Enquanto o órgão mais atingido pela Operação Concutare emite os primeiros sinais de reação ao desmantelamento que o tornou solo fértil para a corrupção, em outra frente a espera por punição ainda promete ser longa.
Um ano após vir à tona o escândalo do suposto pagamento de propina para obtenção de licenças ambientais, o caso segue à espera de que Ministério Público Federal (MPF) aponte os responsáveis.
Paralisada depois da ação que expôs um esquema de fraude para acelerar licenciamento e fonte recorrente de queixas de empresários que sofriam com a morosidade para tocar seus empreendimentos, a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) teve funcionários e um ex-presidente presos entre as 18 pessoas detidas pela Polícia Federal (PF) à época. A maratona burocrática dos licenciamento se tornava a oportunidade para que servidores e consultores vendessem facilidade.
O esforço para se reestruturar e abolir práticas que abriam brechas às irregularidades, agora, encontra respaldo em quem costumava criticar a Fepam, mesmo que a instituição ainda esteja longe de ter estrutura adequada ao tamanho da demanda por licenciamentos.
— A Fepam começou a deslanchar. Melhorou o diálogo, e acreditamos que os prazos das licenças, que por natureza não são rápidas, devam se normalizar. Dá para ver uma luz no fim do túnel — define Ricardo Sessegolo, presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado (Sinduscon-RS).
A percepção é compartilhada por Ricardo Rosito, presidente do Sindicato das Empresas Eólicas do Estado, que ainda no início do ano reclamava da lentidão que atrasava empreendimentos de energia no Rio Grande do Sul.
— A Fepam está com mais pessoal, equipamentos, estrutura. O prédio deles também melhorou. O ambiente é outro – ilustra Rosito, lembrando que, além da Concutare, a Fepam sofreu com a interdição do edifício onde funcionava anteriormente.
Plano de cargos e carreiras abre oportunidade de carreira
Nas consultorias que atuam na área ambiental, também prejudicadas pela letargia crônica do órgão ambiental do Estado, a visão é parecida. Adriano Souza da Cunha, sócio da Biolaw Consultoria Ambiental, cita como avanços o maior regramento para reuniões com técnicos e o fim das caronas que consultores e empresários davam aos funcionários da Fepam para acelerar vistorias em empreendimentos devido à falta de veículos no órgão.
— A fila passou a ser igual para todos — define Cunha.
A disposição para trabalhar também melhorou, atesta Estevão Segalla, presidente da Associação dos Servidores da Fepam (Asfepam). A mudança, afirma, ocorreu com a criação de um plano de cargos e salários. Com isso, afirma Segalla, os técnicos começaram a enxergar a Fepam como uma oportunidade de carreira, e não apenas um entreposto à espera de outro caminho profissional.
— Até aquele momento (Operação Concutare), o governo não tinha prestado muita atenção na questão ambiental, que pode até parar o Estado. Não se faz nada sem licenciamento ambiental — diz Segalla.
Paralisia levou à queda de licenciamentos
O resultado da paralisia da Fepam devido à Operação Concutare, realizada há um ano, foi a queda da emissão de licenças. Em 2013, foram 10,9 mil liberações, 19% a menos do que no exercício anterior. Como falta de capacidade não é recente, o estoque de processos aumenta. A estimativa é que, de 2010 a 2013, a diferença no número de pedidos de licença que ingressam e as liberações seja de cerca de 1,5 mil por ano. A maior parte, porém, se refere a renovações de empreendimentos já existentes.
Chamado pelo governador Tarso Genro para assumir a Fepam após a operação da Polícia Federal, o engenheiro químico Nilvo Silva também é apontado como um dos responsáveis pelo início do processo de ressurgimento da Fepam. De perfil técnico, Nilvo avalia que o terremoto que sacudiu o órgão não foi resultado do acaso, mas do abandono da instituição.
— Foi um processo público de desinvestimento ao longo dos anos que gerou as condições para que a Concutare acontecesse. O solo fértil para a corrupção é a falta de gestão, transparência e controle — entende Nilvo, que também presidiu a Fepam durante o governo Olívio Dutra (1999-2002).
Desestruturado, o órgão perdeu a capacidade para responder ao aumento da busca por licenciamento e, ao mesmo tempo, de proteger o ambiente. Nilvo lembra que, na sua primeira passagem, a Fepam não era ré em nenhuma ação civil pública. Quando retornou, enfrentava mais de 70.
PF indiciou 49 pessoas
A Operação Concutare derrubou a cúpula ambiental do governo gaúcho e da Capital um ano atrás.
Entre os 18 presos, estavam os secretários do Meio Ambiente do Estado, Carlos Niedersberg, e de Porto Alegre, Luiz Fernando Záchia, e o secretário do Meio Ambiente do governo Yeda Crusius, Berfran Rosado, que atuava em uma consultoria da área.
Até três semanas antes da operação, Niedersberg era presidente da Fepam. Na lista de detidos havia ainda cinco empresários interessados na obtenção irregular de licenças. Depois, foram soltos.
No fim de agosto do ano passado, a Polícia Federal (PF) indiciou 49 pessoas, sendo 13 servidores públicos, 18 empresários, nove consultores ambientais e nove pessoas que teriam participado de crimes como “laranjas”, usados para a ocultação de bens.
Da Fepam, foram presos na operação os servidores Mattos’Alem Roxo e Ricardo Sarres Pessoa. Como o Ministério Público Federal (MPF) ainda não fez a denúncia e o processo na Justiça sequer começou, apesar de afastados os dois seguem recebendo salários graças a uma decisão judicial.