O Banco Central (BC) está tomando uma série de medidas para conter o
ímpeto do brasileiro por empréstimos e compras a prazo, mas ainda não
obteve sucesso. Quase R$ 4 bilhões estão sendo emprestados diariamente
no país, ritmo que levou o nível de endividamento das famílias daqui a
superar o dos norte-americanos. Enquanto nos Estados Unidos, em média,
18% da renda são gastos para quitar parcelas dos financiamentos
(prestações e juros), no Brasil essa relação alcançou 24,2% — cenário
que é motivo de preocupação no governo, principalmente quando se lembra
da crise mundial, com auge em 2008, gerada pelo superendividamento nos
EUA.
A demanda por crédito está tão forte, que o total das
dívidas das famílias já encosta nos R$ 800 bilhões, mesmo com o valor
das prestações tendo aumentado 20% desde o início do ano, refletindo a
elevação da taxa básica de juros (Selic) e as medidas macroprudenciais
baixadas pelo BC. Ciente de que tal movimento é inflacionário e
incompatível com a atual correção dos salários, a autoridade monetária
quer que o crédito avance 13% ao ano e não 21% como se vê. Mesmo que
essa desaceleração se concretize, o BC já vislumbra um salto no calote.
Mais famílias não terão condições de honrar seus compromissos em dia.
A
situação está tão preocupante, que o sempre comedido diretor de
Política Econômica do BC, Carlos Hamilton Araújo, fez questão de
enfatizar os riscos que as famílias estão correndo. “Quanto maior for o
comprometimento da renda, maior será a chance de se deixar uma conta de
fora das que serão quitadas”, alertou. Na avaliação dele e de outros
técnicos do BC, depois da adoção de medidas macroprudenciais, em
dezembro do ano passado, é natural, e aguardado, um movimento de alta na
inadimplência. “Tivemos um encurtamento dos prazos e aumento das taxas.
Por isso, esperamos uma inadimplência pouco maior.”
Inflação
Açoitado
pelo aumento dos preços das commodities e dos alimentos, o BC jogou a
toalha. Pela primeira vez, deixou claro que abandonou, em 2011, a meta
central de 4,5%, estabelecida para o Índice de Preços ao Consumidor
Amplo (IPCA). Ao detalhar o Relatório de Inflação do primeiro trimestre
do ano, Araújo admitiu que o trabalho do Banco Central este ano
consistirá apenas em acomodar os choques externos, buscando evitar que a
carestia fuja do controle e se afaste muito do alvo desejado. O retorno
da inflação aos 4,5%, porém, só será possível em 2012. A expectativa é
de que o IPCA avance 5,6% (a previsão anterior era de 5%), após estourar
o teto da meta e atingir, no terceiro trimestre, 6,6%. Para dezembro de
2012, a projeção é de que o nível volte a 4,6%.
O afrouxamento
da meta de 4,5% para algo em torno de 5,3%, conforme previu o próprio
diretor do BC, seria aceitável. “O sistema de metas de inflação está em
vigor há 12 anos e contempla esse tipo de situação. O foco é 4,5%. No
entanto, um desvio decorrente de um choque imprevisível é possível de
ser acomodado”, afirmou Araújo. O relatório do BC também reduziu a
projeção para a expansão da economia em 0,5 ponto percentual, de 4,5%
para 4% em 2011.