A temporada de debates e polêmicas está oficialmente aberta. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) confirmou a intenção de tornar regra a divulgação individual da remuneração de cada diretor e conselheiro das empresas com ações listadas em bolsa, em vez da divulgação de um montante global, como ocorre hoje. A proposta está contida na minuta da chamada \”nova 202\” , colocada em audiência pública na sexta-feira, que revisa por completo as regras para concessão e atualização de registro das companhias abertas.
Além do detalhamento completo da remuneração, a autarquia também impôs restrições para companhias que lançam os chamados certificados ou recibos de ações (BDR) no mercado local. Além da sede, metade da receita deverá estar também fora do país para a companhia se tornar elegível. As duas mudanças, antecipadas pelo Valor, estão entre as que a CVM espera ver mais comentadas e com maior número de sugestões dos participantes do mercado durante a audiência pública, que será maior que o habitual: vai até 30 de março.
As novas regras dividem as companhias em três categorias, nas quais há graduações das informações exigidas, de acordo com o tipo de valor mobiliário que vai ser emitido e com o mercado em que este vai ser negociado. Para as companhias que vão emitir apenas títulos de dívida, como debêntures ou notas promissórias, a quantidade de dados exigida será menor. Nesse segmento, poderá ser divulgada a remuneração global, como ocorre hoje, mas será preciso informar o que é fixo e o que é variável.
Já para os emissores que querem ter ações negociadas na bolsa, o nível de transparência aumenta consideravelmente. É nessa categoria que será exigido o detalhamento total da remuneração, por cada administrador. Além disso, é preciso que a companhia detalhe o que é fixo, o que é variável, o que é de curto e de longo prazos, além das políticas que balizam os montantes previstos e o que motivou a adoção destas.
A categoria intermediária é para as companhias que queiram emitir ações, mas com negociação apenas no mercado de balcão. Esses emissores têm de informar qual o montante da remuneração dos diretores e dos conselheiros separadamente, mas sem necessidade de detalhamento individual. Para todos os níveis, está previsto um aprofundamento do Relatório da Administração, uma das peças das demonstrações financeiras, que deve se aproximar mais do que é exigido no mercado americano (conhecido como \”Management Discussion& Analysis\”)
O detalhamento da remuneração dos administradores é apenas um dos pontos da reformulação completa do formulário de Informações Anuais (IAN), que passa a se chamar Formulário de Referência e exigirá o mesmo nível de informação que a companhia presta num prospecto de oferta pública, porém obedecendo às diferentes exigências para cada categoria de emissor. O exemplo de como deve ser esquematizado esse novo documento é apresentado pela autarquia em um grande anexo à minuta da nova regra.
\”As ofertas públicas são reguladas por uma instrução muito mais recente e moderna, que é a 400. Já o registro de companhias era balizado pela 202, que é de 1993, quando o contexto era bem diferente do que existe hoje, e acabou sendo atualizada por regras pontuais, ou seja, ficou retalhada\”, disse a superintendente de relações com empresas da CVM, Elizabeth Machado. Além disso, esse novo IAN deverá ser constantemente atualizado e anexado aos prospectos quando houver uma oferta. \”A idéia é que não apenas o documento traga mais informações, mas que elas sejam apresentadas de uma forma que facilite o entendimento e o manuseio dos dados.\”
Outra novidade proposta é a criação dos chamados emissores com grande exposição ao mercado, que são aqueles possuem ações em circulação com valor de mercado equivalente a R$ 5 bilhões e que tenham ações negociadas em bolsa há pelo menos três anos, sem ter descumprido prazos de prestação de informações. Para esse grupo, haverá um registro automático de ofertas públicas, que passa a ser obtido em cinco dias úteis. Se esse expediente já estivesse valendo, a operação feita pela Vale no primeiro semestre de 2008, por exemplo, poderia ter sido mais rápida.
Porém, a CVM estima que ainda são poucas as empresas que se qualificariam para obter esse status. \”No auge da valorização da bolsa, fizemos um levantamento preliminar e eram menos de 30 companhias\”, pondera Luciana Pires Dias, titular da superintendência de desenvolvimento de mercado. Segundo ela, as regras que estão sendo apresentadas devem ser trabalhadas durante o ano de 2009, a partir das sugestões recebidas, e só devem valer para as informações que serão apresentadas em 2010. Ou seja, em maio de 2009 ainda será entregue o IAN como é conhecido hoje, mas em 2010 já entra em vigor o Formulário de Referência.
De acordo com a superintendente de empresas, a idéia da nova 202 é aumentar a qualidade e a quantidade das informações prestadas pelas companhias, trazendo as informações anuais, trimestrais e as demonstrações financeiras necessárias para obtenção do registro de companhia para padrões mais modernos, nos parâmetros em que já estão os registros de ofertas públicas.