O esvaziamento da proposta do ministro da Saúde, Arthur Chioro, em defesa de uma nova contribuição sobre movimentações financeiras, e das críticas ao ajuste fiscal no congresso do Partido dos Trabalhadores (PT) fortalece a posição do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e confere maior unidade à ação do governo na área econômica. A identificação de novas fontes de financiamento para o orçamento da saúde continua, no entanto, como uma pauta recorrente no governo e no seu partido.
A nota oficial do Ministério da Saúde, que marcou o recuo das declarações de Chioro, foi acompanhada pela retirada da menção à defesa do retorno da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) no documento final do congresso petista. Mais do que isso, os integrantes do partido tiveram que digerir, em nome da preservação dos interesses do governo de Dilma Rousseff, a ausência de críticas formais ao processo de ajuste fiscal conduzido pela equipe econômica.
A introdução da proposta de retorno da CPMF acarretaria dificuldades adicionais junto ao Congresso Nacional e aos agentes econômicos, que resistem ao aumento da carga tributária. Ainda mais se isso acontecesse com a tentativa de ressuscitar uma contribuição marcada pela polêmica e questionada pelo seu amplo impacto na economia. Com as medidas propostas para o ajuste fiscal ainda em processo de votação no Legislativo, uma agenda como essa atravessaria as difíceis negociações que restam no Congresso.
Mas a iniciativa da Chioro, que chegou a dar conta de suas conversas com a maioria dos governadores para buscar alternativas ao financiamento da área de saúde, não ocorreu de forma aleatória. Em meados do último mês de abril, o ministro participou da audiência em que Dilma Rousseff recebeu, pela primeira vez, os integrantes do Conselho Nacional de Saúde (CNS), que conta com extensa representação de todos os estados brasileiros. No encontro, a presidente afirmou, segundo relato dos participantes, que seria necessário encontrar novos caminhos para custear a área da saúde.
A partir da reunião do CNS, de acordo com fontes consultadas, Chioro articulou contatos com representantes dos governos estaduais para discutir a viabilidade de adoção de um novo modelo de contribuição sobre a movimentação financeira. A intenção de limitar a cobrança aos valores de maior expressão, preservando a classe média do impacto do novo tributo, foi destacada pelo ministro da Saúde na entrevista que concedeu na última sexta-feira. A viabilidade técnica desse modelo permanece como uma incógnita.
Na conversa com o apresentador Jô Soares, ainda na sexta-feira, a presidente também tocou nesse ponto, ao afirmar que a saúde “precisa de dinheiro”, sem detalhar, no entanto, o que poderia ser feito para viabilizar um maior volume de recursos para a área. Na mesma entrevista, ela frisou que a votação no Congresso responsável pelo fim da validade da CPMF, em 2007, retirou da saúde cerca de R$ 40 bilhões por ano. E sugeriu que fossem contabilizadas as perdas para a área da saúde ao longo dos anos em que o tributo deixou de ser cobrado.
Os contatos desencadeados por Chioro encontram respaldo nessa visão e na tentativa de repetir a bem-sucedida experiência do ex-ministro da Saúde Adib Jatene, no período do governo de Fernando Henrique Cardoso, nos anos 1990. Naquela época, foram os apelos de Jatene pela necessidade de garantir recursos suficientes para a saúde que quebraram a resistência à criação do novo tributo. Ou seja, ao invés de se vincular o aumento da carga tributária apenas aos números do ajuste fiscal, busca-se utilizar a destinação para a área de saúde como um discurso eficaz de convencimento.
De qualquer maneira, a reação pública do ministro da Fazenda às declarações de Chioro e o esforço do Palácio do Planalto para alinhar o congresso do PT às diretrizes da política econômica oficial mostram que o governo não quer correr o risco de comprometer as chances de sucesso do ajuste fiscal. Para isso, é fundamental que Joaquim Levy não perca as rédeas da gestão econômica com uma iniciativa paralela às medidas que desenhou no pacote de corte de gastos e aumento de receita. A rapidez com que foram esvaziadas as declarações do ministro da Saúde foi um sinal concreto nessa direção.