Finalmente, após cinco quedas homeopáticas semanais consecutivas, a projeção de Selic para a próxima reunião do Copom das cem instituições pesquisadas pelo Boletim Focus recuou a 11,75%. Incorpora e oficializa, desta forma, o consenso dos analistas de que a Copom irá no seu encontro de 11 de março insistir no ritmo de corte de um ponto com o qual iniciou, em janeiro, o ciclo de afrouxamento monetário. O compasso de revisão para baixo das expectativas de juro básico do Focus – uma das peças fundamentais do regime de metas de inflação – costuma ser até mais lentamente conservador do que as reações da política monetária.
O mercado futuro de juros da BM&F, cujas projeções já precificam há tempos o consenso de Selic a 11,75%, não ousou dar um passo além do Focus em face da baixa liquidez. O feriado americano do Dia do Presidente reduziu drasticamente o volume de negócios tanto no DI futuro quanto no mercado de câmbio. O movimento do primeiro foi de apenas 243 mil contratos, 70% menor que o giro de sexta-feira. A estimativa de CDI para o fim do ano caiu de 11,03% para 11,01%. No segundo, o volume de negócios tombou quase 90%, para US$ 520 milhões.
A expectativa de Selic para fim do ano do Boletim Focus caiu de 10,75% para 10,50%, alinhando-se à projeção das mais respeitáveis consultorias do país, entre as quais a AC Pastore & Associados. Ela prevê um ciclo completo de desaperto monetário de 3,25 pontos percentuais. O ciclo atual de afrouxamento, observa a consultoria do ex-presidente do BC, Affonso Celso Pastore, tem uma peculiaridade: \”É um ciclo de forte afrouxamento monetário que, contrariamente aos episódios ocorridos no passado, se inicia com as taxas de juros reais mais baixas ocorridas em toda a história do regime de metas de inflação no Brasil\”. Considerando a nova projeção de IPCA para os próximos 12 meses do Focus, de 4,63% (estava em 4,69% na semana anterior) e a taxa de ontem do swap de 360 dias – que recuou de 11,05% para 11% – o juro real ex-ante está em 6,09%, ainda bem perto do recorde de baixa de 6,02% definido no último dia 6.
Esta é a primeira vez em que se assiste, segundo Pastore, a um choque externo que contrai a demanda agregada. Esta continuará deprimida durante todo o ano. O BC pode derrubar o juro continuamente e sem remorso. E ao governo como um todo resta fazer uma política contracíclica que minore os efeitos da crise vinda de fora. O BC atua para compensar as ações pró-cíclicas do sistema. A pesada desaceleração do crescimento e o aumento do desemprego provocam inadimplências de empresas e consumidores. A reação dos bancos é classicamente pró-cíclica: contraem o crédito e elevam os spreads bancários.
Para neutralizar isso, o BC corta o juro básico, libera liquidez do compulsória, amplia a oferta de crédito à exportação e ajuda empresas a rolar dívida externa. E tenta reduzir o spread bancário nem que seja no grito. \”A liberação do compulsório e a queda da taxa Selic geram forças contrárias, minimizando a contração do crédito e o aumento do custo dos empréstimos\”, diz Pastore.
Apesar de o Focus gradualmente assumir a gravidade da crise, há ainda algumas contradições entre as suas estimativas. Embora a expectativa de IPCA acumulado para este ano tenha recuado na pesquisa divulgada ontem de 4,73% para 4,69%, ainda está exageradamente elevada para uma economia que deve crescer muito pouco em 2009. A estimativa de alta do PIB caiu de 1,7% para 1,5%, mas ainda se situa na corrente otimista do mercado. \”Uma economia que vinha rodando à velocidade de 5,5% e foi obrigado a frear para 1,5% certamente deve provocar naturalmente uma contração mais do que proporcional nas projeções inflacionárias\”, observa o diretor da NGO Câmbio, Sidnei Nehme. Uma expansão de produto de 1,5% provocaria não só inflação perto da meta de 4,5% como exigiria um remédio mais radical para 2010 sob a forma de uma Selic abaixo de 10,50% em dezembro. Como a política monetária leva até nove meses para surtir efeito, o BC não pode diminuir o passo monetário porque logo a decisão do Copom só produzirá efeito no ano que vem.
A escassa liquidez registrada ontem no mercado cambial por causa do feriado nos EUA distorceu a formação de preços. O dólar passou o dia quase sem se mexer, e só empreendeu uma rota de alta nos quinze minutos finais. E fechou com avanço de 0,66%, cotado a R$ 2,2790. O principal mercado formador do preço à vista – o pregão de dólar futuro da BM&F – também foi afetado pela ausência dos investidores americanos. O giro mal superou os US$ 2,5 bilhões, quando costuma bater em US$ 15 bilhões.