Por adotar condutas constrangedoras, como restringir a ida dos funcionários ao sanitário a duas ou três vezes ao dia – e em algumas ocasiões apenas com autorização do superior hierárquico – a empresa de Calçados Hispana Ltda. (sucessora da Calçados Azaléia, ora integrante do Grupo Vulcabrás) foi condenada pela Justiça do Trabalho a pagar reparação por danos morais a um grupo de trabalhadores que moveu ação por assédio moral.
A 7ª Turma do TST rejeitou recurso de revista da empresa ao concluir pela “incompatibilidade das medidas com os direitos da personalidade, protegidos pela Constituição (artigo 5º, inciso X)”.
Para o ministro Ives Gandra Martins Filho, relator do processo, no TST, a decisão do TRT da 20ª Região (SE) foi acertada, uma vez que a Constituição considera invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, e assegura o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.
A ação foi movida um grupo de funcionários residentes em Aracaju (SE). Eles trabalhavam na linha de produção de calçados e informaram que, durante o contrato de trabalho, vivenciaram situações de constrangimento. As idas ao sanitário eram limitadas e, quando o superior hierárquico se encontrava presente, deveria consentir a saída.
As idas ao banheiro eram controladas pela substituição dos crachás: quando o funcionário ia ao sanitário, deixava o seu pendurado em vassouras e colocava um especial. Segundo o relato, aconteceu de haver chefes que cronometravam essas idas, e, se ultrapassassem os cinco minutos, iam buscar os funcionários. Havia somente um crachá para cada setor, de modo que somente um empregado podia parar a produção para usar o banheiro.
A situação chegou a tal ponto, que eles ingeriam pouco líquido para não ter que ir ao banheiro. Ao mesmo tempo, havia também controle de saída para beber água.
O trabalho dos empregados muitas vezes era cronometrado: um supervisor, com o cronômetro na mão, se posicionava na frente do empregado cuja produção não fosse considerada satisfatória e contava seu tempo. Caso as metas não fossem atingidas, eles eram chamados em mesa redonda, onde eram repreendidos, segundo eles, na frente de todos, com palavrões, xingamentos e ameaças de perda do emprego. Muitos funcionários, em razão das pressões e falta de ergonomia no ambiente de trabalho, desenvolveram doenças ocupacionais e problemas psicológicos.
Tais fatos foram anteriormente objeto de ação civil pública movida pelo Ministério Público do Trabalho, na qual a empresa foi condenada por danos morais no valor de 240 mil reais, cabendo a cada funcionário o valor de 20 mil reais, mais 300 mil reais, a ser revertido ao Fundo de Amparo ao Trabalhador, por danos morais coletivos. A empresa foi condenada ainda a abster-se de adotar no ambiente de trabalho qualquer prática de constrangimento, coação e humilhação aos empregados.
Na ação movida pelo grupo de trabalhadores, a empresa foi novamente condenada. A condenação foi mantida pelo TRT-SE, que concluiu existirem provas suficientes para evidenciar o assédio moral e o terror psicológico vivenciados pelos funcionários, porque dependiam do emprego para o sustento de suas famílias.
O advogado Jerônimo Basílio São Mateus atua em nome dos reclamantes.