A dedicação em cumprir uma agenda popular e performática tem marcado o início de diversas administrações municipais. Com o óbvio desgaste da figura do político tradicional, e o sucesso eleitoral de quem se apresentou ao eleitor como \”não político\”, os novos prefeitos estão tentando mostrar que também \”trabalham de verdade\”, \”acordam cedo\”, \”põem a mão na massa\”, \”arregaçam as mangas\” e \”são gente como a gente\”.
Não à toa, em São Paulo, João Doria (PSDB) estreou como prefeito vestido de gari e cimentando uma calçada; enquanto no Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (PRB) deixava-se fotografar em plena doação de sangue e durante uma roda de capoeira. Os mandatários de Belo Horizonte e Curitiba também não ficaram atrás: Alexandre Kalil (PHS) virou notícia por \”almoçar de marmitex\”; e Rafael Greca (PMN) destacou-se por usar o transporte público para comparecer à própria diplomação. Em cidades menores, o fenômeno é ainda mais comum. Além das varrições públicas, prefeitos capinam um lote, desentopem bueiros, dirigem empilhadeiras e etc. e tal.
\”Os prefeitos estão buscando uma legitimidade típica de começo de mandato. Trata-se, claro, de uma legitimidade simbólica – que no universo político é muito importante. Ao se vestir de gari, por exemplo, o político quer passar a mensagem de que vai trabalhar duro pela cidade\”, comenta o cientista político Cláudio Couto, professor do Departamento de Gestão Pública Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP). Para ele, o marketing por trás desse tipo de ação não é um \”mal em si\”. \”A questão é que isso não pode se tornar o fator principal dentro de uma administração. Não é se vestir de trabalhador que vai transformar alguém em um bom prefeito.\”
Fora dos grandes centros, quem tem personificado com entusiasmo a persona do \”prefeito mão na massa\” é Marcelo Pecchio (PSD). Como chefe do Executivo da cidade de Quatá, no interior paulista, ele tem feito ações diárias de limpeza, corte de grama e promovido longas caminhadas para ouvir o que a população tem a dizer. \”O funcionalismo público não é muito bem-visto pela população. Então, eu vou para a rua com a intenção de dar o exemplo. Eu quero varrer, cortar grama, tapar buracos… E faço isso para que outros funcionários da Prefeitura façam como eu.\”
Para o especialista em marketing político, Carlos Manhanelli, posturas como a de Pecchio e de muitos outros prefeitos servem para reafirmar \”o que eles eram quando estavam em campanha\”. Ou, como ressalta o também especialista em marketing Marco Íten, o tempo entre a eleição e a posse é muito grande. \”Então, esses primeiros dias servem para \’refrescar a cabeça do eleitor\’ sobre em quem ele depositou sua confiança.\”
O prefeito de Volta Redonda (RJ), Samuca (PV), foi um que não mudou o comportamento mesmo depois de eleito. \”Sou a favor do olho no olho. Nos primeiros dias do meu mandato, fui trabalhar de ônibus e também fiz o percurso de casa até à prefeitura à pé. Eu entro pela porta da frente da prefeitura. O ex-prefeito entrava pela porta dos fundos.\”
De acordo com Emmanuel Publio Dias, professor de marketing político da ESPM, o tal \”olho no olho\” propagandeado pelo prefeito de Volta Redonda tem uma explicação: \”Os costumes políticos estão mudando. Antigamente existia o que se chamava de liturgia do cargo. O político se comunicava com um grupo muito pequeno. Hoje, a liturgia foi substituída pelo contato com o público. É marketing.\”
Para além de qualquer simbolismo, as ações populares de início de mandato também podem esconder um motivo bastante concreto: falta de dinheiro. O prefeito de Rio Preto, Edinho Araújo (PMDB), é quem revela: \”Uma cidade não vive só de grandes obras. Em um momento de crise, a gente tem o dever de cuidar e limpar a cidade. São ações que custam pouco, mas causam grande impacto na vida das pessoas\”, disse Araújo, que está promovendo o chamado \”faxinão\” em Rio Preto.
Assim, com problemas de caixa, prefeitos do Brasil inteiro tem apostado em ações baratas e de repercussão. \”Não há dinheiro para resolver problemas estruturais ou complexos… Então, cuida-se de problemas mais pontuais\”, diz o cientista político da FGV, Fernando Abrucio.