O Brasil não é um país com excesso de funcionários públicos. Em 2006, tinha, no governo central, 5,32 servidores públicos, incluindo os militares, para cada mil habitantes, uma relação inferior à verificada nos Estados Unidos, em nações europeias e mesmo em emergentes, como o México. Ainda assim, é uma necessidade imperiosa examinar a evolução recente do tamanho do Estado no país, seu custo e a qualidade dos serviços prestados à sociedade que o mantém.
Dos países mencionados na tabela abaixo, o caso mais parecido com o do Brasil é o da Alemanha, que possui 6,10 funcionários por mil habitantes na esfera federal. É uma covardia comparar a qualidade dos serviços públicos alemães com a dos brasileiros, mas os números são uma boa indicação de que não é a baixa relação entre o número de servidores e o de habitantes que explica o fracasso do nosso Estado em várias áreas.
Pesquisadores do IPEA concluíram, num estudo recente (Texto para Discussão 1319), que, no Brasil, o emprego público, considerando todos os funcionários e não só os do governo federal, equivale a 12% das pessoas ocupadas no mercado de trabalho. A relação é bem maior em países como a França (28%) – a média nos países da Europa Ocidental é 25%. Nos EUA, a relação cai para 15% e no México, para 14%. Nesse quesito, uma comparação com os americanos também nós é desfavorável – os EUA têm, no geral, quase tantos funcionários públicos quanto o Brasil, mas a qualidade média de seus serviços públicos é bem superior.
Num trabalho intitulado “O Mito do Inchaço da Força de Trabalho do Executivo Federal”, Marcelo Viana Estevão de Moraes, Tiago Falcão Silva e Patricia Vieira da Costa contestam a ideia de que estaria havendo, nos dois mandatos do presidente Lula, um crescimento explosivo no número de servidores. Eles alegam que a quantidade de funcionários ativos do governo federal em 2008 – 539.608 – é equivalente à de 1997 (531.725) e inferior à de 1988 (705.548).
De fato, nos anos 90, premido por uma crise fiscal que se arrastava desde 1982 e que se agravou depois da Constituição de 1988, o setor público passou a controlar, com rigor, a contratação de pessoal e a evolução dos salários. Com a estabilização da economia a partir de 1994, o governo passou a ter uma ideia mais clara do custo da máquina pública. Nos anos seguintes e até 2002, evitou grandes contratações e segurou os salários.
Lula assumiu em 2003, um ano de crise. A partir de 2004, quando a economia saiu da turbulência e começou a crescer num ritmo mais acelerado, seu governo deu início a um processo contínuo de contratações e de reajustes salariais. De 2003 a 2008, o quantitativo de servidores civis da ativa cresceu 11% (53.056 funcionários), uma expansão equivalente à da PEA (População Economicamente Ativa), que evoluiu à taxa de 1,8% ao ano. Este foi, no entanto, o resultado líquido, ou seja, descontadas as aposentadorias ocorridas no período.
Quando se observa o número total de servidores civis que ingressaram na máquina federal na gestão Lula, os valores são bem mais robustos. De 2003 a 2008, o governo autorizou a realização de concursos públicos para a contratação de 138.796 funcionários – há autorização para a abertura de mais 30.879 vagas em 2009. Do total autorizado até 2008, 88.055 entraram efetivamente para o serviço público.
Moraes, que é secretário de Gestão do Ministério do Planejamento, Silva, que é seu adjunto, e Vieira da Costa, que é gerente de projeto da mesma secretaria, alegam que o crescimento da força de trabalho no governo central tem priorizado os setores mais carentes e as demandas “inadiáveis”. Eles informam, por exemplo, que, do total de 43.044 vagas autorizadas em 2008, 70% foram destinadas à área de educação. Trata-se, sem dúvida, de uma decisão louvável.
O que não se fala, e é aí que está o nó górdio do problema, é dos custos de tudo isso. Funcionários públicos têm direito, no Brasil, a estabilidade no emprego e aposentadoria integral. Isso torna o custo de contratação extremamente elevado e deveria ser levado em conta pelas autoridades no momento de decidir pelo ingresso de novos servidores. O presidente Lula tentou acabar com a aposentadoria integral em seu primeiro ano de mandato, mas, depois, considerou o custo político tão elevado que desistiu de levar a reforma adiante.
Por causa dessa decisão, a conta para o contribuinte cresceu duplamente. Os quase 90 mil funcionários que ingressaram no serviço público desde 2003 o fizeram com direito à aposentadoria integral e os que saíram do governo, muitos fugindo da reforma, asseguraram o direito ao vencimento total. Estes dois movimentos combinados estão refletidos na evolução da despesa com pessoal do Executivo (incluindo ativos e aposentados, além dos militares). Ela pulou de R$ 59,5 bilhões em 2002 para R$ 110,2 bilhões em 2008 – um aumento real de 85% (se a conta considerar apenas os civis, o salto foi de quase 100%).
É verdade que o Brasil não tem, de fato, um Estado inchado do ponto de vista do número de servidores, mas também é verdadeiro que esse Estado, se continuar crescendo sem que se alterem as regras de aposentadoria e de estabilidade (que só deveria valer para carreiras específicas), caminhará a passos largos para se tornar insustentável.