A revisão dos regulamentos do Novo Mercado e dos dois outros segmentos diferenciados de listagem da BM&F Bovespa entra em sua etapa decisiva. Uma primeira versão do documento foi enviada recentemente ao conselho da bolsa, de onde sairá um documento final ao mercado. Um dos assuntos mais polêmicos que vieram à tona nesse período diz respeito à possível ampliação do tag along, prêmio pago aos acionistas minoritários quando uma empresa tem seu controle adquirido. Atualmente, os minoritários que possuem ações de empresas listadas no Novo Mercado têm direito a receber, proporcionalmente, o mesmo valor pago aos controladores das companhias em caso de alienação de seu controle. Pelas regras sugeridas por parte do mercado, esse mecanismo seria ampliado. Investidores que comprarem 30% ou mais das ações das companhias listadas no mais alto de grau de governança corporativa da bolsa brasileira teriam de fazer uma oferta pública de aquisição aos demais acionistas. O mecanismo aproximaria o conceito de controle do mercado europeu. “Pelo que temos conhecimento, seria uma variação do tag along, que daria aos minoritários a chance de se retirarem das empresas”, afirma Alexandre de Micelli, coordenador do Centro de Estudos em Governança Corporativa da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi).
De acordo com o especialista, os minoritários seriam remunerados pelo valor econômico das empresas. A métrica inclui como principal referência a geração de fluxo de caixa. “Esperamos que essa oferta também inclua as aquisições originárias”, pondera. Isso significa que, ainda que a companhia fosse incorporada e não adquirida, a oferta teria de ser feita aos acionistas minoritários. A proposta de condicionar a compra de 1/3 das ações ordinárias de uma empresa à realização de uma oferta a seus sócios minoritários foi bem aceita ao longo da revisão das regras do Novo Mercado e tem boa possibilidade de vingar, diz Lucy Sousa, presidente da Apimec Nacional (Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais). “O gatilho de 30% foi discutido e é tido como bastante razoável. Nenhum investidor que adquire um percentual tão relevante de papéis de uma companhia faz isso sem ter a intenção de controle”, afirma.
Opinião parecida tem Larissa Teixeira, sócia do Teixeira, Martins Advogados. “Em um mercado como o nosso, onde as empresas estão longe de ter o capital pulverizado e se caracterizam por ter blocos de controle claros, é impossível comprar 30% das ações e não mirar o controle.”
O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) é outra importante associação do mercado que vê como uma evolução a possível introdução do mecanismo uma oferta extensiva aos minoritários. “Ficaremos mais próximos daquilo que se pratica na Europa e é tido como uma boa prática de governança”, define João Pinheiro Nogueira Batista, vice-presidente do conselho de administração do instituto.
Fim do tag along
Embora boa parte do mercado seja favorável à extensão do tag along, sua aceitação não é consensual. Ao contrário. Há até mesmo especialistas que são contra a manutenção do tag along puro. Essa corrente acredita que o mecanismo encarece, podendo, no limite, inviabilizar bons negócios para investidores interessados em comprar fatias relevantes de companhias de capital aberto locais. “O tag along de 100% foi importante durante um tempo. Criou um conforto para os minoritários, mas atualmente, por si, não se justifica mais”, defende Thiago Sandim, sócio do Lefosse Advogados. O profissional, cujos principais clientes são fundos de private equity e investidores institucionais, diz entender que a intenção da bolsa ao sugerir a oferta aos minoritários todas as vezes que um acionista atingir a participação de 30% dos papéis é estimular a dispersão acionárias das companhias. “O mecanismo praticamente força isso, o que é bom para a bolsa. Traz novos participantes ao mercado. Mas pode também inibir compras de fundos de private equity”, projeta.
Mudança cultural
Outro argumento defendido pelos profissionais que são favoráveis à extinção do tag along de 100% para acionistas de empresas listadas no Novo Mercado é o de que ele não seria o melhor instrumento para proteger os interesses dos minoritários. “O mercado ainda não reconhece adequadamente a futura geração de sinergias entre empresas que passam por processos de fusão e aquisição”, diz Ricardo Almeida, professor de finanças do Insper (ex-Ibmec/SP), que defende que as empresas passem a utilizar de forma mais eficiente os comitês de análise de fusões, aprimorando a metodologia recomendada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em seu parecer 35. “Esse órgão teria a participação de conselheiros e tentaria expressar de forma bem clara quais seriam as sinergias geradas pela transação. Hoje essas informações são restritas ao controlador. Se souber esses detalhes, o acionista poderia optar por continuar na companhia e esperar que o mercado lhe remunerasse no futuro com a valorização dos seus papéis”, explica.