O comércio eletrônico está na mira do fisco, que quer apertar o cerco às lojas virtuais que não pagam impostos. Em São Paulo, o governo prepara mudanças na legislação do ICMS para facilitar a fiscalização das operações virtuais. A Receita Federal criou grupo de estudo para também mapear o setor.
As vendas virtuais devem movimentar R$ 10 bilhões neste ano, valor 22% maior do que o negociado no ano passado, segundo estimativas do setor.
Até o fim de agosto, o fisco paulista deve encaminhar à Assembleia Legislativa um projeto de lei que obriga as empresas que operam na internet a informar dados cadastrais (como endereço e CNPJ) e de vendas feitas pelas lojas virtuais.
É que hoje o fisco tem dificuldade para identificar e localizar quem são os donos dos sites de vendas. Com regras específicas para o comércio eletrônico, a Fazenda paulista entende que será mais fácil saber quem é esse contribuinte virtual e cobrar dele o imposto. O foco das ações do fisco são os sites que operam de forma irregular e driblam o pagamento de impostos, e não as lojas e provedores legalmente estabelecidos.
“Constatamos que há uma intensa mobilidade de endereços virtuais. Um site de comércio abre e fecha, e temos dificuldade em saber quem está por trás dele. Por isso, as informações das empresas que fazem a intermediação de sites [abrigam lojas virtuais e têm participação nas negociações], das que prestam serviços tecnológicos ou hospedam outros sites [provedores e servidores] são importantes para o fisco”, diz Antônio Carlos de Moura Campos, diretor-adjunto da Deat (Diretoria Executiva da Administração Tributária) da Secretaria da Fazenda paulista. “A ideia é que essas empresas façam o mesmo que as administradoras de cartão de crédito: forneçam dados ao fisco.”
“O comércio eletrônico é um setor que tem cada vez mais peso econômico e capacidade contributiva. Merece a atenção do fisco”, diz Luiz Sérgio Fonseca Soares, superintendente da Receita em São Paulo.
Sonegação
Advogados especializados em crimes virtuais, consultores e fiscais não têm ideia do tamanho da sonegação nas vendas pela internet. Mas consideram que o crescimento dos negócios virtuais e o aumento de denúncias de consumidores lesados justificam o cerco a esse setor.
Estima-se que hoje 20 mil sites atuem no país na venda de bens de consumo (exceto carros, passagens aéreas e produtos usados). Há cinco anos, eram 4.000. Um único site de venda de eletroeletrônicos monitorado pela recém-criada Supervisão de Fiscalização de Comércio Eletrônico da Fazenda paulista faturou no ano passado R$ 6 milhões, mas não recolheu um centavo de ICMS. Ao menos mil endereços virtuais serão monitorados.
“O site que vende um produto está sujeito à mesma tributação de uma loja física”, afirma Renato Pei An Chan, supervisor de fiscalização da Deat.
Se as mudanças na lei do ICMS forem aprovadas pela Assembleia, as empresas “hospedeiras” que não prestarem informações (sobre sites que atuam de forma irregular) é que estarão sujeitas a multas e poderão até ser consideradas responsáveis solidárias.
Segundo a Associação Comercial de São Paulo e a Fecomercio-SP, aumentam as reclamações de consumidores lesados em compras on-line. “Recebo semanalmente informações de cerca de 50 sites que querem vender algo, desde remédios até eletrônicos. O comércio virtual é uma realidade e só tende a crescer. O que podemos fazer, por enquanto, é alertar o consumidor a pesquisar os sites e exigir nota fiscal”, diz Marcel Domingos Solimeo, economista da ACSP.
A Fecomercio SP pretende fazer um mapeamento do impacto das vendas eletrônicas informais no comércio físico e marcou para o início de agosto um congresso sobre crimes eletrônicos e formas de proteção.
“Com o avanço da tecnologia, o estelionatário que atua no mundo físico migra para a internet. Temos lei para coibir 95% dos crimes praticados pela internet, seja em transações bancárias, seja no comércio ilegal. Há um universo de 5% que está descoberto, é um mundo sem lei”, diz o advogado Renato Ópice Blum, presidente do Conselho de Tecnologia da Informação da Fecomercio SP.
O número de pessoas que buscam reparo na Justiça porque foram lesadas em crimes na internet também cresce, diz ele. Há sete anos, 400 processos foram julgados pelos tribunais de Justiça estaduais e federais. No fim de 2008, eram 17 mil. “É preciso criar delegacias, varas e tribunais especializados em crimes eletrônicos e intensificar a fiscalização.”
Sites têm de atuar com transparência, afirma especialista
O comércio eletrônico precisa atuar de forma transparente e dar mais segurança aos usuários. Mas as mudanças propostas pelo fisco paulista, para facilitar a fiscalização, não podem afugentar os sites que decidem registrar seu domínio no Brasil. A avaliação é de Demi Getschko, diretor-presidente do NIC.br (Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto br).
Todo site que deseja atuar com o “ponto.br” tem de procurar o registro.br (Registro de Domínios para Internet no Brasil). Hoje há 1,74 milhão de endereços eletrônicos registrados como “ponto.br”, dos quais 1,60 milhão são sites comerciais (com final “com.br”).
“Se esse site for de uma empresa, tem de informar o CNPJ e três contatos: 1) da pessoa responsável pelo domínio; 2) da pessoa responsável pela parte administrativa; e 3) da pessoa responsável pela parte técnica. O que fazemos é checar se o CNPJ e a razão social da empresa de fato correspondem aos informados à Receita.”
Ele afirma que, se o fisco quiser informações sobre os sites registrados, já tem acesso aos dados pelo endereço do registro.br (http://www.registro.br/).
“O que podemos fazer é ampliar o acesso [dos fiscais] às informações [dos sites cadastrados no registro.br]. Hoje, por razões de segurança, limitamos a consulta por usuário.”
Autor do projeto que define crimes na internet, o senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) diz que falta o envolvimento do governo para combater as fraudes. “Ter uma lei no país que tipifique e puna os crimes virtuais é fundamental. Mas a lei sozinha não resolve.”
Pedro Guasti, diretor-geral da e-bit, diz que a informalidade prejudica toda a economia, inclusive os negócios na internet. O Movimento Internet Segura, apoiado pela e-bit, procura ensinar o consumidor. “Combatemos o comércio irregular, mas não é nossa responsabilidade fiscalizar.”