Países ricos e em desenvolvimento exibiram no fim de semana divergências sobre a melhor maneira de providenciar os recursos necessários para fortalecer o Fundo Monetário Internacional (FMI) e ajudá-lo a socorrer os mercados emergentes mais afetados pela crise global.
Os sócios da instituição reafirmaram compromissos assumidos no início do mês pelos líderes do G-20, que prometeram mobilizar US$ 750 bilhões para novos empréstimos do Fundo, mas as diferenças que vieram à tona nos últimos dias indicam que vai demorar para que boa parte desses recursos apareça.
Os Estados Unidos e outros países avançados preferem que as novas contribuições para o FMI sejam feitas por meio de uma linha de crédito especial que já existe e é controlada por um pequeno grupo de membros da instituição. Países emergentes como a China e o Brasil se opõem à proposta, porque desejam ter maior influência na distribuição do dinheiro do Fundo.
O mecanismo favorecido pelos países ricos é conhecido como Novos Acordos de Obtenção de Empréstimo (NAB, na sigla em inglês) e tem apenas 26 participantes atualmente, entre eles os Estados Unidos, o Japão, a Alemanha e algumas nações em desenvolvimento, como o Chile, a Coreia do Sul e a Tailândia.
Criado em 1998, esse programa funciona como uma linha de crédito especial que o Fundo pode acessar apenas em emergências e depois de obter autorização dos participantes do grupo. O máximo que o FMI pode sacar dessa linha hoje é US$ 50 bilhões. Desde sua criação, o NAB só foi usado uma vez, para ajudar a financiar um pacote de socorro ao Brasil no fim de 1998.
Os líderes das potências econômicas que fazem parte do G-20 prometeram ampliar em US$ 500 bilhões esse programa, mas até agora apenas os ricos abriram o talão de cheques. O Japão emprestou US$ 100 bilhões para o Fundo. EUA, União Europeia, Canadá, Suíça e Noruega prometeram outros US$ 224,5 bilhões.
Apenas os recursos oferecidos pelo Japão estão disponíveis para o FMI. A parte dos EUA depende de autorização do Congresso americano. No fim de semana, quando ministros das finanças do mundo inteiro se encontraram em Washington para a reunião que o FMI e o Banco Mundial fazem todos os anos em abril, nenhum outro país se dispôs a contribuir com o Fundo.
Países como a China, a Índia e o Brasil se recusaram a participar desse arranjo por várias razões. A principal é que eles teriam que contribuir com muito dinheiro para ter influência no grupo que controla o NAB. Além disso, eles acreditam que seria preferível ampliar os recursos do Fundo de forma mais permanente, e não com empréstimos temporários como os do NAB.
O meio mais simples de fazer isso seria aumentar as cotas da instituição, o que obrigaria todos os países a contribuir com capital para o Fundo de acordo com seu peso na economia mundial. O problema é que ninguém quer fazer isso sem mudar os critérios usados atualmente para distribuir as cotas. Eles foram revistos há um ano, mas ainda subestimam a força econômica dos países emergentes.
Os membros do FMI concordaram no fim de semana em acelerar um processo de revisão das cotas que já estava previsto para ocorrer, mas ele só deverá ser concluído em 2011, quando é bastante provável que a fase mais aguda da crise atual esteja superada. Enquanto essa discussão estiver em andamento, a única maneira de reforçar os cofres do Fundo é por meio de arranjos provisórios como o NAB.
Uma alternativa em estudos na instituição é a emissão de um bônus que permitiria ao Fundo captar recursos de países emergentes que acumularam grande volume de reservas em dólar antes da eclosão da crise financeira, como a China e a Arábia Saudita. Além da China, Brasil, Índia e Rússia já manifestaram interesse em comprar esses papéis.
A emissão dos bônus pode ser aprovada pela diretoria do Fundo em alguns meses se seu rendimento e outras condições oferecidas pela instituição forem atraentes para os países emergentes. “Tenho certeza de que esse veículo será usado”, afirmou no sábado o diretor-gerente do FMI, Dominique Strauss-Kahn. “Ele oferece flexibilidade e é interessante para muitos países.”
Logo depois da reunião do G-20, o primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, disse que a China estava disposta a contribuir com US$ 40 bilhões para o Fundo. No fim de semana, a Índia sugeriu que poderia entrar com US$ 10 bilhões se os bônus forem lançados. O Brasil até agora não indicou o valor da contribuição que gostaria de fazer.
No fim de semana, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que uma condição para que o país participe da iniciativa é que os papéis do Fundo possam ser negociados livremente no mercado internacional de capitais. “Estamos interessados em contribuir com o FMI, mas queremos mecanismos novos”, disse.