidência de correção monetária e juros moratórios sobre os débitos compensados (art. 6º da Resolução/CNJ 115/2010 com a redação da Resolução/CNJ n° 123/2010);
f) O procedimento de compensação, quando realizado no âmbito do Tribunal, não impedirá a inscrição do precatório apresentado até 1º de julho de um ano no orçamento do ano seguinte da entidade devedora, deduzindo-se o valor compensado, caso reconhecida posteriormente a compensação (art. 6º da Resolução/CNJ 115/2010 com a redação da Resolução/CNJ n° 123/2010);
g) A cessão de créditos não alterará a natureza comum ou alimentar do precatório e não prejudicará a compensação, sendo considerado, para esse fim, o credor originário (art. 6º da Resolução/CNJ 115/2010).
Isto faz com que os riscos da compra de precatórios sejam grandes, pois o cessionário pode vir a sofrer uma compensação forçada em decorrência de débito do cedente. E mesmo que o crédito do precatório tenha sido cedido a terceiro pelo credor, a Fazenda pode impugnar a cessão que o credor fez, opondo ao cessionário a compensação do crédito.
Em razão da possibilidade de compensação deve-se atentar quando da compra dos precatórios se o cedente tem dívidas junto ao fisco, pois se for o caso, provavelmente será realizada a compensação entre créditos e débitos, não podendo ser obstada a pedido do particular/credor. O dispositivo constitucional é claro no sentido de garantir a compensação contra o credor original (cedente).
Cabe ressaltar que a autorização para compensação trazida pela EC 62 pode causar inúmeros transtornos, pois na prática, existem muitos lançamentos realizados pela Fazenda com o desconhecimento do devedor.
Precatórios Oriundos de Outras Entidades
Há que se atentar também se o precatório objeto da cessão é originário de ações em que a Fazenda Nacional é parte, ou se outro ente federal é que compõem um dos pólos da ação (ex: autarquia federal). E isto porque a possibilidade de compensação de débito tributário com crédito decorrente de precatório de pessoa jurídica que não seja a Fazenda Nacional é matéria controvertida.
De fato, o Superior Tribunal de Justiça pela sua Primeira Turma firmouentendimento no sentido de que “é ilegítima a pretensão de se compensar débito tributário (devido à administração direta) com crédito de precatório adquirido de terceiros (por cessão) e da responsabilidade de entidade da administração indireta” (RMS 27.706/MG), conforme ementa que abaixo se transcreve a título exemplificativo:
“TRIBUTÁRIO. COMPENSAÇÃO. PRECATÓRIO. DÉBITO DE ICMS. CRÉDITOS DECORRENTES DE AUTARQUIA. DER. AUSÊNCIA DE NORMA ESTADUAL. DÉBITOS TRIBUTÁRIOS DO ESTADO. PRECATÓRIO DE NATUREZA ALIMENTAR. INADMISSIBILIDADE. ART. 78, § 2º, DO ADCT. DECRETO ESTADUAL Nº 418/07. PRECEDENTES. IMPOSSIBILIDADE.
1. A compensação de débito fiscal estadual (ICMS) com crédito de precatório de natureza distinta e entre pessoas jurídicas diversas não é possível quando não previsto em legislação especial. Precedentes: RMS 26802/DF, Rel. p/ Acórdão Ministro Castro Meira, DJe 18/02/2010; RMS 31184/PR, Rel. MinistroCastro Meira, DJe 29/04/2010; RMS 30.229/PR, Rel. MinistroHumberto Martins, DJe 18/02/2010; EDRMS 29.806/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 28.10.09; AgRMS 30.347/PR, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 26.11.09; RMS 24.450/MG, Rel. Ministro José Delgado, Primeira Turma, julgado em 8/4/2008, DJe 24/4/2008. (AgRg no RMS 31.592/PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/08/2010, DJe 27/08/2010).
No mesmo sentido: AgRg no RMS 31672, AgRg no RMS 31885 PR, AgRg no RMS 31962, AgRg no RMS 31123, AgRg no RMS 31137 PR, AgRg no RMS 31172 PR, AgRg no RMS 31443 PR, AgRg no RMS 31545 PR, RMS 31109 PR.
O Supremo Tribunal Federal ainda não tem jurisprudência consolidada quanto à possibilidade, ou não, de utilização de precatório para pagamento de tributos cedido por terceiro e oriundo de outro ente, que não as Fazendas Públicas.
Contudo, já existe precedente do Supremo Tribunal Federal no sentido de que a circunstância de o devedor do precatório ser diferente do credor dos tributos que se pretende compensar, não é relevante para impedir a utilização de precatório para quitação de tributos, desde que ambos integrem a mesma esfera política. Assim, se o devedor do precatório for, por exemplo, uma autarquia federal, pode o precatório ser utilizado para quitar tributos federais.
Eis o precedente mencionado:
“DECISÃO:
1. Discute-se no presente recurso extraordinário o reconhecimento do direito à utilização de precatório, cedido por terceiro e oriundo de autarquia previdenciária do Estado-membro, para pagamento de tributos estaduais à Fazenda Pública.
2. O acordão recorrido entendeu não ser possível a compensação por não se confundirem o credor do débito fiscal — Estado do Rio Grande do Sul — e o devedor do crédito oponível — a autarquia previdenciária.
3. O fato de o devedor ser diverso do credor não é relevante, vez que ambos integram a Fazenda Pública do mesmo ente federado [Lei n. 6.830/80]. Além disso, a Constituição do Brasil não impôs limitações aos institutos da cessão e da compensação e o poder liberatório de precatórios para pagamento de tributo resulta da própria lei VOLTAR
“Não só a extensão, mas sobretudo a complexidade das obrigações tributárias impostas por meio de uma legislação não só muito instável, mas sobretudo de verdadeiro cipoal e repleta de dúvidas, causando um generalizado estado de incerteza, poderia autorizar o mesmo poder público, principal responsável por essa situação, a exigir o cumprimento por meio de penas privativas de liberdade? Mesmo nos países em que se configuram e se punem crimes tributários, a jurisprudência revela escassa aplicação e grande cautela dos órgãos fiscais e tribunais judiciários nessa imposição de pena privativa de liberdade”. (Ruy Barbosa Nogueira)
I - INTRODUÇÃO
O Brasil, mantendo um sistema tributário excessivamente burocrático e oneroso, com a existência de inúmeros impostos, taxas e contribuições, encontra-se dentre os países que ostentam uma das maiores cargas tributárias mundiais, chegando ao patamar de 34,23% do PIB nacional no ano de 2006, conforme estudo apresentado pela Secretaria da Receita Federal do Brasil - SRFB acerca da carga tributária no Brasil. Este elevado ônus tributário que os contribuintes brasileiros precisam conviver, ao invés de propiciar uma grande arrecadação para os governos federal, estadual e municipal, vem sendo uma das principais causas da existência do inadimplemento da obrigação tributária, isto é, o não recolhimento, por parte do sujeito passivo, dos tributos por ele devidos dentro dos prazos especificados em lei.
Deixemos para trás a problemática da insuportável carga tributária nacional, para avançarmos nos mecanismos arbitrários que o Estado vem se utilizando para arrecadar a enorme quantidade de tributos existentes no país, sendo que um deles traduz numa verdadeira ofensa aos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos brasileiros previstos na Constituição Federal de 1988, qual seja: a criação e utilização da legislação criminal como instrumento destinado a coagir o contribuinte inadimplente com o Fisco.
Veremos no transcorrer deste artigo que o não pagamento de tributo dentro do prazo estabelecido pela lei, ao invés de constituir-se tão somente uma infração tributária passível de sanções na esfera administrativa e tributária, passou a ser considerada com o advento do artigo 2º, inciso II, da Lei nº 8.137/90, infração penal apenada com privação da liberdade daquele que não recolhe seus tributos em tempo hábil. Confira-se.
Art. 2° Constitui crime da mesma natureza:
II - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos;
A vigência desse comando há mais de uma década fez nascer a real possibilidade de aprisionamento de um cidadão por inadimplemento de uma obrigação tributária, trazendo à tona a inaceitável prisão por dívida fora das exceções expressas na Carta Magna em clara ofensa a princípios constitucionais e tratados internacionais
II - DO PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA DO DIREITO PENAL
A utilização do Direito Penal nas infrações tributárias deve-se dar com cautela e parcimônia, a fim de que o recurso à sanção criminal somente se deva dar após esgotados todos os meios e recursos colocados à disposição do Poder Público.
É necessário saber separar “o joio do trigo” na aplicação da norma penal tributária, isto é, distinguir as condutas que constituem mero descumprimento de obrigação principal ou acessória, daquelas que representam verdadeiro “atentado” contra a ordem tributária, como é o caso do cometimento de fraude, inserção de dados falsos, alteração e falsificação de notas fiscais, dentre outras.
O princípio aqui exposto vem sendo reiteradamente desrespeitado pelo Poder Público na medida em que o próprio órgão arrecadador, verificando o não recolhimento do tributo no prazo assinalado por lei, utiliza-se, concomitantemente, da cobrança administrativa tributária da exação e da representação fiscal para fins penais (oficio encaminhado ao Ministério Público) informando ao parquet suposta existência de conduta tipificada como crime tributário. Este por sua vez, requisita a instauração de inquérito policial que, invariavelmente resulta no oferecimento de denúncia dando-se início a persecução penal. Vale reafirmar que o simples inadimplemento não pode fazer nascer à figura do direito penal, devendo a utilização da sanção criminal se restringir a hipóteses excepcionais que mereçam a reprimenda penal.
É dizer, verificada a existência de dolo, fraude, simulação, adulteração, e demais condutas que entram no campo do estatuto repressivo, o Fisco estará apto a representar aos órgãos competentes para tomar as providências cabíveis. Por outro lado à situação do mero descumprimento de obrigação tributária, seja ela principal ou acessória, está completamente desprovida de dolo, fraude ou premeditação a viabilizar a utilização do direito penal.
Transcrevo ensinamentos acerca da matéria expostos pelo ilustre advogado catarinense Célio Armando Janczeski:
“Na hipótese do inc. II, art. 2º, salta aos olhos que sua aplicação não pode ter interpretação literal, sob pena de se estar punindo criminalmente o mero inadimplemento, vedado pela Constituição, que impede a prisão por dívidas Se o contribuinte nada esconde do Fisco, informando inclusive o valor devido, mas deixa de efetivar o recolhimento, demonstra de forma inequívoca seus desejos de efetuar o recolhimento (com as sanções pecuniárias da multa, juros, etc.) e de não sonegar o tributo. Tal fato ainda é reforçado quando há comprovação de falta de recursos, decorrentes de questões estruturais, de mercado e até inadimplência do próprio Governo perante o contribuinte, inviabilizando o recolhimento no prazo previsto pela Lei”.
Sendo o direito penal a forma mais violenta de intervenção do Estado na liberdade dos cidadãos, sua intervenção somente deve ocorrer quando for absolutamente necessário, de modo a respeitar a excepcionalidade de sua condição de ultima ratio.
III - DIFERENÇAS ENTRE INFRAÇÃO TRIBUTÁRIA E INFRAÇÃO PENAL E SUAS CONSEQUÊNCIAS
No momento em que não há o recolhimento do tributo dentro do prazo assinalado por lei, ocorre a chamada infração tributária, que consiste numa penalidade aplicada ao sujeito passivo da obrigação tributária em razão do atraso no pagamento da exação, gerando ao Estado-credor o direito de receber uma “indenização” a título de multa pelo não pagamento tempestivo. Isso é um ponto.
Outro ponto é o Estado, através do Poder Legislativo, tipificar como crime o atraso no pagamento de tributos, sendo que não raras são às vezes em que a capacidade contributiva do sujeito passivo da obrigação tributária está muito aquém das inúmeras, e elevadíssimas exigências tributárias impostas por este mesmo Estado.
Aqui nos parece haver uma verdadeira confusão de conceitos no que se refere a criminalização do inadimplemento de obrigação tributária, equiparando-se a infração tributária a uma infração penal tributária, sendo certo que as infrações ora mencionadas possuem estruturas e naturezas claramente distintas.
Consoante ensinamentos da melhor doutrina podemos afirmar que a infração tributária possui caráter eminentemente obrigacional relacionadas a diversos ônus a que são submetidos os contribuintes quando do nascimento da obrigação tributária principal. A conseqüência do inadimplemento desta obrigação deságua na chamada infração tributária, que se caracteriza pela punição com aplicação de multas e juros ao contribuinte que não cumpriu com seus deveres tributários.
Já a infração penal tributária consiste na verificação da ocorrência de situações ligadas a fraude e/ou dolo praticadas pelos contribuintes com intuito de os mesmos se absterem do dever de pagar tributos. Suas conseqüências são a cominação de penas de detenção e reclusão conforme incisos dos artigos 1º e 2º da Lei n 8.137/90.
Logo podemos afirmar a existência de um primeiro requisito: somente haverá infração penal tributária quando o agente tiver o intuito de lesar os cofres públicos, ou seja, é necessário o animus, a intenção do agente em não recolher os tributos através de condutas fraudulentas. O mero inadimplemento de obrigação tributária não faz presumir que o contribuinte em débito com o Fisco tenha se utilizado de artifícios ardis para não recolher, ou recolher a menor, tributo por ele devido. Em direito penal não há que se falar em presunção de dolo. Ou o dolo é verificado na conduta ou nela ele não se encontra, de modo que neste último caso haverá a ocorrência somente da infração tributária, não se falando em hipótese alguma de infração penal tributária, sob pena de transformarmos o direito penal em instrumento de arrecadação do Estado.
IV - DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DO CRIME EM RAZÃO DO PAGAMENTO DO TRIBUTO – INEXISTÊNCIA DA PRISÃO PENAL – CARACTERIZAÇÃO DA PRISÃO CIVIL POR DÍVIDA
As disposições contidas na lei 8.137/90 vigoram há mais de uma década no ordenamento jurídico pátrio em função da declaração de constitucionalidade feita pela Suprema Corte em julgados nos quais houve o entendimento de que as penas cominadas aos crimes tipificados nos artigos 1º e 2º da lei tratavam-se de penas por prisão penal e não por prisão civil como fora defendido. Embora respeitável as decisões do STF, não podemos concordar com a assertiva de que se trata de prisão penal. Senão vejamos.
A prisão civil por dívida expressa pela CF/88 tem por objetivo compelir o devedor de prestação alimentícia e o depositário infiel, respectivamente, a pagar ao alimentado o que lhe é devido, e entregar o bem do qual era depositário ou o seu valor correspondente. É essa a função da prisão civil por dívida, que não se confunde com a prisão penal que tem por escopo essencial retribuir o injusto praticado pelo condenado e readaptá-lo socialmente a fim de reinseri-lo novamente dentro do convívio social.
Ora, quando uma lei penal entra em vigor dispondo que o pagamento do tributo faz extinguir a punibilidade dos crimes tipificados na lei 8.137/90, ela nos faz acreditar que a única finalidade da pena aplicada pela violação dos artigos da referida lei é de coagir o contribuinte a pagar os tributos devidos, comprovando-se desta maneira a estrita ligação com a finalidade da prisão civil por dívida.
Se se tratasse de pena criminal como defende a Suprema Corte brasileira, estaria a mesma dizendo que as penas criminais estariam desprovidas de suas finalidades básicas, quais sejam: a prevenção ao cometimento de novos crimes e a ressocialização dos condenados. Vimos que o pagamento a qualquer tempo do tributo faz com que o agente saia ileso de sanções penais de qualquer espécie, o que vem em total divórcio com as finalidades acima mencionadas.
Com o advento das Leis n 9.964/00 (REFIS) e 10.684/03 (PAES) estabeleceu-se à extinção da punibilidade dos crimes referidos na lei 8.137/90 quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais.
A lei 9.964/00 (REFIS) assim dispõe:
“Art. 15. É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1o e 2o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e no art. 95 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no Refis, desde que a inclusão no referido Programa tenha ocorrido antes do recebimento da denúncia criminal.
§3. Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento antes do recebimento da denúncia criminal”. (grifo nosso)
Segue disposição contida na Lei n 10.684/03 (PAES):
“Art. 9o É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1o e 2o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168A e 337A do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento.
§ 2o Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios”. (grifo nosso)
Destas disposições normativas conclui-se o seguinte: a existência de inadimplemento da obrigação tributária gera a utilização ilegal do direito penal para cobrança de tributos; havendo pagamento do valor devido, extingue-se a punibilidade do agente visto que a norma penal surtiu efeito; assim verifica-se a existência da inconstitucional prisão civil por dívida fora das hipóteses descritas na CF. Confira-se:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel”. (grifo nosso)
Mister ressaltar também que o Pacto de São José da Costa Rica (Convenção Americana sobre Direitos Humanos) tratado internacional incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992, dispõe acerca da ilegalidade da prisão civil por dívida, seja ela obrigacional privada, obrigacional tributária, excetuando-se a obrigacional alimentar, in verbis:
“Artigo 7º - Direito à liberdade pessoal:
7. Ninguém deve ser detido por dívidas. Este princípio não limita os mandatos de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar.
V - CONCLUSÃO
Posto isto o presente artigo visa identificar através dos conceitos supra expostos à inconstitucionalidade da utilização do Direito Penal como mecanismo arbitrário de cobrança de tributos, o que já vem ocorrendo desde a publicação da Lei nº 8.137/90, especialmente com o comando contido no inciso II, do art. 2º, da referida Lei que contém disposições que induzem-nos a acreditar numa prisão penal autorizada pelo texto constitucional, mas que de fato cria uma nova espécie de prisão civil por dívida: a prisão por inadimplemento de obrigação tributária em frontal violação a princípios e garantias inseridas na Constituição da República de 1988.
VI – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
JESUS, Damásio E. de. Direito Penal: parte geral. São Paulo: Saraiva, vol. I, 21a ed. rev. e atual.,
1998.
Direito Penal Tributário / Marcelo Magalhães Peixoto, André Elali, Carlos Soares Sant’Anna, coordenadores. – São Paulo : MP Editora, 2005.
NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Curso de Direito Tributário. 4ed. São Paulo: Instituto Brasileiro de Direito Tributário, 1976. p.177.
(…)
Dou provimento ao recurso extraordinário, com fundamento no disposto no art. 557, § 1º-A, do CPC. Custas ex lege. Sem honorários”. (RE 550400, Relator(a): Min. EROS GRAU, julgado em 28/08/2007, publicado em DJ 18/09/2007 PP-00080 REPUBLICAÇÃO: DJe-108 DIVULG 21-09-2007 PUBLIC 24-09-2007 DJ 24/09/2007 PP-00119).
Precatórios de Natureza Alimentar
A Constituição Federal define precatório de natureza alimentar no seu artigo 100, § 1º nos seguintes termos: “os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado, e serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, exceto sobre aqueles referidos no § 2º deste artigo”
Os precatórios de natureza alimentar têm a vantagem de ter preferência de pagamento sobre os precatórios comuns. Contudo, estes precatórios têm a seguinte desvantagem, não existe ainda consenso nos Tribunais Superiores a respeito da possibilidade de se utilizá-los para compensação com débitos tributários (art. 16 da Resolução/CNJ 115/2010).
O Superior Tribunal de Justiça tem jurisprudência consolidada no sentido de afastar pretensão de empresas utilizarem precatórios com o intuito de compensar tributos.
Segundo o Superior Tribunal de Justiça, não obstante o § 2º do artigo 78 do ADCT determinar que os precatórios relacionados no caput terão poder liberatório do pagamento de tributos, o caput do mesmo artigo 78 exclui os créditos de natureza alimentar e de pequeno valor. Assim, a compensação tributária com precatórios de natureza alimentar é hipótese não prevista no art. 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias que não a permite.
Eis algumas ementas da jurisprudência mencionada:
“CONSTITUCIONAL – RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – ART. 78, § 2º, DO ADCT – PODER LIBERATÓRIO DO PAGAMENTO DE TRIBUTOS – CRÉDITO DE NATUREZA ALIMENTAR.
1. As parcelas do precatório submetido à moratória do art. 78 do ADCT, se não liquidadas até o final do prazo previsto, passam a ter poder liberatório do pagamento de tributos da entidade devedora, nos moldes do § 2º do mesmo dispositivo constitucional.
2. À luz do referido enunciado normativo, ressalvados os créditos de pequeno valor, os de natureza alimentícia, os previstos no art. 33 do ADCT e suas complementações e ainda os que já tiverem os recursos liberados, os precatórios que forem objeto de parcelamento e cujas parcelas não forem pagas até o final do prazo constitucional, terão eficácia liberatória do pagamento de tributos .
3. Hipótese em que os créditos contidos no precatório objeto de compensação originam-se de honorários de sucumbência em ação indenizatória, qualificando-se como créditos alimentares.
4. Recurso ordinário em mandado de segurança não provido”.
(RMS 31.160/PR, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 24/08/2010, DJe 08/09/2010)
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO NO MANDADO DE SEGURANÇA. COMPENSAÇÃO DE DÉBITOS TRIBUTÁRIOS COM CRÉDITO DE PRECATÓRIO VENCIDO, E NÃO PAGO. NATUREZA DAS AÇÕES DE ONDE ORIGINADOS OS PRECATÓRIOS. ART. 78, § 2º, DO ADCT. CRÉDITO DE NATUREZA ALIMENTAR. JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA DO STJ.(…)
2. A atual jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que não há falar em poder liberatório do pagamento de tributos, nos termos do art. 78, § 2º, do ADCT, quanto aos precatórios de natureza alimentar. Esse entendimento decorre da literalidade do art. 78, § 2º, do ADCT, cujo teor, explicitamente, ressalva os créditos de natureza alimentícia.
3. Agravo regimental não provido. (AgRg no RMS 29.544/PR, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/04/2010, DJe 27/04/2010)
Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal quando do julgamento da ADIN 1.662/SP, decidiu pela inaplicabilidade do artigo 78 do ADCT aos precatórios alimentares. Em vista disso, em tese os precatórios de natureza alimentar não teriam poder liberatório para pagamento de tributos, visto que este poder é conferido pelo artigo 78, § 2º do ADCT.
Contudo, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral dos temas relativos à aplicabilidade imediata do art. 78, § 2º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT e à possibilidade de se compensar precatórios de natureza alimentar com débitos tributários (RE 566349 RG). Assim, é possível que o Supremo venha a entender que os precatórios de natureza alimentar adquiridos de terceiros podem ser cedidos e utilizados com efeito liberatório para pagamento de tributos, mas ainda não há qualquer segurança quanto a isso.
Descontos com honorários de advogado, perito e retenções de tributos
Deve se atentar que, parte dos créditos decorrentes de uma ação judicial podem pertencer à outras pessoas, que não o vencedor da ação, tais como advogados, peritos, dentre outros.
Com efeito, além dos honorários de sucumbência que normalmente já estão especificados no processo, ainda pode haver um fator surpresa, pois antes da expedição do precatório, o advogado que participou da ação tem o direito de juntar aos autos o contrato de honorários firmado com o seu cliente e, nesta hipótese, o juiz irá determinar que lhe sejam pagos diretamente os valores a que faz jus, por dedução da quantia a ser recebida pelo seu cliente.Esta possibilidade afeta diretamente o montante a ser pago no precatório, pois pode alterar consideravelmente o valor do crédito constante do precatório.
Além disso, quando do pagamento do crédito decorrente do precatórios, são retidos valores a título de imposto de renda na fonte, bem como os valores a título de contribuição previdenciária.
Finalmente se esclarece que os precatórios serão expedidos individualizadamente, por credor, ainda que exista litisconsórcio.