A temporada de assembleias de acionistas nas companhias abertas em 2009 deixou como saldo um aumento expressivo na instalação de conselhos fiscais – órgãos responsáveis por analisar as demonstrações financeiras e o trabalho dos administradores. Geralmente inserido na empresa a pedido de minoritários, a maior adoção do órgão reflete, justamente, o aumento da participação dos investidores na vida da companhias.
Embora ainda incipiente no mercado brasileiro, o chamado ativismo dos acionistas começa a mostrar sinais concretos de evolução. Para muitos dos que militam nessa área, porém, o ritmo ainda é inferior ao desejado.
Só nos segmentos especiais de governança da Bovespa, o número de companhias que possuem o conselho fiscal instalado aumentou em mais de 32% de 2008 para 2009. O total de órgãos ativos subiu de 71 para 94, considerando o total de 157 companhias listadas.
No Novo Mercado, espaço dedicado às empresas que conceitualmente adotam as melhores práticas de governança, o percentual de empresas que possui o colegiado passou de 28,3% para 46,5%.
A instalação do conselho fiscal está prevista na Lei das Sociedades por Ações. A função do órgão é acompanhar a confecção dos balancetes e a atividade dos administradores. A ampliação da adoção desse órgão reflete uma combinação de fatores, que vão desde evoluções no ambiente regulatório ao aumento do interesse e qualificação dos investidores brasileiros.
Para Jorge Lepeltier, conselheiro profissional há 16 anos, que elaborou o levantamento de dados, há também outras questões que estimularam o pedido de instalação de conselhos fiscais por parte dos acionistas minoritários.
Lepeltier destacou os últimos acontecimentos do mercado brasileiro, com o episódio dos derivativos em Sadia e Aracruz, e também o processo de convergência para o padrão internacional de contabilidade, o IFRS. Esse novo conjunto de princípios contábeis tornará os balanços mais subjetivos, ampliando a importância de uma grande atenção e cuidado com o tema. “Esse acompanhamento [do conselho fiscal] traz mais fidedignidade aos números.”
“Nesses 42 anos da minha vida profissional, esse é um momento ímpar. Tudo o que foi semeado começa a ser colhido agora “, disse Lepeltier, que antes de ser conselheiro profissional foi diretor do grupo Brasmotor e trabalhou na PricewaterhouseCoopers (PwC) por mais de dez anos. Segundo ele, também no segmento básico da bolsa houve alta significativa, mas não mensurada, nas companhias com conselho fiscal instalado.
Na Previ, fundo de pensão do Banco do Brasil e detentora da maior carteira de participações acionárias privada, o aumento do ativismo também foi notado, como concorrência. O diretor de participações da fundação, Joilson Ferreira, conta que a fundação participou de pelo menos 35 assembleias nesta temporada, nas quais tentou eleger representantes seja em conselhos de administração ou fiscal. “Tivemos sucesso na maioria das tentativas, mas em sete companhias não conseguimos porque já começaram a aparecer outros grupos com indicações próprias.”
Para Ferreira, isso é um claro sinal de que o ativismo e o interesse dos investidores está crescendo. Habitualmente, o fundo de pensão, que possui ações de centenas de companhias e uma tropa de mais de 130 conselheiros titulares, não encontrava concorrência de outros investidores para as vagas nos conselhos. Este ano, porém, foi diferente. “Um caso onde não tivemos sucesso foi Bicicletas Monark, no qual dois fundos estrangeiros elegeram um representante indicado por eles”, lembrou Ferreira.
A estratégia da gestora de recursos Polo Capital neste ano é peça importante desse cenário. De acordo com o sócio Marcos Duarte, a diretriz foi a de ir a todas as assembleias de companhias nas quais os fundos geridos investem e indicar representantes para os conselhos fiscais.
“Conversamos com outras gestoras de recursos que aplicam nas mesmas empresas e participamos de 23 encontros de acionistas. Conseguimos eleger 19 representantes”, afirma Duarte. “Nos casos em que não elegemos nosso indicado, mas outro grupo de minoritários elegeu, tudo bem, porque há algum representante independente. Isso só não ocorreu em uma empresa”, completa ele. O caso virou queixa na CVM.
Para o gestor, após os problemas que vieram à tona com a crise, os gestores e investidores do mundo todo estão sob certo escrutínio. “A CVM faz a parte dela punindo e nós temos que fazer a nossa, fiscalizando”, avalia Duarte. A Pólo, que tornou-se uma ativista conhecida após protagonizar embates nas primeiras tentativas de reorganização societária na então Telemar, já costumava participar de algumas assembleias, segundo Duarte. “Nós íamos naquelas em que tínhamos um investimento mais relevante, mas este ano a proposta foi acompanhar todas”, concluiu.