Nos termos do artigo 194 da Constituição Federal, a seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.
Nesse mesmo sentido, conforme preconiza o artigo 195 da Constituição Federal, denota-se que a seguridade social será financiada pela sociedade, direta e indiretamente, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios.
Dos referidos dispositivos legais, é possível extrair, de plano, a importância do direito à saúde, haja vista que, além de estar inserido dentro das ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, verifica-se que todos os entes federativos, ou seja, de todas as esferas, Federal, Estadual ou Municipal, respondem solidariamente a este encargo, inclusive em decorrência da previsão do artigo 198 da Constituição Federal.
Da mesma forma, os artigos 23, inciso II e 30, inciso VII, ambos da Constituição Federal, estabelecem o dever dos entes federativos de viabilizar o exercício do direito à saúde.
Aliás, sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do RE 855.178/SE, sob o regime de repercussão geral vinculado ao Tema 793, estabeleceu a seguinte tese:
\”Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro\”.
Por meio de uma simples leitura do quanto decidido no Tema 793, denota-se que referida decisão tão somente ratificou o quanto estabelecido no artigo 196 da Constituição Federal, no sentido de que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
Em raciocínio análogo, registre-se, ainda, a jurisprudência pacífica do Eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, de que a determinação judicial para o fornecimento de medicamentos e insumos não caracteriza violação a separação dos Poderes e pode ser proposta em face de qualquer pessoa jurídica de Direito Público Interno, conforme Súmulas 65 e 37:
\”Súmula 65: Não violam os princípios constitucionais da separação e independência dos poderes, da isonomia, da discricionariedade administrativa e da anualidade orçamentária as decisões judiciais que determinam às pessoas jurídicas da administração direta a disponibilização de vagas em unidades educacionais ou o fornecimento de medicamentos, insumos, suplementos e transporte a crianças ou adolescentes.
Súmula 37: A ação para o fornecimento de medicamento e afins pode ser proposta em face de qualquer pessoa jurídica de Direito Público Interno\”.
Inquestionável, portanto, que todo e qualquer ser humano tem o direito à saúde, corolário do princípio da dignidade da pessoa humana e, em última análise, do próprio direito à vida — cujo dever é do Estado — de todo ele — e direito inalienável de toda e qualquer pessoa, cabendo ao Poder Público zelar por sua efetividade e garantir seu acesso de modo universal, igualitário e indiscriminado.
Fato é que tratando-se de atendimento de urgência e/ou emergência, inclusive que implique na necessidade de internação do paciente em Unidade de Terapia Intensiva ou Unidade de Tratamento Intensivo comumente conhecida como UTI, importante esclarecer que nem todos os hospitais públicos possuem esse tipo de serviço e, aqueles que possuem, não raras as vezes, os leitos encontram-se ocupados e indisponíveis.
Sobre o assunto, importante trazer a informação que, nas hipóteses que envolvam atendimento no Estado de São Paulo, o nosocômio responsável deverá realizar o cadastro do paciente no sistema CROSS, cuja uma dentre outras finalidades é informar a disponibilidade de vagas em leitos de UTI, em hospitais da rede pública — Lei nº. 56.061/2010 [http://www.cross.saude.sp.gov.br/].
Além da realização do cadastro do paciente, o hospital responsável também deverá realizar um monitoramento assíduo das respostas a serem apresentas pelos demais hospitais, respeitando, inclusive, o dever de fiscalização nos serviços prestados.
Entrementes, a depender da gravidade do caso, o hospital público responsável pela análise do paciente poderá se valer de instituições privadas, nos termos do §1º, do artigo 199 da Constituição Federal, por meio do qual assegurou à iniciativa privada, executar os serviços de saúde, de forma complementar ao Sistema Único de Saúde (SUS).
E justamente em razão desse caráter complementar que André da Silva Odcgy nomeia o Brasil como um sistema misto de saúde.
Portanto, isso só demonstra o caráter não estatizante do Sistema Único de Saúde (SUS), haja vista que possui tradição para compor representações estatal e privada, particularmente a possibilidade de trabalhar com filantrópicas, as Santas Casas, e posteriormente com as Organizações Não-Governamentais.
Logo, o fato de não existir vaga em leito de UTI não pode, em hipótese alguma, servir como justificativa do Poder Público, em qualquer esfera, para obstaculizar o cumprimento do direito fundamental à saúde assegurado pela Constituição Federal.