A discussão, no governo, sobre uma nova fórmula de remuneração da caderneta de poupança, só tomou ritmo na semana passada, mas algumas opções já estão colocadas sobre a mesa. Se a opção for pela desindexação da variação da Taxa Referencial (TR) e dos juros fixos de 6,17% ao ano, a poupança deverá ser remunerada por um percentual da taxa básica de juros, a Selic. A intenção da área econômica do governo é manter o incentivo da isenção do Imposto de Renda sobre os rendimentos da caderneta. Ainda não se sabe se a rentabilidade será dada por um percentual fixo da Selic ou se por uma banda de juros, por exemplo, algo entre 65% e 75% da Selic.
Não faz parte dos planos extinguir a TR. Essa taxa, criada em 1991 em substituição ao Bônus do Tesouro Nacional (BTN), então extintos, não pode ser eliminada porque corrige os depósitos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), as prestações dos financiamentos da casa própria e alguns títulos da dívida pública.
No caso dos financiamentos imobiliários, a proposta dos técnicos que estudam o tema é permitir que o mutuário possa escolher entre fazer seu contrato com base na TR mais um spread ou um percentual da Selic mais um spread.
Qualquer que seja a nova regra de rentabilidade da poupança, ela só valerá após 30 dias, no aniversário da aplicação.
O que se pretende é, por projeto de lei, medida provisória ou iniciativa de algum senador em regime de urgência urgentíssima, retirar a TR e os juros fixos da poupança, para que ela seja remunerada em linha com os demais fundos de investimento, de forma que não haja um incentivo à migração dos investidores para as cadernetas. Como os juros de mercado já se situam na casa dos 5% ao ano, conforme a taxa de administração que o banco cobra do seu cliente para gerir o fundo, o aplicador já pode estar perdendo para a poupança.
O problema será maior na próxima reunião do Copom, quando se espera uma nova queda dos juros básicos, hoje em 11,25% ao ano. Se nada for feito para mudar a indexação da poupança, segundo técnicos qualificados do governo, o Copom terá enormes dificuldades para cortar a Selic sem que isso cause transtornos para o sistema financeiro – cuja receita com a administração de fundos é imensa – e para a própria administração da dívida pública.
O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, discutiram com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na terça-feira, no intervalo entre as duas reuniões do Copom, o fato de a indexação da poupança ser, agora, um forte limitador para queda dos juros.
A decisão sobre o corte de 1,5 ponto percentual na taxa Selic, e não 2 pontos percentuais, como se chegou a cogitar, decorreu, em parte, dessa limitação.
Meirelles esteve com o grupo de senadores da comissão que acompanha a crise global, na manhã de quinta-feira, e abordou esse problema. O governo vai precisar de apoio político para tramitar sua proposta no Congresso. A maioria dos parlamentares deverá se opor a uma mudança radical na remuneração da poupança, pelos seus impactos políticos sobre milhares de pequenos poupadores.
Exemplo da reação política pode ser dado pelo comentário que o senador Francisco Dornelles (PP-RJ), presidente da comissão, fez ao Valor. Ele disse ser “contrário a toda e qualquer mudança” nas regras de remuneração da caderneta de poupança, por ser esta “uma regra consolidada”.
Entre os petistas, o assunto também é tratado com muito cuidado. O líder do partido no Senado, senador Aloisio Mercadante (SP), indica que, pelo menos do PT o presidente Lula teria chance de obter apoio a um eventual projeto de mudança. Ele admitiu que o aumento da atratividade da poupança frente a outras aplicações financeiras será um problema para eventuais novas reduções da Taxa Selic, tomada como referência pelos bancos para remunerar outras aplicações, como os CDBs. E uma migração expressiva de outros investimentos para a caderneta seria problemática, segundo Mercadante, principalmente pelo direcionamento desses recursos pelos bancos, que são obrigados a aplicar no mínimo 70% dos depósitos em financiamento imobiliário. Uma alternativa, disse, pode ser a redução do próprio direcionamento.