O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central está reunido
em Brasília com o desafio de moderar o crescimento econômico e trazer a
inflação para a meta. Mais brasileiros empregados formalmente significa
também mais dinheiro circulando na economia e pressionando os preços.
Além disso, há o impacto da desvalorização global do dólar, que somada a
juros elevados torna o País ainda mais atrativo para investidores
estrangeiros. A partir desse complexo cenário macroeconômico, os
diretores do BC anunciam na noite desta quarta-feira a nova taxa básica
de juros. As apostas mais frequentes do mercado são de que a Selic suba
0,5 ponto percentual, para 12,25% ao ano.
Dados do IBGE situam a
taxa de desocupação média do primeiro trimestre de 2011 no patamar
recorde de 6,3%, resultado que, segundo a pesquisa, veio acompanhado de
um aumento de 4,3% no rendimento médio real dos trabalhadores frente aos
primeiros três meses de 2010. Marcelo Kfoury, economista-chefe do
Citibank, explica que o mercado de trabalho muito aquecido cria o risco
de indexação da economia, quando a disputa por trabalhadores eleva a
média salarial, o que provoca um aumento da demanda e, por consequência,
eleva a inflação. Quando são negociados os dissídios, os reajustes
refletem a inflação passada, o que alimenta o que ele chamou de inércia
inflacionária.
“É importante quebrar esse ciclo e afastar o risco
de volta da indexação. Por isso, vemos a necessidade da aplicação de um
conjunto de medidas que resfrie a economia como um todo”, afirmou, ao
projetar que o colegiado do Banco Central elevará a taxa básica de juros
em 0,5 ponto
percentual.
Essa decisão, acompanhada de um
novo aumento de 0,5 ponto percentual na próxima reunião (marcada para os
dias 7 e 8 de junho), seria suficiente para que a Selic fosse mantida
em 12,75% durante todo o ano de 2011 e a inflação convergisse para o
centro da meta (4,5%), segundo a avaliação do Citibank. Ainda assim, a
instituição projeta que o Brasil fechará o ano com uma inflação de 6,1%,
bem acima da projeção do próprio Banco Central, que é de 5,6%.
Segundo
a avaliação do diretor financeiro e de relação com investidores do
Banrisul, João Gazzana, a demanda por serviços é um dos principais
fatores de composição da pressão inflacionária que deve ser combatido
pela decisão do Copom. O executivo revela que as projeções do Banrisul
também indicam um aumento de 0,5 ponto percentual, contudo, acredita que
o ritmo de alta dos juros deve ser menor na reunião de junho, com um
aumento de 0,25 ponto. “Temos presente que Banco Central tem no seu
radar medidas macroprudenciais já tomadas que ainda não tiveram efeito
total. Por isso os técnicos reunidos em Brasília devem ter cautela e não
raciocinar apenas sobre pressões”, ponderou Gazzana.
Um dos
reflexos mais imediatos desse possível aumento na Selic é, segundo
Giuliano Scherer, diretor da Fence Investimentos (filiada à XP
Investimentos), a queda da demanda por financiamentos, o que pode
refletir em setores-chave como o automobilístico. Ele entende, porém,
que a expectativa de aumento dos juros já está presente na economia
desde meados do ano passado e que, portanto, os preços das ações e a
movimentação dos investidores na BM&FBovespa não refletirão a
mudança.
Por outro lado, juros maiores tornam o Brasil ainda mais
atrativo aos investidores estrangeiros e diminui o preço dos
importados. Na avaliação do executivo do Citibank, esses fatores são
positivos na contenção das pressões inflacionárias. “Entre 2003 e 2006,
uma das principais razões para a inflação foi alta cambial. Também por
isso, acredito que o dólar não deve ter, necessariamente, reflexos na
decisão desta reunião do Copom. Projetamos que o dólar pode chegar a R$
1,55, mas que fechará o ano em R$ 1,60 e manterá o patamar de R$ 1,65 no
ano que vem”, analisa Kfoury.
Os
cenários projetados pelo Relatório de Inflação do Banco Central levam
os analistas do banco Santander a contrariar as expectativas do mercado e
não esperar alta na taxa básica de juros. Para o economista Cristiano
Souza, não é necessário mexer no juro, já que cenários traçados pelo BC
contemplam a possibilidade de um aumento na inflação a curto prazo e,
ainda assim, apontam que a Selic situada em 11,75% é suficiente para que
a inflação fique dentro da meta.
Na primeira projeção feita pelo
Banco Central a taxa de juros mantida a 11,75% ao ano e o câmbio
situado em R$ 1,75 provocava o controle da inflação e a convergência do
aumento dos preços para o centro da meta no próximo ano. Já a estimativa
seguinte considerou juros de 12,5% ao ano e câmbio de R$ 1,70 para
obter o mesmo resultado. “Assim, só com a apreciação cambial, é possível
a conversão da inflação para a meta. Isso pode ser suficiente para que o
Banco Central mantenha a taxa de juros e concentre esforços na política
cambial como forma de conter a inflação.”
Souza avalia que, se
mantida em alta a demanda por serviços nos próximos meses, aí sim a
inflação pode forçar o BC a elevar a Selic para 13% ao ano até dezembro.
“Acontece que no cenário que temos hoje, de baixo desemprego e aumento
de salários, sobe o poder de compra da população e isso se reflete em
setores que não demandam crédito, e, então, o efeito da alta dos juros
não é direto sobre a inflação.”
A
possibilidade de alta na taxa básica de juros é observada com receio
pelo setor industrial. Isso porque, como explica o diretor de estratégia
e gestão da DHB Componentes Automotivos, Gian Carlo Mandelli, a medida
onera a produção e dilui o custo em toda a economia. “Todo mundo acaba
pagando. A busca do antídoto da inflação no aumento dos juros está
saindo muito caro”, afirma.
O empresário observa que filiais de
indústrias multinacionais instaladas no Brasil são incentivadas por suas
matrizes a importar. “O País é caro por seu sistema tributário e sua
infraestrutura ineficiente. A alta dos juros leva a uma valorização do
câmbio, o que faz com que percamos ainda mais a competitividade em todos
os lugares. A situação é crítica e a tendência é a
desindustrialização.”
A avaliação está em consonância com os
dados apontados pelo Informe Conjuntural da Confederação Nacional da
Indústria (CNI). O estudo reviu para baixo as previsões para o
crescimento do PIB, que segundo a entidade deve ficar em 3,5%, e para a
produção industrial, 2,8%.
O economista-chefe do banco
cooperativo Sicredi, Alexandre Barbosa, pondera que, mesmo que haja um
aumento de 0,5 ponto percentual, a alteração não terá impactos diretos
no cliente do sistema financeiro. “Isso porque, de uma maneira geral, os
produtos bancários não estão atrelados diretamente à taxa básica. O
reflexo só virá com o passar do tempo”, disse.