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18 de abril de 2024O mesmo movimento é observado por José Compagno, sócio-líder da área de investigação e fraude da EY no Brasil e América do Sul. “Nos últimos três, quatro anos houve um boom. É um mercado absolutamente quente”, comenta.
Leonardo Lopes, sócio da PWC que atua na área de Forensics, também relata um grande crescimento na demanda no último ano, tanto em função da Lava Jato como em consequência da entrada em vigor da Lei Anticorrupção. “Tem aumentado muito a procura de serviços de consultoria para implementar os controles necessários para as empresas estarem em compliance com a nova lei, além de mapeamentos de riscos de corrupção, testes internos de controle”, conta.
Em alguns aspectos, esse tipo de trabalho se assemelha ao de um detetive, com investigações sobre movimentações financeiras, varredura de dados em computadores e celulares, cruzamento de informações e até mesmo entrevistas presenciais que se assemelham a interrogatórios. No exterior, a FTI, por exemplo, conta em seus quadros com ex-agentes da CIA, FBI, Departamento de Justiça dos EUA e da SEC, a comissão de valores mobiliários norte-americana, além de especialistas contábeis, tecnológicos, juristas e mesmo dois prêmios Nobel de economia.
Os principais clientes são grandes companhias de capital aberto, multinacionais (que geralmente estão sujeitas às leis mais rígidas dos EUA) e escritórios de advocacia, que contatam essas consultorias para ajudar nos seus casos. Porém, como no Brasil empresas com faturamento bruto anual acima de R$ 300 milhões também precisam ter seus resultados auditados, mesmo companhias com estrutura familiar estão começando a recorrer cada vez mais a esse tipo de investigação.
Obviamente essas consultorias têm acordos de confidencialidade com seus clientes, mas Cynthia, da FTI, revela que a companhia trabalha com alguns envolvidos na Lava Jato. No caso da OAS, por exemplo, a consultoria foi contratada na verdade pelos credores da empreiteira e ajudou no projeto de reestruturação financeira.
“Nós estamos com um cliente agora que está sendo investigado pela Polícia Federal (em outra operação que não a Lava Jato) e outro dia os policiais foram à sede da empresa e levaram computadores, HDs externos, celulares. A matriz dessa multinacional nos contratou, até porque precisava saber o que a PF tinha levado, pois muitas vezes a própria empresa não tem o controle de toda a comunicação que passa pelos seus servidores”, conta Cynthia.
Na EY, Compagno revela que a área forense representa atualmente entre 5% e 7% da receita da empresa no Brasil, sendo que a divisão foi criada há cerca de dez anos. Ele explica que, mesmo com as novas legislações, a Lava Jato teve um papel essencial. “Sempre é preciso existir duas coisas: a lei e o chamado enforcement, ou seja, uma estrutura que faça com que a lei seja cumprida. A Lava Jato veio como um sinal muito forte de que vai haver esse enforcement”, afirma.
A relação com as autoridades geralmente é pacífica, até porque esse tipo de consultoria atua estritamente dentro dos limites da lei, ou seja, não tem poder de quebrar sigilo bancário de ninguém, por exemplo, obtendo apenas informações disponíveis de forma lícita e rastreando a rota do dinheiro só até o momento em que ele sai da empresa analisada.
Como muitas vezes essas consultorias são contratadas pelos escritórios de advocacia, estão protegidas pela confidencialidade advogado-cliente e não são obrigadas a repassar para as autoridades todas as informações obtidas. Mesmo assim, com a nova lei de lavagem de dinheiro determinadas irregularidades precisam ser reportadas ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).
Cynthia, da FTI, começou a atuar nessa área após ingressar na divisão de Integridade Institucional do Banco Mundial, onde investigava grandes casos de corrupção em projetos financiados pela instituição no mundo inteiro. “Às vezes a gente enfrenta certa resistência dos gestores das empresas, mas sempre conseguimos coletar um grande volume de informação. Se alguém sabe que vai ser investigado e um dia antes de entregar o computador deleta mil e-mails, minha investigação vai começar justamente por aí”, aponta.
A especialista da FTI comenta que a legislação brasileira avançou bastante nos últimos anos e que se a nova lei de lavagem de dinheiro já estivesse em vigor na época do Mensalão, muitos dos réus teriam sido condenados por esse crime. A lei anticorrupção também é um marco e pela primeira vez vai permitir responsabilizar também a pessoa jurídica, que pode ser multada em até 20% do faturamento bruto.
Nos EUA, a Lei de Práticas Corruptas no Exterior (FCPA, na sigla em inglês) foi aprovada em 1977, em meio à Guerra Fria e na esteira do escândalo de Watergate, que terminou com a renúncia do presidente Richard Nixon. Cynthia traça um paralelo entre esse caso e a Lava Jato. “Apesar do impacto negativo de confiança no governo, acredito que, bem geridos, escândalos como o Petrolão podem causar grandes e positivas transformações de ramificação internacional”.
Apesar de ter quase 40 anos, a legislação anticorrupção nos EUA só começou a ser aplicada com mais rigor nos últimos dez anos, possivelmente impulsionada pelas repercussões da crise do subprime. Atualmente, no sistema jurídico norte-americano existe uma cultura muito forte de acordos, por meio dos quais as empresas pagam uma multa, sem necessariamente admitir qualquer irregularidade, e o processo é encerrado. “O governo norte-americano é temido pelas multinacionais. Elas não questionam, elas não vão até o fim do processo. Só um ou dois casos foram julgados até hoje”, comenta Cynthia.