As taxas de juros caíram ontem no mercado futuro da BM&F como reflexo do declínio das expectativas de inflação. Uma das variáveis mais observadas pelo Banco Central para definir os rumos da política monetária são justamente as projeções de IPCA fornecidas por cerca de cem instituições financeiras ao Boletim Focus. E elas indicam que está tudo bem com a inflação. O Copom pode persistir no movimento de acentuado declínio da Selic como forma de atenuar o impacto nefasto da crise externa sobre a atividade econômica, a renda e o emprego. A estimativa de IPCA para o acumulado do ano recuou de 4,57% para 4,52%. E a projeção para os próximos 12 meses cedeu de 4,45% para 4,34%, já abaixo do centro da meta oficial de inflação, de 4,5%.
Além das expectativas mais baixas para o IPCA, o Focus diminuiu a projeção de juro básico para o final do ano. Ela caiu de 10,25% para 9,75%. O mercado monetário sofre um processo de alimentação recíproca, de duas mãos. Frequentemente, os tesoureiros e gestores que fecham negócios no mercado futuro de juros da BM&F agem para referendar as expectativas resultantes das análises feitas pelos departamentos econômicos das instituições. O inverso também acontece não raramente. Como o DI é bem mais dinâmico que o Focus, este costuma avalizar na teoria as operações fechadas na prática pelos players. Às vezes, um estimula o outro a persistir em um caminho, muitas vezes aprofundando-o. Muitas vezes, embora a perspectiva de Selic do Focus decline para acompanhar o CDI mais baixo, o pregão de juros futuros se sente encorajado pela chancela vinda dos economistas para magnificar o tamanho do corte. Foi o que aconteceu ontem. O CDI previsto para a virada do ano recuou 0,07 ponto, para 9,97%. A taxa para o vencimento que ocorre em janeiro de 2011 cedeu igualmente 0,07 ponto, a 10,35%. O swap de 360 dias também caiu, mas se manteve acima de 10%. Fechou a 10,02%, projetando juro real (acima do IPCA de 4,34% estimado para o mesmo período) de 5,44%.
Embora o BC observe mais as expectativas de inflação para definir a rota da política monetária, a inflação corrente ajuda a compor um clima propício ao recuo das taxas. Divulgado ontem, o IGP-10 de março acusou deflação de 0,31%, em uma guinada radical comparativamente à inflação de 0,54% vista um mês antes. Para os analistas, taxas de inflação muito baixas também no varejo não serão surpreendentes face ao declínio da atividade econômica. Apesar de a previsão de crescimento do PIB para este ano do boletim Focus ter cedido de 1,2% para 0,59%, ela já é tida como otimista diante das mais recentes projeções de pesada recessão formuladas sobretudo por instituições estrangeiras. Esses cenários catastróficas se colocam em oposição aos diagnósticos mais brandos e otimistas que começaram a ser elaborados para a economia americana.
Wall Street vem ignorando como coisa do passado os indicadores ruins sobre a economia americana e se concentrando na expectativa de recuperação dos bancos. O índice Dow Jones só fechou ontem em leve baixa de 0,10%, após alta matinal superior a 2%, para realizar os lucros de 9% obtidos na semana passada. Os operadores acreditam que o Federal Reserve (Fed), na impossibilidade de anunciar boas notícias sobre juro básico, já no piso histórico admissível, irá, ao final da sua reunião de política monetária de dois dias que começa hoje, baixar medidas que permitirão a retirada das carteiras dos títulos ruins que hoje as contaminam. Isso provocou uma diminuição no grau de aversão global a risco. A taxa do papel de 10 anos do Tesouro americano subiu de 2,8930% para 2,9519%.
O mercado passou por cima tanto da queda de 1,4% registrada em fevereiro pela produção industrial americana quanto dos indicadores de atividade manufatureira do Fed de Nova York. O índice de negócios Empire State caiu para -38,23 ante -34,65 de fevereiro. Quanto mais negativo for o indicador, pior será a retração da indústria.
Com o quadro externo mais ameno, os investidores desarmam as defesas anticrise erguidas no mercado de câmbio. Ontem o dólar fechou em desvalorização de 1%, cotado a R$ 2,2770. Desde o dia 2 – portanto, em apenas 10 pregões -, o dólar já caiu 6,76%, mais de seis meses de remuneração pela taxa Selic. Não é por outra razão que os hedge funds persistem desmontando suas posições “compradas” carregadas nos pregões de derivativos cambiais da BM&F. As apostas de alta do dólar recuaram de US$ 11,1 bilhões na quinta-feira para US$ 10,8 bilhões na sexta-feira. No dia 2 estavam em US$ 14,3 bilhões.