A nova Lei de Licenciamento Ambiental e os desafios para os municípios
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8 de outubro de 2025O planejamento, além de princípio das contratações públicas, é um dos pontos de destaque no capítulo da Lei nº 14.133/2021 que disciplina a fase preparatória das licitações e corrige falha da Lei Geral de Licitações e Contratos Administrativos que a antecedeu. Na vigência da Lei nº 8.666/93, a falta de previsão legal sobre o planejamento prévio à licitação e à contratação provocava graves problemas, “acabando por gerar uma desordem na arquitetura das demandas, prejudicando a efetividade das ações governamentais e o interesse público, anseio último das contratações”.
Nas contratações da área de saúde, porém, o tema do planejamento já ganhava alcance em discussões no Congresso. Na vigência da Lei nº 8.666/93 já havia discussões para evitar os problemas citados e racionalizar a aquisição de equipamentos médicos destinados ao Sistema Único de Saúde (SUS). O principal problema que se visava combater era o da dilapidação do erário, pois comumente os equipamentos médicos para diagnósticos e exames eram adquiridos mediante licitação a custos altos, mas sem que houvesse a necessária infraestrutura nos locais destinados à instalação e sem que os servidores públicos estivessem capacitados tecnicamente para operá-los. O resultado disso, previsível, era a inutilização e depreciação dos equipamentos e desperdício dos recursos públicos em prejuízo último da população de pacientes.
Nesse sentido, o Projeto de Lei nº 2.641/2019 do Senado propunha a alteração da legislação de licitações para condicionar a contratação de equipamentos médicos à existência de local adequado e pessoal técnico capacitado para operar e manter os bens adquiridos pelo SUS. Na Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ) foi apresentado substitutivo ao projeto inicial, para que a condicionante se aplicasse apenas às contratações de maior complexidade.
Na CCJ foi discutido e decidido que seria inoportuno aumentar as exigências de contratação nas licitações de valor considerado baixo, inclusive considerando o custo anual de manutenção ou operação dos equipamentos. Nas discussões legislativas, o critério definido para exigência de requisitos mais elaborados na fase de planejamento da compra foi o valor para dispensa de licitações previsto no artigo 75, II da Lei nº 14.133/21. O valor representa atualmente a quantia máxima de R$ 62.725,59 para equipamentos de saúde.
Já sob a vigência da Lei 14.133/21, a versão do substitutivo foi aprovada no Congresso Nacional e foi inserido, pela Lei 15.210 de 17 de setembro de 2025, o artigo 44-A na Lei Geral de Licitações, acrescido de um parágrafo: “Art. 44-A. O processo licitatório para compra de equipamento destinado a procedimento diagnóstico ou terapêutico no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) que tenha valor superior ao previsto no inciso II do art. 75 desta Lei deve levar em consideração o seu adequado aproveitamento ao longo de sua vida útil. § 1º No edital de licitação, deve constar a demonstração da capacidade instalada para operação do equipamento ou o plano de atendimento aos requisitos necessários à operação”.
Além do parágrafo primeiro efetivamente incluído na lei, o projeto encaminhado para sanção previa originariamente mais três. O parágrafo segundo previa a obrigatoriedade de um plano de atendimento dos requisitos necessários para a operação dos equipamentos, que deveria conter, objetivamente, os seguintes itens mínimos: 1) a demonstração do orçamento para manutenção e operação do bem; 2) o cronograma de treinamento ou contratação de pessoal para operação; 3) o cronograma de obra para construção ou adaptação do local de instalação, cuja conclusão deveria obrigatoriamente ser anterior à data de entrega. Por sua vez, o parágrafo segundo previa a necessidade de demonstração pela administração pública contratante, no prazo de até seis meses da entrega do equipamento: 4) da existência de profissionais habilitados para operação; 5) de contrato para manutenção e reparo, por toda a vida útil do equipamento comprado; 6) da efetiva instalação do equipamento em local com infraestrutura adequada.
As exigências objetivas dos parágrafos segundo e terceiro contribuíam para a eficácia da exigência contida no caput, e serviam à identificação precisa da composição do custo do ciclo total de vida do bem adquirido, o qual, conforme ensina a doutrina, é composto ao menos pelos custos de “(i) manutenção; (ii) depreciação e revenda; (iii) responsabilidade ambiental; (iv) de responsabilidade do desenvolvimento local e regional; (v) de responsabilidade social e (vi) de responsabilidade do desenvolvimento científico, tecnológico e inovativo”.
Como consequência para o desatendimento de tais requisitos, o parágrafo quarto previa a responsabilização civil e administrativa do agente público, bem como o processamento por improbidade administrativa nos termos da Lei nº 8.429/92 quando presente o dolo. O mesmo dispositivo eximia de responsabilidade o gestor nas situações em que sua conduta não contribuísse para o descumprimento da norma, como seriam as hipóteses de caso fortuito ou força maior, atos de terceiro, e nas quais obstáculos e dificuldades reais inerentes ao contexto da contratação impossibilitassem o atendimento dos requisitos dos parágrafos anteriores.
Por fim, o parágrafo quinto contemplava o resultado das discussões na CCJ do Senado, e obrigava a observância de todos os requisitos citados também para os equipamentos cujo custo de aquisição fosse menor do que os atuais R$ 62.725,59 para dispensa de licitação, mas para os quais os custos anuais de manutenção ou operação superassem aquele limite.
Entretanto, os parágrafos terceiro a quinto foram vetados pela Presidência da República. A justificativa foi a de que contrariavam o interesse público por aumentar a complexidade das licitações, com maior demora na contratação e suposto prejuízo do público destinatário. Apesar da justificativa, o veto desconfigura o propósito da legislação e retira a eficácia do novo artigo 44-A, na medida em que exclui os critérios objetivos de planejamento para as compras de equipamentos pelo SUS.
Sem considerar as discussões legislativas, o veto anulou a finalidade da inclusão do dispositivo, que praticamente em nada se diferencia das determinações já contidas na Lei nº 14.133/21 para o planejamento geral das compras públicas. Isoladamente, o caput do artigo 44-A não destoa do que lei já prevê em outros dispositivos genéricos sobre a necessidade de considerar no planejamento o “ciclo de vida do objeto” licitado (artigos 6º, XXIII, “c” e 11, I).
O parágrafo primeiro, desacompanhado dos parágrafos seguintes previstos no projeto, não inova, por exemplo, em relação ao que prevê o artigo 18, X da lei, que obriga a administração pública a abordar na fase preparatória “todas as considerações técnicas, mercadológicas e de gestão que podem interferir na contratação, compreendidos: X – a análise dos riscos que possam comprometer o sucesso da licitação e a boa execução contratual”.
Ou seja, do modo como resultou a Lei 15.210/25, o acréscimo dos dispositivos não contribui para a melhoria do ambiente de contratação no SUS, nem para evitar o vilipêndio do erário nos processos de compras de equipamentos. Ademais, o veto excluiu a consequência anteriormente prevista no parágrafo quarto para os agentes públicos que dolosamente não planejarem a contratação daqueles equipamentos, o que fomenta práticas eleitoreiras e aventureiras com dinheiro público, fato que, por si só, já mereceria críticas.
Fonte: Conjur
