A escalada da inflação entrou de vez no radar do governo e já se configura num dos maiores riscos à campanha pela reeleição da presidente Dilma Rousseff. Entre os motivos de preocupação, o mais urgente é debelar o mau humor que se alastra no mercado financeiro. O risco, dizem interlocutores da equipe econômica, é de essas tensões contaminarem também as expectativas de consumidores e empresários, criando um movimento preventivo de remarcação nos preços, o que pode levar a mais inflação.
Nessa segunda-feira, a pesquisa Focus, do Banco Central, mostrou que os principais analistas de bancos e corretoras do país apostam que o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficará em 6,50% ao ano, exatamente no limite do teto da meta de inflação e bem acima do centro da meta (4,5%). Governistas, entretanto, esperavam que a projeção cedesse, mesmo que para um patamar ainda desconfortável, acima de 6%.
As apostas da equipe econômica eram que o efeito calendário ajudasse a debelar o mau humor do mercado. Na semana passada, quando foi divulgada pesquisa Focus que mostrou previsão de inflação em 6,51% em 2014, os analistas do mercado financeiro ainda repercutiam os números do IPCA de março. O que motivou as apostas para cima, dizem governistas, foi a variação de 0,92% no mês, a maior desde 2003.
O que o Planalto não contava era que o pessimismo permanecesse praticamente inalterado mesmo após o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgar que o IPCA-15 de abril, considerado a prévia da inflação oficial, desacelerou para 0,78% no mês, abaixo da previsão de 0,85% do mercado financeiro.
A avaliação de governistas era que o combustível para as expectativas de inflação ainda elevadas era justamente o comportamento dos indicadores passados, que mostraram, de fato, um custo de vida elevado. Nos últimos quatro anos, por exemplo, o IPCA nunca fechou dentro do centro da meta perseguida pelo governo, de 4,5% ao ano. Em três anos de governo Dilma, a menor carestia acumulada em 12 meses foi 4,92%, alcançada em junho de 2012. “É verdade que o passado não ajuda”, disse um governista, reiterando, no entanto, otimismo para o futuro. “Nós vimos que o IPCA-15 de abril veio menor do que se esperava. O mesmo deve acontecer com o IPCA cheio e com o IPCA-15 de maio”, assegurou.
É também o que espera o economista Wellington Ramos, da Austin Rating. “Nossas projeções apontam para desaceleração nos índices de curto prazo, principalmente pela menor pressão dos preços de alimentos e de alguns serviços, que têm perdido força com o menor crescimento da massa real de salários”, disse. “Mesmo assim”, completou o economista, “ainda teremos uma inflação elevada em 2014, acima de 6,1%, podendo até superar esse percentual”.
INCERTEZAS NO RADAR
Há quem aposte em números piores. A mediana das previsões das instituições que mais acertam suas projeções no boletim Focus aponta para uma alta da inflação de 6,59% em 2014 – acima, portanto, do teto da meta de 6,5%. Para um economista-chefe de um grande banco de investimentos, que pediu anonimato, o que contribui para esse pessimismo não é o passado, mas sobretudo o futuro. “A leitura do BC de que os índices de curto prazo estão vindo melhores não avaliza o otimismo para o restante do ano, porque há, ainda, muitas incertezas no radar”, disse.
Entre esses problemas, o economista elencou os prováveis reajustes na conta de luz e gasolina e uma retomada da escalada do dólar sobre o real. “Hoje, as cotações estão por volta de R$ 2,25, mas ninguém acredita que esse patamar deve se sustentar por muito tempo”, emendou. As projeções do boletim Focus mostram o dólar em R$ 2,45 até dezembro. Ontem, a moeda encerrou o dia cotada a R$ 2,225, queda de 0,78%.