O governo superestimou em 40% a redução nas despesas públicas com a alteração das regras de concessão de benefícios trabalhistas e previdenciários para 2015, segundo apurou o jornal O Estado de S. Paulo. Dos R$ 18 bilhões da economia prevista com as medidas, R$ 7 bilhões que viriam com as restrições ao pagamento do abono salarial devem ficar fora da conta neste ano.
O Ministério do Trabalho avisou a equipe econômica que pode haver uma batalha judicial se as novas exigências entrarem em vigor a partir do segundo semestre para o pagamento do abono salarial referente a um direito adquirido em 2014. O abono, cujo orçamento para este ano chega a R$ 20 bilhões, é um salário pago a quem ganhou até dois salários mínimos no ano anterior.
Com as negociações entre o governo e as centrais sindicais para aliviar as restrições colocadas no pagamento do seguro-desemprego e do abono salarial, a economia esperada com essas medidas pode ser menor, colocando em xeque o “Plano Levy” de ajuste das contas públicas.
Fontes da área econômica informam que o governo já sabia que a economia com as alterações nos benefícios sociais neste ano não chegaria a R$ 18 bilhões, ou 0,3% do Produto Interno Bruto (PIB), como anunciado em 30 de dezembro – embora as alterações tenham sido definidas ainda na gestão do ex-ministro Guido Mantega.
A equipe da presidente vendeu a reformulação nas regras como parte essencial para o cumprimento da meta de superávit primário, a economia para o pagamento dos juros da dívida, de 1,2% do PIB neste ano – ou R$ 66,3 bilhões.
O próprio ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tem usado esse número em conversas com investidores como trunfo para recuperar a confiança na economia brasileira. A equipe de Mantega era criticada por “maquiar” previsões econômicas, o que afetou a credibilidade da política fiscal.
Credibilidade
O impasse em torno do abono salarial é mantido em sigilo pela área técnica do governo por comprometer a credibilidade das medidas. Mesmo assim, o ministro do Trabalho, Manoel Dias, admitiu à reportagem que as regras só entrarão em vigor em 2016.
“O objetivo (da mudança nas regras do abono) é fazer com que se complemente o que foi acordado entre as centrais e o (ex-presidente) Lula. Mas isso só vai entrar em vigor no ano que vem”, disse Dias.
O ministro informou que o ex-presidente Lula firmou um pacto com as centrais sindicais de que adotaria a política de valorização do salário mínimo, mas, em contrapartida, mudaria as regras para a concessão do abono. “A razão pela qual o abono salarial foi criado ia se perder. Foi discutido, foi discutido, mas nunca chegou a ser modificado”, disse Dias.
Na área técnica do governo há uma discussão sobre a legalidade de mudar as regras de um benefício relacionado ao tempo de trabalho de 2014. Pelas regras antigas, era necessário trabalhar apenas um mês com carteira assinada no ano anterior para ter direito ao abono. Pelas novas regras, o tempo mínimo de trabalho passa a seis meses. Como o pagamento, que começa em julho está atrelado ao tempo de trabalho em 2014, o ministério teme que quem trabalhou até cinco meses no ano passado recorra à Justiça do Trabalho para receber o benefício.
Além disso, o calendário de pagamento do abono salarial é definido pelo Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), que reúne centrais sindicais, patrões e governo. “Em 2015, será pago o direito adquirido em 2014, com as regras de 2014”, sustenta o presidente do Codefat, Quintino Severo, representante da Central Única dos Trabalhadores (CUT).
Outra mudança no abono que também só deve ser colocada em prática em 2016 é o pagamento proporcional ao tempo trabalhado no ano-base, da mesma forma que o 13º salário.
Pela regra antiga, quem trabalhasse um mês teria direito ao salário mínimo integral. Na nova configuração, o salário mínimo será dividido por 12 e pago de acordo com a quantidade de meses trabalhados no ano anterior.