O governo vai fazer uma última tentativa para concluir o que começou, retomando as negociações em torno de um pacote de medidas de impacto fiscal que estão praticamente paradas no Congresso. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, pediu a seus assessores que trabalhassem nessa agenda para que ele possa decidir, tão logo retorne das férias na próxima semana, o que será possível levar adiante para que seja negociado e aprovado pelo Legislativo até o fim deste ano.
Isso inclui medidas que já estão em tramitação, como a criação do fundo de previdência complementar do servidor público, assim como propostas que ainda serão enviadas, como a de desoneração parcial da folha de pagamento das empresas e a política de exploração do petróleo na camada do pré-sal. Tarefa importante, também, será derrubar alguns projetos que estão em estágio avançado de tramitação, como o que acaba com o fator previdenciário. Em 2010, ano da sucessão presidencial, não haverá clima para decisões importantes. Para aprovação ou remoção de projetos no Legislativo, portanto, o governo Lula termina em dezembro, assinalou uma alta fonte oficial.
A área econômica acredita que ainda há tempo para tocar essa “agenda pós-crise”, conforme a fonte, e prepara uma lista de iniciativas que podem melhorar a percepção da sustentabilidade da política fiscal para o fim deste governo e o início do próximo.
Desse rol constam a aprovação do projeto de lei que limita a expansão da folha de salários do setor público à variação do IPCA mais 1,5% de aumento ao ano, até 2016, que está na gaveta do Legislativo desde 2007, e a criação do fundo de previdência complementar do setor público, conforme proposta enviada pelo governo em setembro de 2007, que está parada na Comissão de Trabalho da Câmara. Sem a aprovação e regulamentação do fundo de pensão do funcionalismo público, a reforma da previdência votada em 2003 não entra em vigor. Todos os concursados contratados até hoje entraram na administração pública com garantia de aposentadoria integral. O princípio da reforma de 2003 era equalizar o tratamento do setor público ao dos trabalhadores do setor privado.
O projeto de lei que estabelece a política de reajuste do salário mínimo, que está no Congresso há dois anos, também está na lista de prioridades, mas é um caso bem mais delicado que o governo pretende desmontar. A proposta do executivo é que o salário mínimo seja corrigido pelo INPC e tenha ainda um aumento real de acordo com a variação do PIB do ano anterior. O projeto aprovado pelo Senado, porém, incorporou a emenda do senador Paulo Paim (PT-RS), que estende a regra de reajuste do mínimo para todos os benefícios pagos pela Previdência Social. Na Câmara, por um cochilo do governo, o projeto de lei com a emenda já passou pelo crivo de uma Comissão Especial e encontra-se, hoje, pronto para ser votado em plenário.
Além desse projeto de lei, outras duas propostas de Paim aterrorizam os técnicos da área econômica e precisam ser bem negociados para não adicionar mais um rombo de grandes proporções nas contas da seguridade social: a extinção do fator previdenciário, que é um redutor aplicado nas concessões de novas aposentadorias desde dezembro 1999, para desincentivar as aposentadorias precoces, e a recuperação do valor, em número de salários mínimos, das aposentadorias e pensões do INSS. Isso significa que quem recebia três mínimos no momento da concessão da aposentadoria e foi perdendo poder de compra com os reajustes dos benefícios pelo INPC, volta a receber o equivalente a três salários.
Parte da estratégia do governo para derrubar essas ideias no Congresso foi adiantada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nesta semana, quando ele informou que já está negociando com as centrais sindicais a concessão, em janeiro de 2010, de um aumento real para os aposentados e pensionistas que ganham acima de um salário mínimo. Outra questão que pode entrar como uma compensação é a proposta, que deverá estar pronta até o fim do mês, de desoneração da folha de pagamento das empresas. Para limpar essa agenda o governo está disposto a negociar também a fórmula de reajuste do salário mínimo, assim como aceita aumentar a possibilidade de crescimento da folha salarial da União.
A lista não se esgota aí. O ministro da Fazenda, depois de negociar com os exportadores a questão do crédito-prêmio do IPI, se posicionou contra a emenda ao projeto de conversão da Medida Provisória 460, aprovada por unanimidade, no Senado, que reconhece a vigência do benefício até 2002. O governo, agora, quer derrubar a emenda na Câmara e espera que o julgamento do caso no Supremo Tribunal Federal (STF) comece em agosto.
O STF ainda não se pronunciou sobre o mérito da demanda das empresas. O único precedente nesse caso é um voto proferido pelo ministro Gilmar Mendes, no qual ele entende que o incentivo foi extinto em 1983, como advoga o governo.
Também nesse caso, a Fazenda está disposta a abrir uma negociação com as empresas mesmo se o Supremo der a vitória ao governo, caso fique claro que o setor exportador será muito prejudicado com a decisão.
O projeto que muda a tributação da caderneta de poupança pode nem ser enviado este ano ao Congresso. Isso ainda vai ser decidido, mas a avaliação mais recente é que se o Copom interromper a queda dos juros em 8,75% ao ano, não haverá necessidade de mexer nos rendimentos da poupança para evitar uma fuga dos fundos de investimento. Reduzindo as taxas de administração para a casa de 1%, os fundos ainda teriam competitividade com os juros nesse patamar.
A disposição para fazer uma varredura no Congresso e aprovar propostas relevantes, que possam dar um horizonte mais nítido para a política fiscal, se for real, pode encontrar enormes obstáculos. Não está claro para os técnicos que estão preparando essa ofensiva se há clima para votações em meio à crise do Senado. Sem uma solução para avalanche de denúncias contra o presidente do Senado, dificilmente o Legislativo terá condições de decidir assuntos graves que vão exigir amplas negociações entre os partidos.