A reunião do G-20 surpreendeu o mercado. O encontro não só neutralizou o ceticismo dos que apostavam no fracasso como mostrou ser possível uma coordenação eficaz em torno de propostas concretas. A reação dos mercados foi de euforia. A aversão global ao risco diminuiu, os investidores desmancharam defesas erguidas com o dólar e compraram ações e bônus mundo afora. O petróleo disparou 8,78% em Nova York, para US$ 52,64. Os pregões brasileiros acompanharam. O dólar, em sua terceira queda consecutiva, recuou 1,97%, a R$ 2,2350. E os juros subiram no mercado futuro da BM&F.
Ao menor sinal de descolamento da crise do fundo do poço, os players do mercado futuro de juros passam a agir como se o Banco Central fosse reduzir a velocidade de corte da taxa Selic. Dado o histórico de conservadorismo do BC, o raciocínio do DI não é gratuito. Os analistas dizem que, se o mundo conseguir espantar a recessão, a demanda interna pode autorizar o repasse aos preços da valorização sofrida pelo dólar nos últimos meses. Esse ainda é o principal temor do BC, e não importa muito o quão distante o produto real esteja do produto potencial. Se bem que, se a crise perde gravidade, deveria atenuar-se o medo do pass through cambial, uma vez que a rota do dólar passa a ser declinante e os investidores estrangeiros assumem posições “vendidas”. O Copom poderia segurar as rédeas monetárias se pressentisse ameaças à inflação de 2010, um ano de eleições presidenciais para o qual torna-se essencial um IPCA dentro da meta. Por enquanto, as projeções estão entre 3,5% e 4,2%.
No pregão de DI futuro, enquanto a estimativa de taxa para o fim do ano avançou de 9,70% para 9,79%, o contrato longo típico, para janeiro de 2012, evoluiu de 10,70% para 10,81%. O swap de 360 dias subiu de 9,77% para 9,89%. Estas altas não aconteceriam se o pregão se ativesse aos fatores correntes. No entender do economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, a forte desaceleração da atividade em conjunto com expectativas de inflação cada vez mais baixas, tanto do mercado quanto do BC, abrem espaço para um Copom novamente flexível em sua reunião de abril. Isto significa que ele teria espaço para diminuir a Selic em mais 1,5 ponto, para 9,75%. “Ainda não está claro se ele fará esse movimento, mas aumentam as chances”, diz Vale.
Não se deve esperar, contudo, por um aprofundamento radical da política de flexibilização monetária. Sergio Vale lembra que recentemente diretor do BC pediu calma na euforia vigente no mercado com a queda da Selic. Por isso, na sua visão, não se pode apostar em baixas acentuadas da taxa nos próximos meses. Um patamar de 8% poderia ser o limite extremo do ciclo de queda e mesmo assim temporariamente. “Não à toa os modelos do BC infelizmente já apontam para inflação acima de 5% em 2011, o que pode ser um balde de água fria em quem esperava que teríamos taxas baixas permanentemente agora”, diz Vale. “Ainda é muito cedo para se comemorar o fim dos juros altos no Brasil”, recomenda.
Para que os juros caiam de forma duradoura e consistente será preciso remover certos entraves. Um deles é a indexação do IPCA à inflação passada. “Ter cerca de 30% dos preços no IPCA atrelados à inflação passada, além do hábito nada eficiente em alguns serviços de olhar o passado para reajustar seus preços, traz inércia para a inflação”, diz Vale. Isso pode implicar em que, talvez apenas por choques positivos, se consiga manter a inflação abaixo de 4%, como foi nas épocas de câmbio apreciado e como pode ser agora por conta da forte retração de atividade. Depender de choques positivos para trazer a inflação para baixo não é a melhor das políticas. “Algum tipo de desindexação mais geral, que comece por restringir possíveis indexações a apenas um índice de inflação, como o IPCA, já poderiam trazer mais coordenação de expectativas para os agentes, como passo intermediário para impor a total livre negociação entre os agentes”, defende o economista da MB.
Além da reunião do G-20, os mercados americanos se alegraram com duas outras notícias. A primeira já era esperada, mas isso não diminuiu o seu impacto. O Conselho de Padrões de Contabilidade Financeira (FASB, em inglês) dos EUA flexibilizou as regras de marcação a mercado de ativos. O objetivo é facilitar a definição do valor justo desses papéis. Mas os balanços dos bancos perderão em transparência. A segunda veio do Departamento de Comércio dos EUA. Ele informou que o volume de pedidos à indústria cresceu 1,8% em fevereiro, depois de seis meses de retração. O dado surpreendeu duplamente, no sentido e no tamanho, já que os analistas previam queda de 1,1%.