A Caixa Econômica Federal aumentou a taxa de juros e reduziu a cota máxima do financiamento de imóveis residenciais, desde segunda-feira. Essa foi a segunda alta este ano nos contratos enquadrados no Sistema Financeiro da Habitação (SFH), com recursos da poupança (SBPE), para imóveis até R$ 750 mil. Quem desejava financiar a casa própria agora vai ter que pensar duas vezes e refazer os cálculos. Até porque o percentual que a instituição empresta caiu de 90% para 80% do valor do bem, no sistema de amortização constante (SAC), e para 50% pela tabela Price (usa regime de juros compostos para calcular o valor das parcelas). Isso significa que será preciso desembolsar mais dinheiro.
De acordo com a Caixa, o percentual está alinhado à Taxa Básica de Juros (Selic, em 12,75% ao ano), e passa a valer para os novos financiamentos. A taxa de balcão (a mais alta, para não-clientes) passou de 9,15% ao ano para 9,45%, além da Taxa Referencial (TR). Clientes com conta no banco terão a taxa elevada de 8,75% para 9,30%. Para os que recebem salário na Caixa, os juros cresceram de 8,25% para 9% ao ano. Servidores públicos com conta na instituição vão arcar com taxa de 9% anuais (antes era de 8,60%). E para os servidores com conta-salário, os juros crescerão de 8% para 8,80%. O SFH tem juros limitados a 12% ao ano.
Os juros dos financiamentos com recursos do FGTS e do Programa Minha Casa Minha Vida não foram alterados. Em nota, a Caixa informou que, “mesmo com este ajuste, continuará oferecendo as melhores taxas do mercado para imóveis enquadrados no SFH”. Vale lembrar que, em janeiro, a Caixa subiu as taxas do crédito imobiliário com recursos da poupança e próprios. O ato provocou efeito cascata, pois a Caixa, com cerca de 70% do mercado, dita a tendência para o restante do sistema.
No início do ano, a maioria das instituições financeiras seguiram o exemplo. O Bradesco, entre o fim de 2014 e março de 2015, elevou os juros de 9,2% para 9,6% ao ano. O Santander, em fevereiro, ajustou suas taxas de 8,6% para 9,1% anuais. E o Itaú Unibanco, no mesmo mês, aumentou os juros de 9,2% e 9,6% ao ano, para os imóveis do SFH.
A decisão da Caixa causou controvérsias. Para Luciano Mollica, sócio do escritório Bicalho e Mollica Advogados, a notícia é muito ruim, principalmente porque vem no momento em que os estoques estão altos e novos empreendimentos estão prestes a ser lançados. “Quem comprou lá atrás, agora vai tomar financiamento com preço mais caro. Os resultados são difíceis de prever. Mas se o cenário de estagnação persistir, a tendência é as vendas caírem”, destacou Mollica.
Frustração A notícia veio como um balde de água fria para técnica de enfermagem Priscila Alvim Freitas, que sonha em sair do aluguel e ter uma casa própria. “Agora, só um milagre. Além dos valores do mercado imobiliário estarem acima do que podemos, a inflação tem corroído nosso orçamento”, conta, dizendo que ela e o marido não ganham o suficiente para conseguir dar uma entrada ou financiar um imóvel. “O nosso plano era financiar algo quando os salários aumentassem e os juros caíssem, mas, com essa realidade brasileira, o nosso sonho está, cada dia, mais distante”, comenta.
A mesma frustação teve a adminsitradora Aline Almeida. Desempregada, ela conta que, logo na tarde de ontem, quando soube do reajuste para financiamento, ficou assustada. “Quem vai querer comprar algum imóvel este ano?”, questiona. Ela conta que, como sonha em ter uma casa própia, já pesquisou os preços do mercado imobiliário em Belo Horizonte e está assustada com os valores cobrados por apartamentos e casas. “Minha irmã está há um ano tentando vender um imóvel e não consegue. O mercado está ruim para quem compra e para quem vende. Ela está tão desanimada que já está pensando em alugar”, conta.
Aline diz que, com um cenário econômico cada vez pior para os trabalhadores, principalmente com a taxa de desemprego de 7,4%, será difícil alguém animar a tirar o dinheiro do bolso para dar entrada em algum imóvel, principalmente, depois do arrocho fiscal. Para ela, tudo está tão caro, que, por causa disso, muitos sonhos estão sendo deixados para depois.
Depois de um longo período de crescimento forte, o desaquecimento da economia indica freada forte na receita nominal das empresas do setor de serviços. O setor encerrou fevereiro com alta de 0,8% no faturamento ante igual período do ano passado. Apesar do avanço, o ritmo está aquém do registrado mês a mês desde o início da série histórica em janeiro de 2012. No acumulado de 12 meses, o indicador fechou em 4,7%. É o décimo primeiro mês seguido de desaceleração da receita se considerado o acumulado em um ano.
No país, dois dos cinco diferentes grupos de serviço tiveram retração em fevereiro: transportes (-1,9%) e outros serviços (-0,2%). Serviços prestados às famílias (6,8%); de informação e comunicação (0,6%) e profissionais, administrativos e complementares (3,6%) tiveram alta. Segundo o técnico de Serviços e Comércio do IBGE, Roberto Saldanha, a retração no setor de transportes se deve a dois fatores principais: menor demanda do segmento corporativo por passagens aéreas e baixa demanda por fretes rodoviários.
Ele explica que o setor de turismo teve alta nas viagens aéreas, mas as empresas, responsáveis por mais de 60% dos passageiros, tiveram fortes cortes. O resultado: queda de 4,5% no segmento aéreo. No caso do transporte de carga (-2,5%), o desaquecimento da economia resultou em oferta além da demanda, o que induziu a uma redução no preço dos fretes. O impacto pode ser observado com a retração em Goiás (-4,3%), Paraná (-3,1%), Rio Grande do Sul (-1.9%) e Mato Grosso do Sul (-1,2%).
O professor de finanças do Ibmec, José Kobori, lembra que o crescimento do setor de serviços nos últimos anos está diretamente ligado à política econômica do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff, de incentivar o crescimento via consumo. Com a mudança de rumo, e menor crescimento da renda, a procura tende a ser menor. “O setor de serviços demorou um pouco mais a sentir, mas a tendência é se agravar ao longo do ano. Isso tira um pouco da pressão sobre a inflação dos serviços”, afirma.
Minas Gerais teve resultado pior do que o nacional. No estado, houve queda de 0,1% na receita nominal do setor no período. O estado teve variação negativa em quatro dos cinco grupos de serviço: prestados às famílias (-0.9%), profissionais, administrativos e complementares (-2,4%), transportes (-3,1%) e outros serviços (-9,2%).
REFLEXOS A crise bateu na porta da costureira Palmira Barbosa da Silva, de 65 anos. O aluguel do estabelecimento em que ela montou a pequena empresa, na Rua Contagem, no Bairro Santa Inês, na Região Leste de Belo Horizonte. Subiu 10%. Em razão disso, ela reajustou o preço da bainha no mesmo percentual. “Mas tive que retornar ao valor antigo, porque a clientela achou que encareceu. O preço voltou a ser R$ 10. Já o do aluguel não voltou ao valor que era antes”, lamentou a senhora, que aprendeu o ofício há cinco décadas, em Juramento, no Norte de Minas, onde ela nasceu.
O encarecimento do custo com aluguel e os últimos reajustes de energia elétrica prejudicaram a margem de lucro. Mas outro assunto que a deixa triste é o lamento de sua filha ter sido obrigada a trancar a matrícula no curso de direito: “A faculdade ficou cara e ela não teve como pagar as mensalidades. Precisou interromper o curso”, contou a mulher.
Dona Ieda Maciel de Souza, de 56, também mudou alguns hábitos em razão da desaceleração da economia. “Uma das coisas que mudei foi o número de idas ao salão de beleza. Costumava ir toda semana. Agora vou de 15 em 15 dias. O dinheiro não está sobrando. Está tudo ficando mais caro.”