Crise não pode ser argumento para não pagamento de dívidas. Essa é a mensagem que o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Cesar Asfor Rocha, tentou passar ao negar a medida cautelar em que ICP Indústria Cerâmica de Paudalho Ltda. pretendia restabelecer o serviço de energia elétrica, suspenso pela Companhia Energética de Pernambuco (Celpe) por inadimplência. A empresa contesta a não utilização de créditos da Eletrobrás (Centrais de Elétricas Brasileiras) e diz que precisa da energia para exercer regularmente suas atividades, que geram diversos empregos diretos e indiretos.
Segundo informações do tribunal, a indústria de cerâmica argumenta, ainda, que há apenas um débito, do mês de novembro, que possibilitaria a interrupção do fornecimento de energia, já que outros débitos estão sendo discutidos judicialmente.
A empresa pediu o imediato restabelecimento do serviço até o julgamento final da ação, que será analisado pela ministra Eliana Calmon, da primeira seção do STJ, mediante o pagamento da fatura de dezembro e dos meses subsequentes. O advogado da empresa Elvis Del Barco Camargo, no entanto, afirma que a ICP já trabalha com energia por conta de um depósito judicial. \”A empresa fez um depósito judicial na quantia que entendeu ser devida, mas o questionamento gira em torno apenas de um débito referente ao mês de novembro\”.
O presidente do STJ considerou não ter sido demonstrada a plausibilidade do direito, o que caracteriza ausência de fumus boni iuris (fumaça do bom direito), requisito para a concessão da medida cautelar. O ministro Cesar Rocha ressaltou que o STJ já decidiu que o corte no fornecimento de energia elétrica em decorrência de mora não fere o Código de Defesa do Consumidor e é permitido pela Lei nº 8.987/95.
Cobranças repetidas
Por fim, o ministro Cesar Rocha destacou que, de acordo com os autos, as cobranças são referentes não só a débitos antigos, mas também a débitos recentes, inclusive a todos os meses de ano de 2008. Para o presidente do STJ, isso evidencia a atitude contumaz da empresa, o que não é aprovado pelo Tribunal Superior.
O advogado da empresa rebate a afirmação do ministro. Segundo Del Barco, o artigo 173 da Constituição Federal impede a cobrança de débitos antigos, se não no mês subsequente ao não pagamento e esse é o objeto de discussão da ação. Os demais débitos, de acordo com o advogado, são relacionados com créditos da Eletrobrás, maior empresa do setor elétrico brasileiro.
Ele explica que a empresa busca a compensação da energia elétrica \”com créditos da Eletrobrás que foram oferecidos a empresas que consumissem mais de 2.000 kWh\”. \”A Eletrobrás repassa esses créditos para a energia elétrica de todo o País. Uma parte do empréstimo compulsório é destinado às empresas para que façam a compensação da energia elétrica\”, disse. O advogado também afirmou que contesta a prescrição defendida pela Celpe, que é de 20 anos mais cinco e considera que a empresa pode se utilizar desses créditos até meados de 2019, perfazendo quase 40 anos. O site da Eletrobrás informa que o Empréstimo Compulsório, instituído com a finalidade de expansão e melhoria do Setor Elétrico Brasileiro, foi cobrado e recolhido dos consumidores industriais com consumo mensal igual ou superior a 2.000 kWh, através das faturas de energia elétrica emitidas pelas empresas distribuidoras de energia elétrica. O montante anual dessas contribuições, a partir de 1977, passou a constituir crédito escritural, nominal e intransferível, sempre em 1° de janeiro do ano seguinte, identificado pelo Código de Identificação do Contribuinte do Empréstimo Compulsório – CICE. Por ser uma decisão monocrática, o mérito ainda será apreciada pela ministra Eliana Calmon. Da decisão, cabe agravo regimental e a questão pode chegar ao Supremo Tribunal Federal (STF). Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa da Eletrobrás contestou os argumentos do advogado com base em decisões do próprio STJ. \”As empresas tentam utilizar um suposto crédito que está em desuso\”, comentou um assessor. Nenhuma nota oficial da empresa, no entanto, foi enviada à redação. DCI também buscou a assessoria de imprensa da Celpe, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição. O grupo Neoenergia tem o controle da Celpe.