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18 de abril de 2024Um dos vários conflitos de competência entre ICMS e ISS recai sobre a publicidade e a propaganda veiculadas na internet. De um lado, os Estados pretendem sustentar que se trata de serviço de comunicação sujeito à incidência do ICMS. De outro, os Municípios buscam atrair para si a competência da tributação, ao argumento de que se trata de serviço específico, sobretudo após a edição da Lei Complementar nº 157/2016, e que não se confunde com o estrito conceito de serviço de comunicação.
A controvérsia retoma questão anterior, fundada no fato de que, quando editada a Lei Complementar nº 116/2003, foi vetado o subitem 17.07 da Lista Anexa, o qual previa expressamente a incidência do ISS sobre a veiculação e a divulgação de materiais de propaganda por qualquer meio. Em suma, o veto se fundou na necessidade de se respeitar a imunidade dos livros, jornais e periódicos — ou seja, a veiculação não poderia ocorrer por qualquer meio —, e no fato de que os serviços extrapolariam a competência territorial de apenas um município. Na oportunidade, foi mantido o subitem 17.06, que dispõe especificamente sobre os serviços criativos de publicidade.
Desde então e após anos de disputas entre Estados e Municípios pelo alcance dessa materialidade potencialmente tributável, somente com a LC nº 157/2016 o serviço foi incluído na Lista Anexa à LC nº 116/2003, no subitem 17.25 (Inserção de textos, desenhos e outros materiais de propaganda e publicidade, em qualquer meio – exceto em livros, jornais, periódicos e nas modalidades de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita).
A constitucionalidade desse dispositivo foi submetida ao crivo do STF na ADI nº 6.034 que, recentemente e por unanimidade, julgou improcedente o pedido do Estado autor, declarando a constitucionalidade da incidência do ISS sobre os mencionados serviços.
A referida Ação Direta de Inconstitucionalidade foi ajuizada pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro, sob alegação da inexistência de contratos autônomos de inserção de publicidade. Para o Estado autor da ação, a inserção e a veiculação são faces da mesma moeda, de modo que aquela sempre estaria acompanhada da obrigação do contratado de transmitir a mensagem ao público destinatário, o que evidencia verdadeira suposição. Dessa forma, e tendo em vista o caráter residual do ISS, defendeu a inconstitucionalidade do subitem 17.25, por invadir a competência estadual para tributar serviços de comunicação.
O acórdão ainda pende de publicação, mas a decisão de julgamento revela a adoção unânime da seguinte tese: \”é constitucional o subitem 17.25 da lista anexa à LC nº 116/03, incluído pela LC nº 157/16, no que propicia a incidência do ISS, afastando a do ICMS, sobre a prestação de serviço de inserção de textos, desenhos e outros materiais de propaganda e publicidade em qualquer meio (exceto em livros, jornais, periódicos e nas modalidades de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita)\”.
O ministro relator Dias Toffoli iniciou seu voto lembrando que o STF tem superado já há alguns anos a clássica dicotomia civilista entre a obrigação de dar e aquela de fazer para determinar qual serviço está sujeito à incidência do ISS. Essa evolução jurisprudencial tomou por base a própria evolução e complexidade das relações modernas que passaram a ser estabelecidas, citando como exemplo, entre outros, os famosos casos do leasing financeiro e dos planos de saúde.
Em seguida, adotou o critério objetivo de resolução de conflitos entre ICMS e ISS, o qual se baseia em verificar se o serviço está previsto em lei complementar que define os serviços tributáveis, ainda que envolva o fornecimento de mercadorias. De acordo com o ministro, embora o caso não trate de mercadorias, mas sim de ICMS sobre serviços, aplica-se o mesmo raciocínio.
O critério objetivo busca prestigiar o artigo 146, I, da CRFB/88, que delegou à lei complementar a função de dirimir conflitos de competência, e deve ser afastado somente se a lei definir \”como serviço atividade que, ontologicamente, não o é ou em que envolva fornecimento de mercadorias de vulto significativo e com efeito cumulativo\”. Ainda, o Ministro alegou que a atividade de inserção de textos publicitários não se confunde com o núcleo do serviço de comunicação propriamente dito, consistindo em etapa preparatória.
Assim, ainda que a atividade de inserção de textos publicitários possa ser considerada complexa, concluiu-se que a previsão em lei complementar afasta a incidência do ICMS.
Outra relevante consequência de julgar improcedente a ADI foi rechaçar o pedido de declaração de constitucionalidade da incidência do imposto estadual sobre a veiculação de publicidade ocorrida antes da entrada em vigor da LC nº 157/2016, o que prejudica eventuais autuações estaduais ainda não definitivamente julgadas.
Tanto a LC nº 157/2016, que incluiu a inserção de textos publicitários na Lista Anexa à LC nº 116/2003, quanto a decisão do STF que reconheceu a função da lei complementar acertaram. Realmente, o serviço de inserir materiais de propaganda e publicidade em hipótese alguma se confunde com o serviço de comunicação propriamente dito.
Cabe lembrar, o resultado da diferenciação dos serviços de comunicação daqueles que são prestados de forma preparatória ou acessória é um resultado tanto da evolução dos serviços prestados ao suporte da comunicação, quanto da análise feita pelos tribunais sobre a incidência que deve ou não recair sobre suas receitas.
E aqui a inserção é um verdadeiro serviço \”estático\”, que apenas disponibiliza a informação em determinado meio, enquanto o serviço de comunicação, por outro lado, pressupõe a transmissão de uma mensagem do emissor para o receptor, suportada pelo devido canal comunicativo. No caso da publicidade, em que pese exposta na internet, somente poderá ser transmitida ao receptor por meio dos canais utilizados pelas empresas de telecomunicação, que inclusive prestam serviço para aqueles que se comprometem a inserir o material em suas plataformas online.
A mensagem não se confunde com o meio de transmissão!
Não bastasse a decisão do Supremo, a mesma conclusão pode ser alcançada com fundamento nos dispositivos infraconstitucionais. Isso porque, como sabido, o artigo 110 do CTN veda que a lei tributária altere conceitos de direito privado utilizados na definição de competências. E, nos termos da Lei Geral de Telecomunicações (LGT), a Lei nº 9.472/97, a telecomunicação é a transmissão dos sinais por meios ópticos ou outro processo eletromagnético, não detidos pelos portais virtuais onde são inseridos os materiais.
Nessa mesma linha, a lei deixou claro que serviços de valor adicionado que dão suporte à telecomunicação, inclusive para acrescentar novas utilidades de apresentação, não se confunde com a telecomunicação propriamente dita.
Dessa forma, conclui-se que a LC nº 157/2016 não só encerrou o conflito de competência até então existente, como também instituiu novo serviço na Lista Anexa à LC nº 116/2003, de modo que pode ser cobrado o imposto somente em relação a fatos geradores ocorridos após a sua edição, respeitada a anterioridade. Aguardamos, por ora, o trânsito em julgado da decisão do STF sobre o tema.