O som do gelo caindo em um copo. \”Marcos, aumenta o som\”, pede Joesley Batista. O funcionário obedece. E Ivete Sangalo começa a cantar a música Farol: \”Claro que o azul vai adormecer o dia…\” A gravação entre o dono do Grupo J&F e seu executivo Ricardo Saud dura 4 horas e 31 minutos. A música embala planos de adultério dos dois, fofocas sobre autoridades e a preocupação sobre como cada um ia contar em casa quando a delação que planejavam ficasse pública.
\”Ah não, não faz isso comigo, não. Eu não perdi essa gravação. Eu \’tava\’ sem óculos\”, assim começa a gravação. É Saud quem fala e mexe no gravador. Joesley pergunta: \”Tá ligado?\” Saud temia ter se atrapalhado ao gravar o senador e presidente do PP, Ciro Nogueira (PI). Parece não perceber que deixara o gravador ligado. Joesley apanha o aparelho e o coloca no bolso.
Escutam as notícias da Operação Carne Fraca. Joesley resolve dar um conselho a Saud sobre como contar à família o que estavam prestes a fazer. \”A realidade é: Nós não \’vai\’ ser preso. Vamos fazer tudo, mas nós não vai ser preso\”. Joesley vai ao banheiro e o gravador continua. Abre a porta e fala: \”É f., ô Ricardo, só tem um louco dentro do planeta Terra para fazer o que faço. Sabe quem é, né? Eu\”.
Mais bebida, mais gelo. E a conversa se desloca para as mulheres. \”Sabe, eu sou louco por ela, é meu número.\” O papo avanço e a voz dos delatores vai mudando de tom. \”Nós \’vai\’ acabar virando amigo do Janot (procurador-geral Rodrigo Janot).\” Joesley solta a língua e faz mais uma revelação ao amigo: \”Eu ando invocado de comer uma velha por aí. Acho que vou comer umas duas velhinhas de 50. Casadinhas.\”
Mais tarde, a voz pastosa de Joesley revela um desafio que fez a um subordinado. Ou ele saía com uma mulher até o domingo próximo ou ele ia \”fazer o serviço\”. Sexo e corrupção se misturam e Joesley afirma: \”Eu já arrumei um \’viado\’ para dar para quem precisa.\”
Assumindo de vez o papel de conselheiro, Joesley sugere ao amigo uma tática para se aproximar do então procurador da República Marcelo Miller. \”Você quer conquistar o Marcelo? É só começar a chamar esse povo (políticos) de bandido. Ele vai ver que você está do lado dele.\”
O empresário conta então ao amigo como pretendia revelar suas \”traquinagens\” para a mulher, a apresentadora de TV Ticiane Villas-Boas. O dono da J&F parece ter uma estratégia pronta para tudo. Cada detalhe está pensado. \”Eu tô imaginando, rapaz, o dia que eu tiver de chamar a Tici.\”
Joesley ri. E descreve como seria o diálogo: \”No dia eu vou acordar dizendo: \’Eu quero me separar\’. Para passar o dia em crise. \’Eu não te mereço. Eu não sou o homem certo para você.\’ Aí, ela jura que me ama, (e pergunta) \’por que você está falando isso?\’ É que hoje à noite o William Bonner vai dar umas notícias.\”
Mais gelo no copo. Mais som de bebida. E Joesley expõe sua teoria sobre \”a verdade\”. \”A verdade dói, Ricardo, mas não ofende. Dói, o cara fica puto, mas no fundo sabe o que ele fez.\” Joesley explica que não tem raiva de Fábio Cleto, ex-vice-presidente da Caixa, que decidiu delatar o pagamento de propina para a liberação de recursos. \”Ele falou a verdade. Não tenho raiva dele.\” O empresário se lembra da Bíblia: \”É bíblico, a verdade te liberta. Ricardo, eu tô dormindo melhor do que antes\”.