O Professor Celso Ribeiro Bastos ensinava que “(…) em linhas gerais, o precatório é uma requisição judicial expedida ao Presidente do Tribunal pelo juiz da execução da sentença em que a Fazenda Pública foi condenada a pagamento de quantia certa, a fim de que sejam expedidas as necessárias ordens de pagamento às respectivas repartições competentes” (Comentários à Constituição Brasileira. São Paulo: Saraiva, 4º v., T. III, p. 47)
Quando da promulgação da Constituição Federal, a sistemática aplicável aos precatórios estava prevista no artigo 100 da CF, que determinava que quando houvesse sentença judicial transitada em julgado contra a Fazenda Pública, o pagamento seria realizado através de precatórios, por ordem cronológica de sua apresentação.
Além disso, estabelecia que os precatórios requisitados pelo Presidente do Tribunal onde o processo transitou em julgado até o dia 30 de junho de cada ano, deveriam ser pagos até o final do exercício seguinte, devidamente corrigidos.
Com o advento da Emenda Constitucional 30, de 13 de setembro de 2000, foi modificado o artigo 100 da Constituição Federale incluído o artigo 78 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT. As novidades trazidas pela EC 30/2000 podem ser assim resumidas:
a) aos precatórios pendentes de pagamento em 13/09/2000 (aqueles (i)já devidamente inscritos no Tribunal competente; (ii) os que Fazenda deixou de honrar a modo e tempo próprios e (iii) os regularmente inscritos que aguardam o momento de serem pagos) e aos que decorrem de ações iniciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999, vencidos e não pagos, foi conferida autorização para sua utilização na quitação de tributos da entidade devedora;
b) a concessão para decomposição de parcela do precatório, a critério do credor, ou seja, o vencedor de ação contra a Fazenda Pública pode escolher entre receber o crédito do precatório em uma parcela anual, ou em número maior de parcelas ao ano;
c) a permissão para a cessão de créditos decorrentes dos precatórios;
d) a estipulação do prazo máximo de dez anos para pagamento dos créditos, ou de dois anos quando se tratar de precatório original de desapropriação de único imóvel residencial do credor;
e) a determinação para que os precatórios sejam liquidados pelo seu valor real, em moeda corrente, acrescido de juros legais, em prestações anuais, iguais e sucessivas.
Posteriormente foi editada a Emenda Constitucional nº 62/2009 que mudou novamente o sistema de pagamento de precatórios pelos entes políticos.Pela nova Emenda Constitucional foram modificadas novamente as normas que tratam dos pagamentos de tributos, visto que foi inserido um método de compensação automático e obrigatório entre o credor originário (parte da ação) e a Fazenda Pública, que ocorre antes da própria expedição do precatório (tratada adiante).
Em vista disso, a Constituição Federal em vigor atualmente estabelece que: (i) os pagamentos das dívidas fazendárias serão feitos por meio de precatórios; (ii) estes obedecerão a ordem cronológica; (iii) quando da expedição dos precatórios, deles deverá ser abatido a título de compensação, valor correspondente aos débitos constituídos contra o credor original pela Fazenda Pública devedora, (iv) aos precatórios pendentes de pagamento em 13/09/2000 e aos que decorrem de ações iniciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999, vencidos e não pagos, foi conferida autorização para sua utilização na quitação de tributos da entidade devedora;(v) os valores devidos devem ser corrigidos monetariamente no lapso temporal que transcorrer entre a data da expedição do precatório de do efetivo pagamento; (vi) o credor pode ceder, total ou parcialmente, seus créditos em precatórios a terceiros, independentemente da concordância do devedor.
Poder Liberatório para Pagamento de Tributos
Como já se viu acima, pela dicção das normas constitucionais depreende-se que estas autorizam o sujeito passivo de tributo a extinguir o débito por meio de precatório. Contudo, não são todos os precatórios que tem poder liberatório para pagamento de tributos. Referida qualidade é atribuída apenas aos precatórios pendentes em 14/09/2000 (data de promulgação da EC 30/2000) e aos precatórios que decorram de ações iniciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999 vencidos e não pagos pela Fazenda devedora.
Assim, para o precatório tenha poder liberatório para pagamento de tributo, condição essencial é que tenha sido descumprido. Considera-se descumprido o precatório se a prestação anual a ser paga não tenha sido liquidada até o final do exercício (artigo 78, § 2º do ADCT).
Contudo há que se atentar que o pagamento do precatório ocorre em diversas parcelas anuais. Nesse aspecto, o Supremo Tribunal Federal já pacificou o entendimento de que, não satisfeita alguma das parcelas do precatório judicial, opera-se o poder liberatório para pagamento de tributos da Fazenda devedora no limite das parcelas vencidas. Ou seja, o vencimento de apenas uma parcela, não faz vencer toda a dívida e, assim, somente tem qualidade de liberar o pagamento de tributo a parcela que efetivamente não foi paga no seu vencimento.
Eis algumas ementas proferidas pelo STF nesse sentido:
“PRECATÓRIO JUDICIAL. PODER LIBERATÓRIO. 1. O benefício constante do § 2º do art. 78 do ADCT, na redação da EC 30/2000, incide apenas sobre as prestações não liquidadas e não sobre o total do débito constante do precatório. Precedente: ADI 2.851. 2. Agravo improvido.(SS 2589 AgR, Relator(a):Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 09/08/2006, DJ 22-09-2006 PP-00028 EMENT VOL-02248-01 PP-00166 LEXSTF v. 28, n. 335, 2006, p. 308-310)
EMENTA: CONSTITUCIONAL. PRECATÓRIO. COMPENSAÇÃO DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO COM DÉBITO DO ESTADO DECORRENTE DE PRECATÓRIO. C.F., art. 100, art. 78, ADCT, introduzido pela EC 30, de 2002. I. – Constitucionalidade da Lei 1.142, de 2002, do Estado de Rondônia, que autoriza a compensação de crédito tributário com débito da Fazenda do Estado, decorrente de precatório judicial pendente de pagamento, no limite das parcelas vencidas a que se refere o art. 78, ADCT/CF, introduzido pela EC 30, de 2000. II. – ADI julgada improcedente.(ADI 2851, Relator(a):Min. CARLOS VELLOSO, Tribunal Pleno, julgado em 28/10/2004, DJ 03-12-2004 PP-00012 EMENT VOL-02175-01 PP-00187 RIP v. 6, n. 29, 2005, p. 243-248 RDA n. 239, 2005, p. 463-467 RF v. 101, n. 378, 2005, p. 255-259 RTJ VOL-00193-01 PP-00106).
Cessão de Crédito
A Constituição Federal permite a cessão de créditos decorrentes dos precatórios independentemente da concordância do devedor, bem como autoriza também a cessão total ou parcial do crédito a terceiros, esta última por meio da decomposição de parcelas.
A legislação tributária infra-constitucional não trata especificamente da cessão de crédito, contudo a Resolução/CNJ 115/2010 reitera os termos da Constituição Federal afirmando que “o credor de precatório poderá ceder, total ou parcialmente, seus créditos a terceiros, independentemente da concordância do devedor”.
Contudo, deve se atentar que o fisco somente considera válida a cessão, depois de proferida decisão transitada em julgado em relação ao valor devido pela Fazenda. A Receita Federal tem desconsiderado as cessões de precatórios, quando não há certeza em relação ao quantum devido (Acórdão nº 03-32573 de 14 de Agosto de 2009 – Segunda Turma, DRJ/BSB)
No caso a cessão dever ser feita preferencialmente por instrumento público, nos termos do artigo 288 do Código Civil, que estabelece ser “ineficaz, em relação a terceiros, a transmissão de um crédito, se não celebrar-se mediante instrumento público, ou instrumento particular revestido das solenidades do § 1o do art. 654”.
A cessão de precatórios somente produzirá efeitos após comunicação, por meio de petição protocolizada, ao juízo de origem e à entidade devedora, antes da apresentação da requisição ao Tribunal (art. 16, § 3º da Resolução/CNJ 115/2010).
DIFICULDADES E CUIDADOS QUE DEVEM SER OBSERVADOS
Da Aplicação Imediata do Artigo 78 § 2º do ADCT
Não obstante previsto na Constituição Federal, ainda não existe lei no âmbito federal regulando o poder liberatório para pagamento de tributos dos precatórios.
No nosso entendimento, o poder liberatório do precatório não necessita de regulamentação por lei infra-constitucional para ser aplicado imediatamente. A Constituição Federal não autorizou o legislador ordinário a limitar ou exigir outras condições para que se perfaça o poder liberatório do pagamento de tributos pela Fazenda Pública devedora. A norma constitucional em questão se insere naquelas que não necessitam de complementação para surtir efeito.
Por outro lado, há que se atentar que a Receita Federal não tem entendimento unânime quanto à possibilidade de utilização imediata do precatório para pagamento de tributos. Algumas soluções de consultas e decisões administrativas consignam que apesar da Constituição Federal prever tal possibilidade, a matéria precisa ser regulamentada por norma infra-constitucional.
Abaixo seguem duas soluções de consulta. A primeira contrária e a segunda favorável ao detentor do precatório:
“Solução de Consulta nº 57 de 01 de Outubro de 2008- DISIT 04
EMENTA: COMPENSAÇÃO. TÍTULOS PÚBLICOS. TÍTULOS REPRESENTATIVOS DA DÍVIDA PÚBLICA FEDERAL. OBRIGAÇÕES DA ELETROBRÁS. PRECATÓRIOS. PRESTAÇÕES ANUAIS. TRIBUTOS E CONTRIBUIÇÕES FEDERAIS
As prestações anuais dos precatórios pendentes na data da promulgação da Emenda Constitucional nº 30, de 2000, ou decorrentes de ações iniciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999, caso não sejam liquidadas até o final do exercício a que se referem, poderão, em princípio, ser utilizadas na compensação de tributos da entidade política devedora, permitida a cessão dos créditos. No entanto, o direito à utilização das citadas prestações anuais dos precatórios da União, na compensação de tributos e contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, somente poderá ser exercido após a regulamentação do art. 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias pelo Congresso Nacional e/ou pelo Poder Executivo Federal”.
“Solução de Consulta nº 230 de 25 de Setembro de 2001- DISIT 08
ASSUNTO: Normas Gerais de Direito Tributário
EMENTA: As prestações anuais dos precatórios pendentes na data de promulgação da Emenda Constitucional nº 30, de 2000, e os que decorram de ações iniciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999, se não liquidadas até o final do exercício a que se referem, terão poder liberatório do pagamento de tributos da entidade devedora, permitida a cessão dos créditos. A compensação deverá ser requerida conforme disposto nas normas expedidas pela Secretaria da Receita Federal”.
Compensação de Precatórios com Débitos Constituídos Contra o Credor Original
A Constituição Federal permitiu que no momento da expedição dos precatórios o Poder Público abatesse unilateralmente o valor dos débitos líquidos e certos, inscritos ou não em Dívida Ativa constituídos contra o credor original pela Fazenda Pública devedora, inclusive parcelas vincendas de parcelamentos (art. 100, § 9º, da CF/88).
Somente não podem ser objeto de abatimento os débitos tributários cuja execução esteja suspensa em virtude de contestação administrativa ou judicial.
A regra foi criada para resguardar os créditos fazendários. Trata-se de direito do Fisco e o particular sequer participa do trâmite prévio à expedição do precatório, que ocorre apenas entre o Executivo e o Judiciário. Vale dizer, a Fazenda informa ao Tribunal sobre a existência de débitos, dentro do prazo decadencial de 30 dias, para que se efetive a compensação.
De se salientar que mesmo que tenha ocorrido cessão de créditos, será realizada eventual compensação de dívidas tributárias do credor originário.
Na prática ocorre o seguinte:
a) O juiz profere decisão garantindo ao titular original do crédito o pagamento através de um precatório, mas antes encaminhamento do precatório ao Tribunal, intimará a Fazenda Pública (ou outro ente devedor) para que informe, em 30 dias, sobre a existência de débitos constituídos contra o credor original pela Fazenda Pública devedora, incluídas parcelas vincendas de parcelamentos (art. 6º da Resolução/CNJ 115/2010);
b) Na hipótese da Fazenda não se manifestar ou deixar de apontar débitos do credor original, perderá o direito de abatimento (art. 6º da Resolução/CNJ 115/2010);
c) Se a Fazenda apontar algum débito do credor original de natureza tributária constituído em seu favor o juiz decidirá a questão, após ouvir a parte contrária, decidindo em seguida (art. 6º da Resolução/CNJ 115/2010);
d) Caso a decisão entenda que a Fazenda realmente tem um crédito tributário contra o vencedor da ação, ou seja, caso se apure que o particular e a Fazenda são ao mesmo tempo credor e devedor um do outro, as duas obrigações serão extintas, até onde se compensarem e o juiz emitirá certificado de compensação para fins de controle orçamentário e financeiro, juntando-os ao processo de expedição do precatório (art. 6º da Resolução/CNJ 115/2010);
e) A compensação se operará no momento da efetiva expedição do certificado de compensação, quando cessará a incidência de correção monetária e juros moratórios sobre os débitos compensados (art. 6º da Resolução/CNJ 115/2010 com a redação da Resolução/CNJ n° 123/2010);
f) O procedimento de compensação, quando realizado no âmbito do Tribunal, não impedirá a inscrição do precatório apresentado até 1º de julho de um ano no orçamento do ano seguinte da entidade devedora, deduzindo-se o valor compensado, caso reconhecida posteriormente a compensação (art. 6º da Resolução/CNJ 115/2010 com a redação da Resolução/CNJ n° 123/2010);
g) A cessão de créditos não alterará a natureza comum ou alimentar do precatório e não prejudicará a compensação, sendo considerado, para esse fim, o credor originário (art. 6º da Resolução/CNJ 115/2010).
Isto faz com que os riscos da compra de precatórios sejam grandes, pois o cessionário pode vir a sofrer uma compensação forçada em decorrência de débito do cedente. E mesmo que o crédito do precatório tenha sido cedido a terceiro pelo credor, a Fazenda pode impugnar a cessão que o credor fez, opondo ao cessionário a compensação do crédito.
Em razão da possibilidade de compensação deve-se atentar quando da compra dos precatórios se o cedente tem dívidas junto ao fisco, pois se for o caso, provavelmente será realizada a compensação entre créditos e débitos, não podendo ser obstada a pedido do particular/credor. O dispositivo constitucional é claro no sentido de garantir a compensação contra o credor original (cedente).
Cabe ressaltar que a autorização para compensação trazida pela EC 62 pode causar inúmeros transtornos, pois na prática, existem muitos lançamentos realizados pela Fazenda com o desconhecimento do devedor.
Precatórios Oriundos de Outras Entidades
Há que se atentar também se o precatório objeto da cessão é originário de ações em que a Fazenda Nacional é parte, ou se outro ente federal é que compõem um dos pólos da ação (ex: autarquia federal). E isto porque a possibilidade de compensação de débito tributário com crédito decorrente de precatório de pessoa jurídica que não seja a Fazenda Nacional é matéria controvertida.
De fato, o Superior Tribunal de Justiça pela sua Primeira Turma firmouentendimento no sentido de que “é ilegítima a pretensão de se compensar débito tributário (devido à administração direta) com crédito de precatório adquirido de terceiros (por cessão) e da responsabilidade de entidade da administração indireta” (RMS 27.706/MG), conforme ementa que abaixo se transcreve a título exemplificativo:
“TRIBUTÁRIO. COMPENSAÇÃO. PRECATÓRIO. DÉBITO DE ICMS. CRÉDITOS DECORRENTES DE AUTARQUIA. DER. AUSÊNCIA DE NORMA ESTADUAL. DÉBITOS TRIBUTÁRIOS DO ESTADO. PRECATÓRIO DE NATUREZA ALIMENTAR. INADMISSIBILIDADE. ART. 78, § 2º, DO ADCT. DECRETO ESTADUAL Nº 418/07. PRECEDENTES. IMPOSSIBILIDADE.
1. A compensação de débito fiscal estadual (ICMS) com crédito de precatório de natureza distinta e entre pessoas jurídicas diversas não é possível quando não previsto em legislação especial. Precedentes: RMS 26802/DF, Rel. p/ Acórdão Ministro Castro Meira, DJe 18/02/2010; RMS 31184/PR, Rel. MinistroCastro Meira, DJe 29/04/2010; RMS 30.229/PR, Rel. MinistroHumberto Martins, DJe 18/02/2010; EDRMS 29.806/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 28.10.09; AgRMS 30.347/PR, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 26.11.09; RMS 24.450/MG, Rel. Ministro José Delgado, Primeira Turma, julgado em 8/4/2008, DJe 24/4/2008. (AgRg no RMS 31.592/PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/08/2010, DJe 27/08/2010).
No mesmo sentido: AgRg no RMS 31672, AgRg no RMS 31885 PR, AgRg no RMS 31962, AgRg no RMS 31123, AgRg no RMS 31137 PR, AgRg no RMS 31172 PR, AgRg no RMS 31443 PR, AgRg no RMS 31545 PR, RMS 31109 PR.
O Supremo Tribunal Federal ainda não tem jurisprudência consolidada quanto à possibilidade, ou não, de utilização de precatório para pagamento de tributos cedido por terceiro e oriundo de outro ente, que não as Fazendas Públicas.
Contudo, já existe precedente do Supremo Tribunal Federal no sentido de que a circunstância de o devedor do precatório ser diferente do credor dos tributos que se pretende compensar, não é relevante para impedir a utilização de precatório para quitação de tributos, desde que ambos integrem a mesma esfera política. Assim, se o devedor do precatório for, por exemplo, uma autarquia federal, pode o precatório ser utilizado para quitar tributos federais.
Eis o precedente mencionado:
“DECISÃO:
1. Discute-se no presente recurso extraordinário o reconhecimento do direito à utilização de precatório, cedido por terceiro e oriundo de autarquia previdenciária do Estado-membro, para pagamento de tributos estaduais à Fazenda Pública.
2. O acordão recorrido entendeu não ser possível a compensação por não se confundirem o credor do débito fiscal — Estado do Rio Grande do Sul — e o devedor do crédito oponível — a autarquia previdenciária.
3. O fato de o devedor ser diverso do credor não é relevante, vez que ambos integram a Fazenda Pública do mesmo ente federado [Lei n. 6.830/80]. Além disso, a Constituição do Brasil não impôs limitações aos institutos da cessão e da compensação e o poder liberatório de precatórios para pagamento de tributo resulta da própria lei VOLTAR
É do conhecimento de poucos, o fato de ter em sua conta mensal tanto de telefonia como também energia elétrica a soma tributária referente ao pagamento de tributos que não deveriam constar.
Tais tributos correspondem ao conhecido Programa de Integração Pessoal – PIS que teve sua criação através da Lei Complementar 07 de 1970 e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS que teve sua criação através da Lei Complementar 70 de 30/12/1991.
“LEI COMPLEMENTAR Nº 7, DE 7 DE SETEMBRO DE 1970
D.O.U. de 08/09/1970
Institui o Programa de Integração Social, e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA: Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei Complementar:
Art. 1.º - É instituído, na forma prevista nesta Lei, o Programa de Integração Social, destinado a promover a integração do empregado na vida e no desenvolvimento das empresas.
§ 1º - Para os fins desta Lei, entende-se por empresa a pessoa jurídica, nos termos da legislação do Imposto de Renda, e por empregado todo aquele assim definido pela legislação trabalhista.
§ 2º - A participação dos trabalhadores avulsos, assim definidos os que prestam serviços a diversas empresas, sem relação empregatícia, no Programa de Integração Social, far-se-á nos termos do Regulamento a ser baixado, de acordo com o art. 11 desta Lei.(...)”
“LC - LEI COMPLEMENTAR Nº 70 DE 30.12.1991
DOU 31.12.1991
Institui contribuição para financiamento da Seguridade Social, eleva a alíquota da contribuição social sobre o lucro das instituições financeiras e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte lei complementar:
Art. 1° Sem prejuízo da cobrança das contribuições para o Programa de Integração Social (PIS) e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep), fica instituída contribuição social para financiamento da Seguridade Social, nos termos do inciso I do art. 195 da Constituição Federal, devida pelas pessoas jurídicas inclusive as a elas equiparadas pela legislação do imposto de renda, destinadas exclusivamente às despesas com atividades-fins das áreas de saúde, previdência e assistência social(...).”
O parágrafo 2ª da Lei Complementar 07/1970 traz a seguinte redação:
“Art. 2º - O Programa de que trata o artigo anterior será executado mediante Fundo de Participação, constituído por depósitos efetuados pelas empresas na Caixa Econômica Federal.”
Ocorre que algumas empresas e concessionárias vem repassando ao consumidor o encargo referente as contribuições acima referidas, o que contraria o entendimentos do muitos magistrados do pais.
Em julgamento, o Supremo Tribunal de Justiça confirmou decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul o qual reconheceu ser ilegal o repasse de PIS e COFINS ao consumidores tanto de telefonia fixa e móvel como também ao consumidor de energia elétrica, pois segundo a justiça, as tarifas homologadas pelas agências regulamentadoras (Anatel ou Aneel) são "líquidas" de forma que as empresas não poderiam transferir para suas contas outros custos como os tributos "incidentes na operação" como o PIS e COFINS, pois estes ao contrário do ICMS por exemplo, tem por sujeito passivo as empresas e não o consumidor.
Para atualizar e facilitar na compreensão, demonstra-se o entendimento da matéria no Tribunal do Estado do Rio grande do Sul, a seguir:
TJRS - APELAÇÃO CÍVEL. SERVIÇO PÚBLICO. TELEFONIA. TARIFA. NATUREZA PARATRIBUTÁRIA. INCIDÊNCIAS DIRETAS DO PIS E DA COFINS SOBRE O PREÇO DOS SERVIÇOS. PEDIDOS DE EXCLUSÃO E DE RESTITUIÇÃO EM DOBRO.
1. Incidências diretas do PIS e da COFINS sobre o preço dos serviços de telefonia. A telefonia é serviço público. Portanto, a concessionária está sujeita ao princípio da legalidade (CF, art. 37, caput); logo, não havendo previsão legal autorizadora da incidência direta, ou repasse jurídico, das alíquotas doPrograma de Integração Social – PIS, e da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social – COFINS, sobre o preço dos serviços de telefonia, a concessionária não pode fazê-lo. Ademais, se a legislação pertinente estabelece como contribuinte a pessoa jurídica prestadora dos serviços, como fato gerador o faturamento ou receita bruta e como base de cálculo o valor do faturamento ou receita bruta, observadas as exclusões previstas na lei (Lei 10.637/02, art. 1º; Lei 10.833/03), tal proceder subverte o sistema, pois: (a) contribuinte passa a ser o consumidor, e não o fornecedor; (b) fato geradorpassa a ser a prestação do serviço, e não o faturamento ou receita bruta da concessionária; e (c) base de cálculo passa a ser o valor do serviço, e não o valor do faturamento ou receita bruta da concessionária.
2. Restituição. 2.1 – Afirmado ser indevido o repasse jurídico ou incidência direta, resulta que deve ser restituído tudo quanto foi do consumidor cobrado (CC/1916, art. 964; CC/2002, art. 876). 2.2 - Todavia, descabe a devolução em dobro, com base no art. 42 do CDC, dispositivo inspirado na legislação civil comum (CC/1916, no art. 1.531; CC/2002, art. 940), sendo aplicável, dessarte, a Súm. 159 do STF, pela qual não é devida a restituição em dobro quando a demanda por dívida já paga não ocorre por má-fé. Embora a hipótese envolva relação de consumo, de natureza especial (serviço público), não é devida a restituição em dobro, visto caracterizada a excludente do engano justificável prevista no final do art. 42 do CDC, podendo assim ser qualificado o proceder da concessionária, seja pelo fato de, em tese, haver chancela da ANATEL, seja pelo fato de, igualmente em tese, não ser indevida a cobrança, apenas que não como incidência direta ou repasse jurídico, e sim indireta ou repasse econômico.
3. Correção monetária.Incide atualização monetária pelo IGP-M desde cada cobrança indevida, visto que apenas repõe o capital.
4. Juros moratórios. Incidem juros moratórios de 1% ao mês (CC/02, art. 406), a partir da citação. Não se aplica a Súm. 54 do STJ, pois não diz com ato ilícito baseado em responsabilidade aquiliana, e tampouco se pode falar em juros a partir do trânsito em julgado (CTN, art. 167, parágrafo único), pois não diz com tributo típico.
5. Sucumbência. Tendo a parte autora, requerido, como primeira opção, em pedidos sucessivos, restituição em dobro, e levando a apenas simples, sucumbe em 50%, tanto em custas quanto em honorários advocatícios, os quais, anulando-se reciprocamente pela compensação (STJ, Súm. 306), dispensam fixação.
6. Apelação provida em parte.
Na mesma linha, vem decidindo o STJ:
STJ - PROCESSUAL CIVIL, ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO - VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CARACTERIZADA - PIS/COFINS - REPASSE AO CONSUMIDOR NA FATURA TELEFÔNICA - ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA ANATEL - TESE ACERCA DA INEXISTÊNCIA DE ERRO NO PAGAMENTO: AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO - ABUSIVIDADE DA COBRANÇA RECONHECIDA POR ESTA CORTE - DEVOLUÇÃO EM DOBRO - POSSIBILIDADE.
1. Não ocorre ofensa ao art. 535, II, do CPC, se o Tribunal de origem decide, fundamentadamente, as questões essenciais ao julgamento da lide.
2. Prevalece no STJ o entendimento de que a ANATEL não tem legitimidade passiva para responder pela cobrança indevida de valores levada a efeito pelas empresas de
telefonia na conta telefônica.
3. É inadmissível o recurso especial quanto a questão não decidida pelo Tribunal de origem, dada a ausência de prequestionamento.
4. A Segunda Turma desta Corte firmou entendimento no sentido da ilegalidade do repasse do PIS e da COFINS na fatura telefônica, bem como acerca da má-fé das empresas de telefonia e, por consequência, da abusividade dessa conduta.
5. Direito à devolução em dobro reconhecido com base no art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor.
6. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, não provido.
O que vem sendo o divisor de águas, é a interpretação da legislação (Lei 8.987/95), que diz que a tarifa poderá ser revista, autorizando a ANEEL realizar sua revisão, porém impede a mudança de sujeito passivo referente a contribuição, o que vinha acontecendo.
Aplaudindo o entendimento e exposição da matéria posta no julgamento de apelação cível na Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, demonstra-se na íntegra esta decisão que mais uma vez auxilia e orienta perfeitamente o entendimento da matéria:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. PIS E COFINS SOBRE SERVIÇOS DE TELEFONIA. COBRANÇA INDEVIDA MEDIANTE REPASSE JURÍDICO DOS TRIBUTOS. RESTITUIÇÃO DEVIDA.
Existem tributos que incidem sobre o patrimônio, o lucro, o faturamento, etc., em relação aos quais somente é possível o repasse econômico como componente proporcional dos custos que formam o preço de venda de bens ou da prestação de serviços. Desses tributos são exemplos, entre outros, o IPTU, o IPVA, o ITR, o IRPJ, a CSLL, o PIS e a COFINS. Tais tributos não podem ser calculados e acrescidos ao preço final, pois somente são computados, na proporção de sua participação, na formação dos custos que compõem o preço final de bens e serviços. É o chamado repasse econômico. E existem outros tributos cujo fato gerador é as operações de venda de bens ou prestações de serviço, e a base de cálculo é o valor das operações ou das prestações. São exemplos desses tributos o ICMS e o IPI, os quais, em face de expressas determinações constitucionais e legais, e porque incidem diretamente sobre cada operação ou prestação, individualizadamente, conta a conta, usuário a usuário, podem ser repassados ao consumidor como acréscimo ao preço ou tarifa final. Este é o chamado repasse jurídico, em oposição ao repasse econômico.
O ICMS adota o repasse jurídico por expressa determinação constitucional e legal e porque incide diretamente sobre cada operação de venda de bens ou prestação de serviço e em razão disso pode ser acrescido ao preço final cobrado do consumidor. Além disso, também por determinação constitucional e legal expressa, o ICMS é calculado ‘por dentro’, o que significa que dito imposto está incluído em sua própria base de cálculo, de modo que a alíquota legal incide sobre uma base de cálculo na qual já está contido o valor do próprio imposto, fazendo com que haja incidência de imposto sobre imposto. Em relação ao ICMS essa sistemática, tanto de acrescer ao preço final, como de calcular ‘por dentro’ está expressamente determinada pela Constituição Federal (art. 155, § 2º, XII, ‘i’) e pela Lei (LC nº. 87/96, art. 13, § 1º, I) e encontra respaldo em jurisprudência pacificada do STF e do STJ.
O PIS e a COFINS, diversamente do ICMS, incidem sobre o faturamento como sinônimo de receita bruta, em que estão incluídas não só a receita do objeto social da demandada, ‘prestação de serviço telefônico’, mas também outras receitas como as de aplicações financeiras e outras receitas extraoperacionais, por isso que tais contribuições não podem ser acrescidas diretamente ao preço ou tarifa final, mediante repasse jurídico, mas apenas podem ser computadas proporcionalmente como custos para formar a tarifa final (repasse econômico), razão pela qual não podem ser cobradas do consumidor mediante acréscimo direto (repasse jurídico) à tarifa final e muito menos podem ser cobradas ‘por dentro’ como ocorre com o ICMS. Além disso, não há autorização constitucional e legal para que o PIS e a COFINS incidam sobre a prestação do serviço, nem para que sejam acrescidos diretamente à tarifa cobrada do consumidor e nem para que sejam calculados ‘por dentro’.O PIS e a COFINS são tributos de fato gerador diferente, de natureza diversa, que não se confundem com o ICMS e não podem adotar a mesma técnica de cobrança deste, mediante repasse jurídico, e muito menos podem ser calculados ‘por dentro’, tudo por falta de autorização constitucional e legal e, como dito, porque são de natureza diversa daqueles tributos semelhantes ao ICMS.
Reconhecida a ilegalidade, a ilicitude e a excessividade da cobrança, o direito de restituição é conseqüência lógica e jurídica decorrente, devendo a importância a ser restituída ser apurada em liquidação de sentença.
recurso adesivo desprovido, à unanimidade, e APELO PROVIDO EM PARTE, POR MAIORIA, VENCIDO EM PARTE O EMINENTE DES. ROQUE.
Apelação Cível
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Segunda Câmara Cível |
Nº 70021708177
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Comarca de Porto Alegre |
LUIZ ALBERTO MOREIRA BELMONTE
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APELANTE/RECORRIDO ADESIVO |
VERA LUCIA TIERLING
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APELANTE/RECORRIDO ADESIVO |
BRASIL TELECOM S/A
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RECORRENTE ADESIVO/APELADO |
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em desprover o recurso adesivo e, por maioria, vencido o Relator, prover em parte o recurso dos autores.
Custas na forma da lei.
Participou do julgamento, além dos signatários, o eminente Senhor Des. Arno Werlang (Presidente).
Porto Alegre, 21 de maio de 2008.
DES. ROQUE JOAQUIM VOLKWEISS,
Relator.
DES. ADÃO SÉRGIO DO NASCIMENTO CASSIANO,
Revisor e Redator.
RELATÓRIO
Des. Roque Joaquim Volkweiss (RELATOR)
Trata-se de apelação cível e de recurso adesivo, aquela interposta por LUIZ ALBERTO MOREIRA BELMONTE e por VERA LÚCIA TIERLING, à sentença de fls. 611/616, datada de 11/04/2007, que julgou improcedente o pedido por eles deduzido na ação de repetição de débito (de PIS e COFINS incluídos no preço cobrado em suas contas telefônicas), com pedido de tutela antecipada, ajuizada contra a empresa BRASIL TELECOM SA, e, via de conseqüência, os condenou ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados estes em R$ 800,00, inexigíveis, contudo, à vista de concessão de AJG.
À ação, ajuizada em 02/03/2005, foi atribuído o valor de R$ 810,00.
Em suas razões recursais reiteram os apelantes ser impossível o repasse a eles, pela empresa apelada, dos valores correspondentes ao PIS e à COFINS, por tratar-se de encargos pessoais e diretos, que devem, por sua própria natureza, ser suportados pela própria apelada. Reiteram, assim, seu pedido de imediata cessação de tais cobranças e da devolução, em dobro, das parcelas indevidamente repassadas desde o início dos contratos, monetariamente atualizadas e acrescidas dos juros moratórios cabíveis. Pede, assim, o provimento do apelo, bem como a majoração da verba honorária em caso de provimento do apelo.
Em contra-razões recursais sustenta a apelada a necessidade de manutenção da sentença, que entendeu inexistir qualquer disposição legal que impeça o repasse da carga tributária relativa ao PIS e à COFINS na fatura das contas telefônicas. Pede, assim, o improvimento do apelo.
Em recurso adesivo pede a apelada a decretação de nulidade da sentença recorrida, ¨a fim de que a Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) seja citada para integrar o pólo passivo da presente ação¨.
Em contra-razões ao recurso adesivo alega os recorridos que já se encontra consolidada pela jurisprudência do STJ a desnecessidade de figurar a ANATEL em demandas como a presente (v.g.: REsp 431606/SP e REsp 573475/RS), além de lembrar o acórdão da lavra nesse sentido, do eminente Des. ADÃO SÉRGIO DO NASCIMENTO CASSIANO (AC nº 70014576516, acostado à fls. 545/609). Pede, assim, o improvimento do recurso adesivo.
Sem manifestação do Ministério Público de primeiro e segundo graus, vieram-me os autos.
É o relatório, que submeto à douta revisão.
VOTOS
Des. Roque Joaquim Volkweiss (RELATOR)
Por questões lógicas analiso em primeiro lugar o recurso adesivo da ré TELECOM, porquanto prejudicial ao conhecimento do apelo dos autores.
Tenho, a propósito, que: a) o recurso deveria ser interposto de forma autônoma, e não na forma de adesivo, porquanto essencial e não decorrente de recurso de terceiro; b) a ANATEL nada tem a ver com a pretendida restituiição do alegado indébito; e c) os precedentes deste Tribunal e do Egrégio STJ (REsp 431606/SP, REsp 573475/RS e outros) são unânimes quanto à desnecessidade de chamar-se a ANATEL ao processo. Por essas razões improvejo o recurso adesivo.
No mérito, trata-se de dar adequada solução à seguinte hipótese: pode a concessionária de serviços de telefonia repassar ao usuário dos seus serviços, nas contas de telefonia, os encargos que possui junto à Fazenda Federal, relativos a PIS e COFINS?
Primeiramente, é preciso ter presente que as parcelas que integram o preço (tarifa) a ser cobrado, por unidade de medida, dos serviços de comunicações (caso presente) e de energia elétrica (aqui referidos ¨en passant¨) são previamente estabelecidos e aprovados por Resolução da ANATEL e ANEEL respectivamente, não sendo essa, portanto, a matéria que, via presente julgamento, nos cabe solucionar via presente julgamento.
O que está sob julgamento é se os ônus do PIS e da COFINS, a cargo das concessionárias (elas é que são as ¨contribuintes¨ deles), podem ser acrescidos e repassados pela TELECOM aos consumidores dos seus serviços, mediante acréscimo nas contas mensais respectivas. É apenas disso que ora se trata, e não da formação originária do custo por unidade de medida.
Tenho que esse repasse é absolutamente impossível, porquanto o PIS e a COFINS (como também o é o IMPOSTO DE RENDA), – legítimas ¨contribuições parafiscais¨ ou ¨paratributos¨ –, se enquadram como ¨impostos diretos¨, devendo portanto ser suportados (sem repasse, repercussão ou transação) pelo respectivo ¨contribuintes de direito¨ (que é a concessionária).
RUBENS GOMES DE SOUSA, autor do anteprojeto do Código Tributário Nacional, é quem, em sua imortal obra ¨Compêndio de Legislação Tributária¨ (Resenha Tributária, SP, 1975, edição póstuma, p. 170), bem define a matéria sob o prisma jurídico e lhe traça os contornos e efeitos, quando faz a necessária distinção entre ¨impostos diretos¨ e ¨indiretos¨, também aplicável aos ¨paratributos¨ (que admitem ¨paraimpostos¨, também ¨diretos¨ e ¨indiretos¨):
“Impostos ¨diretos¨ são os suportados em definitivo pelo contribuinte obrigado por lei ao seu pagamento; ¨indiretos¨ os que podem ser transferidos por aquele contribuinte para outra pessoa que, por sua vez, os transferirá ou suportará em definitivo; por isso se diz que no imposto indireto há dois contribuintes, o de direito (a pessoa obrigada por lei ao pagamento) e o de fato (a pessoa que arcará em definitivo com o ônus do imposto). Essa transferência do ônus fiscal de uma pessoa para outra chama-se ¨repercussão¨ ou ¨translação¨ do imposto. ... Entretanto, a repercussão, fazendo-se através do acréscimo do imposto ao preço das mercadorias ou serviços tributados, está sujeita à lei da oferta e da procura, isto é, só será possível quando as condições do mercado a permitirem: é portanto um conceito econômico e não jurídico. Por isso preferimos distinguir os impostos em diretos e indiretos segundo um critério jurídico, que é o da natureza do seu fato gerador. Por este critério, são ¨diretos¨ os impostos cujo fato gerador seja uma ¨situação permanente¨ (p. ex., a propriedade) ou pelo menos ¨durável¨ ou ¨continuada¨ no tempo (p. ex., a renda); ao contrário, são ¨indiretos¨ os impostos cujo fato gerador seja uma ¨situação instantânea¨ ou que possa ser ¨isolada¨ no tempo (p. ex., uma compra e venda, um consumo)”.
Ora, o PIS e a COFINS, verdadeiros paratributos ou contribuições parafiscais, têm como fato gerador (incidem) o ¨faturamento bruto¨ num período determinado, configurando, portanto, legítima situação ¨permanente¨, ¨durável¨ ou ¨continuada¨ no tempo, daí porque se trata de ¨imposto¨ (no caso, ¨paraimposto¨) ¨direto¨, intransferível, portanto.
Daí porque, por não ter sido autorizada (pela ANATEL) a inclusão do PIS e da COFINS na composição dos custos das tarifas das concessionárias (e nem poderia ser), e por não poderem tais parcelas ser legalmente transferíveis mediante acréscimo ao preço cobrado, por serem ¨impostos indiretos¨ (na verdade, ¨paraimpostos indiretos¨), não há como concordar com a pretensão da TELECOM, no caso.
E mais: ao permitir-se o repasse do PIS e da COFINS aos usuários dos serviços telefônicos, não tardará que também lhes sejam repassados o ¨imposto de renda¨ (também ¨imposto direto¨, a cargo exclusivo da concessionária), sobre seu lucro líquido, e a ¨Contribuição Social sobre o Lucro¨ (¨paraimposto direto¨, também a cargo exclusivo da concessionária), esta prevista na alínea ¨c¨ do inc. III do art. 195 do Constituição Federal.
Por derradeiro, não há como deixar de referir, aqui, o seguinte excerto, brilhante como todo o seu voto, do eminente Des. ADÃO SÉRGIO DO NASCIMENTO CASSIANO, integrante desta Câmara, na AC nº 70014576516, cujo acórdão se encontra juntado às fls. 545/608, com destaque na fl. 546:
“O PIS e a COFINS, diversamente do ICMS, incidem sobre o faturamento como sinônimo de receita bruta, em que estão incluídas não só a receita do objeto social da demandada, ¨prestação de serviço telefônico¨, mas também outras receitas..., por isso que tais contribuições não podem ser acrscidas diretamente ao preço ou tarifa final, mediante repasse jurídico, mas apenas podem ser computadas proporcionalmente como custos para formar a tarifa final (repasse econômico), razão pela qual não podem ser cobradas do consumidor mediante acréscimo direto (repasse jurídico) à tarifa final e muito menos podem ser cobradas ¨por dentro¨ como ocorre com o ICMS. Além disso não há autorização constitucional e legal para que o PIS e a COFINS incidam sobre a prestação do serviço, nem para que sejam acrescidos diretamente à tarifa cobrada do consumidor e nem para que sejam calculados ¨por dentro¨”.
Em suma: sendo o PIS e a COFINS legalmente definidos como encargos de natureza pessoal e direta de quem presta o serviço que lhes dá origem, não podem eles ser repassados aos destinatários dos serviços.
Nessas condições, com razão os apelantes, mas não quanto à devolução em dobro das parcelas indevidamente repassadas, devendo elas ser restituídas na forma simples em face da ausência de dolo de parte da empresa ré.
Diante do exposto, desprovejo o recurso adesivo da empresa ré, e provejo em parte o apelo dos autores para determinar que o PIS e a COFINS não lhes podem ser repassados via conta telefônica, devendo ser-lhes restituídos todos os valores assim indevidamente repassados, a serem apurados em liquidação de sentença, devendo a ré arcar com 80% das custas processuais e honorários advocatícios ao patrono do autor, que vão refixados, atendendo pedido deduzido no apelo e dado o trabalho desenvolvido e o pequeno valor da causa, em R$ 1.500,00, sendo que os autores responderão por 20% das custas processuais e honorários advocatícios ao patrono da ré, fixados em R$ 300,00, mas com exigibilidade suspensa em virtude de AJG, já concedida.
É o voto.
Des. Adão Sérgio do Nascimento Cassiano (REVISOR E REDATOR)
Acompanho em parte o eminente Relator invocando aqui os fundamentos do voto que proferi na Apelação Cível nº 70014576516, j. em 04/10/2006, DJE de 21/10/2006, cujo acórdão se encontra entranhado nos autos.
Em linhas gerais, meu entendimento coincide com o do eminente Relator, e a divergência é apenas quanto à possibilidade de repassar economicamente o custo tributário do PIS e da COFINS, como são repassados todos os demais custos que compõem o preço final do serviço, inclusive tributários, como são os casos do IPTU, do IPVA, etc.
Assim, a importância a ser restituída deve ser apurada em liquidação de sentença com verificação de que tais tributos (PIS e COFINS), mediante repasse econômico, não compuseram ou não estão contidos nos custos que formaram o preço que foi cobrado do consumidor ao longo do tempo, podendo, em tais circunstâncias, ser abatidos no cálculo os valores que a demandada teria direito de computar, proporcionalmente, a título de repasse econômico, na exata medida da participação individual proporcional do PIS e da COFINS em relação ao total geral dos custos que compõem a formação do preço final da tarifa da demandada, antes do cálculo do ICMS.
Com essas considerações, estou desprovendo o recurso adesivo da ré e provendo parcialmente o recurso do autor, em menor extensão do que o eminente Relator, mantidas as verbas sucumbenciais fixadas por Sua Excelência.
É como voto.
Des. Arno Werlang (PRESIDENTE)
Vênia para subscrever o voto do eminente Des. Cassiano, pois o acompanhou naquele julgamento a que se refere. O que não é possível é o repasse jurídico do PIS e do COFINS, ou seja, o acréscimo ao custo final da tarifa. Nada impede, porém, sejam estes tributos considerados para apuração do custo da tarifa, assim como todos os demais tributos.
DES. ARNO WERLANG - Presidente - Apelação Cível nº 70021708177, Comarca de Porto Alegre: "RECURSO ADESIVO DESPROVIDO, À UNANIMIDADE, E APELO PROVIDO EM PARTE, POR MAIORIA, VENCIDO EM PARTE O EMINENTE DESEMBARGADOR ROQUE."
Julgador(a) de 1º Grau: MUNIRA HANNA
Dessa forma, tanto pessoas físicas como jurídicas podem buscar no Judiciário a restituição em dobro dos valores cobrados em razão do repasse indevido de PIS e COFINS nas faturas de telefonia e energia elétrica nos últimos 5 (cinco) anos.
(…)
Dou provimento ao recurso extraordinário, com fundamento no disposto no art. 557, § 1º-A, do CPC. Custas ex lege. Sem honorários”. (RE 550400, Relator(a): Min. EROS GRAU, julgado em 28/08/2007, publicado em DJ 18/09/2007 PP-00080 REPUBLICAÇÃO: DJe-108 DIVULG 21-09-2007 PUBLIC 24-09-2007 DJ 24/09/2007 PP-00119).
Precatórios de Natureza Alimentar
A Constituição Federal define precatório de natureza alimentar no seu artigo 100, § 1º nos seguintes termos: “os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado, e serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, exceto sobre aqueles referidos no § 2º deste artigo”
Os precatórios de natureza alimentar têm a vantagem de ter preferência de pagamento sobre os precatórios comuns. Contudo, estes precatórios têm a seguinte desvantagem, não existe ainda consenso nos Tribunais Superiores a respeito da possibilidade de se utilizá-los para compensação com débitos tributários (art. 16 da Resolução/CNJ 115/2010).
O Superior Tribunal de Justiça tem jurisprudência consolidada no sentido de afastar pretensão de empresas utilizarem precatórios com o intuito de compensar tributos.
Segundo o Superior Tribunal de Justiça, não obstante o § 2º do artigo 78 do ADCT determinar que os precatórios relacionados no caput terão poder liberatório do pagamento de tributos, o caput do mesmo artigo 78 exclui os créditos de natureza alimentar e de pequeno valor. Assim, a compensação tributária com precatórios de natureza alimentar é hipótese não prevista no art. 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias que não a permite.
Eis algumas ementas da jurisprudência mencionada:
“CONSTITUCIONAL – RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – ART. 78, § 2º, DO ADCT – PODER LIBERATÓRIO DO PAGAMENTO DE TRIBUTOS – CRÉDITO DE NATUREZA ALIMENTAR.
1. As parcelas do precatório submetido à moratória do art. 78 do ADCT, se não liquidadas até o final do prazo previsto, passam a ter poder liberatório do pagamento de tributos da entidade devedora, nos moldes do § 2º do mesmo dispositivo constitucional.
2. À luz do referido enunciado normativo, ressalvados os créditos de pequeno valor, os de natureza alimentícia, os previstos no art. 33 do ADCT e suas complementações e ainda os que já tiverem os recursos liberados, os precatórios que forem objeto de parcelamento e cujas parcelas não forem pagas até o final do prazo constitucional, terão eficácia liberatória do pagamento de tributos .
3. Hipótese em que os créditos contidos no precatório objeto de compensação originam-se de honorários de sucumbência em ação indenizatória, qualificando-se como créditos alimentares.
4. Recurso ordinário em mandado de segurança não provido”.
(RMS 31.160/PR, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 24/08/2010, DJe 08/09/2010)
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO NO MANDADO DE SEGURANÇA. COMPENSAÇÃO DE DÉBITOS TRIBUTÁRIOS COM CRÉDITO DE PRECATÓRIO VENCIDO, E NÃO PAGO. NATUREZA DAS AÇÕES DE ONDE ORIGINADOS OS PRECATÓRIOS. ART. 78, § 2º, DO ADCT. CRÉDITO DE NATUREZA ALIMENTAR. JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA DO STJ.(…)
2. A atual jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que não há falar em poder liberatório do pagamento de tributos, nos termos do art. 78, § 2º, do ADCT, quanto aos precatórios de natureza alimentar. Esse entendimento decorre da literalidade do art. 78, § 2º, do ADCT, cujo teor, explicitamente, ressalva os créditos de natureza alimentícia.
3. Agravo regimental não provido. (AgRg no RMS 29.544/PR, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/04/2010, DJe 27/04/2010)
Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal quando do julgamento da ADIN 1.662/SP, decidiu pela inaplicabilidade do artigo 78 do ADCT aos precatórios alimentares. Em vista disso, em tese os precatórios de natureza alimentar não teriam poder liberatório para pagamento de tributos, visto que este poder é conferido pelo artigo 78, § 2º do ADCT.
Contudo, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral dos temas relativos à aplicabilidade imediata do art. 78, § 2º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT e à possibilidade de se compensar precatórios de natureza alimentar com débitos tributários (RE 566349 RG). Assim, é possível que o Supremo venha a entender que os precatórios de natureza alimentar adquiridos de terceiros podem ser cedidos e utilizados com efeito liberatório para pagamento de tributos, mas ainda não há qualquer segurança quanto a isso.
Descontos com honorários de advogado, perito e retenções de tributos
Deve se atentar que, parte dos créditos decorrentes de uma ação judicial podem pertencer à outras pessoas, que não o vencedor da ação, tais como advogados, peritos, dentre outros.
Com efeito, além dos honorários de sucumbência que normalmente já estão especificados no processo, ainda pode haver um fator surpresa, pois antes da expedição do precatório, o advogado que participou da ação tem o direito de juntar aos autos o contrato de honorários firmado com o seu cliente e, nesta hipótese, o juiz irá determinar que lhe sejam pagos diretamente os valores a que faz jus, por dedução da quantia a ser recebida pelo seu cliente.Esta possibilidade afeta diretamente o montante a ser pago no precatório, pois pode alterar consideravelmente o valor do crédito constante do precatório.
Além disso, quando do pagamento do crédito decorrente do precatórios, são retidos valores a título de imposto de renda na fonte, bem como os valores a título de contribuição previdenciária.
Finalmente se esclarece que os precatórios serão expedidos individualizadamente, por credor, ainda que exista litisconsórcio.