Os Estados Unidos estão pressionando a Europa em negociações nos bastidores para reduzir drasticamente o poder europeu no Fundo Monetário Internacional, em favor de países em desenvolvimento como Brasil e China.
O esforço faz parte das deliberações preliminares à reunião de cúpula do Grupo dos 20 países industrializados e em desenvolvimento. O G-20, cujas reuniões financeiras começaram ontem em Londres, já aprovou mais fundos e mais responsabilidades para o FMI, para ajudá-lo a lidar com as crises econômicas e advertir sobre problemas.
O G-20 está debatendo como reorganizar as instituições internacionais criadas no fim da Segunda Guerra Mundial, para refletir melhor a transferência de poder econômico dos países industriais tradicionais para os emergentes. “Essas mudanças vão exigir muitas negociações”, disse uma autoridade de um grande país em desenvolvimento do G-20. “Mas estamos com disposição para negociar.”
Os EUA promovem duas propostas específicas. Na primeira, o número de assentos do conselho do FMI seria reduzido de 24 para 20 até 2012, e os países emergentes que já têm assentos os conservariam. Os EUA não especificam quais países deveriam ceder seus assentos, mas é claro que alguns deles seriam europeus.
Atualmente o conselho do FMI tem oito membros que representam seus países – EUA, Japão, França, Grã-Bretanha, Alemanha, China, Rússia e Arábia Saudita – e 16 que representam grupos de países. Muitos assentos de grupo são chefiados por países europeus.
A Comissão Europeia já propôs dar uma única cadeira aos 16 países que usam o euro, mas a ideia foi rejeitada por eminentes políticos europeus. A França “não quer que a Europa toda seja representada por um único assento”, disse esta semana a ministra da Economia da França, Christine Lagarde.
A segunda proposta americana iria transferir, basicamente, cinco pontos percentuais de representação no FMI, que passariam de países industrializados tradicionais para outros em desenvolvimento. Atualmente os países industrializados têm cerca de 60% de representação.
Com essa proposta, a Europa também perderia poder. “Os EUA e a Europa têm economias mais ou menos do mesmo tamanho, mas a Europa tem uma porcentagem de participação duas vezes maior que a dos EUA”, diz Edwin Truman, que trabalhou no Departamento do Tesouro dos governos Bill Clinton e Barack Obama e hoje está no instituto Peterson de Economia Internacional.
Autoridades europeias argumentam que a posição americana não leva em conta o fato de que alguns países em desenvolvimento também têm uma representação superior ao peso deles na economia mundial. Em particular, citam a participação da Arábia Saudita como muito grande. Elas também gostariam de eliminar o poder de veto dos EUA, cuja participação no voto é grande o bastante para bloquear medidas que exigem uma maioria de 85%.
A representação no FMI é expressa em “cotas”. Cada um dos 186 membros do FMI recebe um certo número de cotas, calculado por uma fórmula que deve refletir o peso do país na economia global. As obrigações financeiras de cada país para com o FMI e a quantidade de votos a que tem direito se baseiam nas cotas.
Em março de 2008, o FMI apresentou uma proposta para mudar as cotas em apenas dois pontos percentuais – mudança que não foi aprovada pelos países membros. Os EUA agora buscam um acordo inicial quanto à porcentagem de mudança – cinco pontos percentuais – para negociar depois quem vai receber o golpe.
A proposta encontra apoio do Brasil, China e Índia e outros países emergentes – e resistência dos europeus, dizem autoridades do FMI. “A China está aberta a todas as opções para tornar o FMI mais legítimo, relevante e efetivo”, disse uma autoridade chinesa de alto escalão.
Uma autoridade americana disse que mesmo que os EUA não consigam acordo em nenhuma das duas propostas, estão jogando para ganhar pontos com a China e outros grandes países emergentes, de cujo apoio necessitam em outras questões do G-20.
Autoridades europeias argumentam que deveriam conservar seu poder porque o FMI depende muito da Europa. Esta semana, os ministros econômicos da UE aumentaram a contribuição do grupo ao FMI de US$ 100 bilhões para US$ 175 bilhões. O papel da Europa no FMI “não deve ser contestado”, disse Christian Noyer, presidente do Banco da França em uma conferência esta semana em Buenos Aires.
Brasil e China, por outro lado, deram contribuições mais modestas ao fundo – e sob a forma de compra de títulos de renda fixa, os quais poderão revender ao FMI.