Nossa atenção será voltada nesta semana para questão que reputamos pouco explorada no ambiente do contencioso tributário: o valor da causa nas ações tributárias, especificamente as antiexacionais.
Desde bem antes, vimos admitindo que o processo é instrumento do Direito material, seu disparador, de maneira que a questão relativa ao valor da causa das ações tributárias deve ser igualmente analisada sob essa perspectiva, a do Direito Tributário, seu pano de fundo.
Restringiremos nossa manifestação aos processos antiexacionais, isto é, aqueles de iniciativa do contribuinte — em sua tríplice manifestação, preventiva, repressiva ou reparadora —, uma vez que as exacionais (as do Fisco), basicamente as execuções fiscais, têm modelo cirurgicamente definido pela LEF.
Pois bem.
Determina o Código de Processo Civil de 2015 em seu artigo 29 que a toda causa deve ser atribuído um valor certo e que deve corresponder à medida econômica da controvérsia posta.
Tratando-se de processo tributário seu objeto necessariamente envolve uma obrigação de natureza patrimonial, já que abarca o pagamento do tributo ou da penalidade pecuniária decorrente da prática do ilício tributário, relacionado esse (o ilícito) ao inadimplemento: 1) do tributo; ou 2) da obrigação acessória — caso enquadrável na subclasse dos processos \”indiretamente\” tributários, na terminologia sugerida por Paulo Cesar Conrado.
Dessa condição ontológica da obrigação tributária (ser patrimonial), há de se reconhecer que o valor econômico do bem que o particular pretende proteger é sempre aferível, supondo a identificação da base tributável, do percentual àquela aplicado e, ao final, do crédito tributário controvertido.
A questão complicadora dessa operação deriva, potencialmente, do momento em que a apuração econômica do crédito tributário é promovida pelo autor da ação, ora imediatamente, ora remotamente, considerado, entre e outra dessas possibilidades, o instante do protocolo da petição inicial — peça em que deve estar indicado o valor da causa.
Usando outros termos: a identificação econômica da causa, no processo tributário, está diretamente relacionada com o tipo de medida judicial utilizada pelo contribuinte.
Tratando-se medida judicial antiexacional anulatória, o crédito tributário já está definido no seu ato constitutivo, tenha sido ele emitido pelo Fisco na modalidade do lançamento de ofício ou pelo contribuinte (via lançamento por homologação), de maneira que o valor da causa é aferido imediatamente e deve corresponder ao montante do crédito constante do ato ou à parcela sob controvérsia.
Na ação reparatória, a quantificação do indébito tributário (crédito do contribuinte) é detectável, também, imediatamente, uma vez que compreende a somatória dos pagamentos feitos pelo contribuinte num determinado período, limitado a cinco anos contados de cada pagamento, tendo em vista o prazo de prescrição da ação de repetição do indébito.
Para essas modalidades de ações antiexacionais segue-se o critério definido no inciso II do artigo 292 do Código de Processo Civil/2015, segundo o qual o valor da causa deve corresponder ao montante em controvérsia, constante do ato que se quer anular ou requalificar (modificar) como \”indevido\” (no caso, o pagamento).
As ações antiexacionais preventivas, utilizadas diante da ameaça de \”concretização indevida do ato constitutivo do crédito tributário\”, porque dotadas de efeito prospectivo (para o futuro, ex nunc), é que nos trazem uma certa complexidade: justamente por se dirigirem a prestações futuras, a apuração econômica da controvérsia que veiculam somente pode ser aferida remotamente.
Entretanto, tal aspecto não afasta o dever de o proponente da demanda indicar valor certo, consagrando-se o problema na sua apuração, para fins de indicação na petição inicial, mas jamais na impossibilidade de ser calculado.
Para essa situação, a de discussões judiciais que envolvem prestações vincendas, cuja tutela jurisdicional projeta efeitos temporalmente indeterminados, o código processual de 2015 define como solução o critério fixado no §2º do já citado artigo 292, segundo o qual o valor da causa deve corresponder à soma das prestações devidas em um ano, postergando-se para o momento da liquidação da sentença a definição da soma pecuniária envolvida na causa (ou definição do seu proveito econômico).
Ainda que não seja possível identificar o equivalente monetário da controvérsia no momento da elaboração da petição inicial, há de se reconhecer que no ambiente do processo tributário esse valor é estimável, isto é, passível de apuração diante da natureza patrimonial da obrigação tributária.
A classificação da causa como \”de valor estimável\” na codificação processual — seja a vigente, seja a revogada — aponta para a possibilidade de a controvérsia ter conteúdo expressável em dinheiro, e não de esse valor \”em dinheiro\” ser elevado.
O critério normativo é objetivo: controvérsia economicamente calculável (imediata ou remotamente) e controvérsia não calculável (nominada de inestimável pelo código) são coisas diferentes.
No grupo das demandas com valor estimável estão inseridas as ações que discutem questões direta ou indiretamente tributárias, como retratado anteriormente.
Inestimáveis, por outro lado, são apenas as demandas colateralmente atreladas à relação tributária, que envolvem, por exemplo, emissão de certidão de regularidade fiscal, aplicação de sanções políticas — condicionar a expedição de notas fiscais ao oferecimento de garantias, interditar estabelecimento ou apreender mercadorias como meio coercitivo para o pagamento de tributos, entre outras.