Muitas vezes o discurso de um banco central, expresso em comunicados, atas ou nas palavras de seu presidente ou integrantes, é mais determinante do que seus atos na formação das expectativas do mercado e portanto dos juros reais praticados na economia. Nesta semana, certos de que o Comitê de Política Monetária vai manter os juros Selic estáveis em 8,75% ao ano, os investidores estarão com todas as suas atenções voltadas para o comunicado que será divulgado após a reunião. A ata do Copom, que sai na semana que vem para tentar justificar o porquê da decisão desta semana, também será lida atentamente. “O BC deverá mudar o tom do seu discurso, adotar uma postura ligeiramente mais conservadora, se mostrar mais vigilante, mas não vai querer limitar sua atuação ou se comprometer com uma alta de taxas de juros mais imediata”, acredita a economista-chefe do Banco ING, Zeina Latif. Ela mantém sua aposta de aumento de 150 pontos básicos na taxa básica Selic em 2010 e somente a partir de julho. Afinal, segundo ela, quem tem se surpreendido com a produção industrial e a atividade econômica é o mercado, não o Banco Central, que já falava em aumento de 0,8% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano. Zeina prevê 0,5%.
Para ela, considerando-se um cenário de crescimento econômico fraco no mundo, não superior a 2,9%, o aumento nos juros básicos pelo BC brasileiro vai depender da política fiscal a ser adotada pelo governo e do preço das commodities. “Com toda essa liquidez nos mercados internacionais, poderemos ter uma bolha especulativa nos commodities, com puxada mais forte nos preços dos alimentos.” Ela lembra que nos últimos dois meses a alta dos preços dos commodities nos índices de inflação não foi compensada pela queda no dólar e que os fatores sazonais de final de ano contribuem para maior pressão. “A inflação corrente acaba influenciando as expectativas de inflação futura”, afirma. Por isso, no seu entender, seria excelente se o Fed, banco central americano, e o Banco Central Europeu começassem logo a retirar a liquidez que colocaram no mercado por meio da política de “relaxamento quantitativo” ou até mesmo iniciassem lentamente um movimento de alta nas taxas de juros.
Atualmente, o discurso combinado dos presidentes dos bancos centrais são no sentido de evitar a formação de bolhas. Ontem o presidente do Fed, Ben Bernanke, destacou que há “ventos contrários” à recuperação da economia americana e que a inflação poderia ainda se mover para baixo. Com isso, segurou um pouco do otimismo e impediu um rali nas bolsas, mesmo após os números do emprego nos Estados Unidos, divulgados na sexta-feira, terem vindo bem melhores do que o mercado esperava, com cortes líquidos de somente 11 mil vagas em novembro, na comparação com 111 mil em outubro. “O desemprego é acompanhado de perto pelo Fed na determinação de sua política monetária e o mercado sabe disso”, diz Zeina. Ontem, nos mercados futuros americanos, os contratos de juros dos chamados “fed funds” passaram a projetar probabilidade de 15% de aumento de ao menos 0,5 ponto nos juros americanos em março, na comparação com 11% há uma semana, e de 48% na reunião de junho, em relação a 32% há uma semana.
O discurso do presidente do BC brasileiro, Henrique Meirelles, também tem sido no sentido de desinflar otimismo exagerado com o Brasil. Com isso, contribuiu para evitar um tombo maior no dólar, que ontem foi a R$ 1,721, uma queda de 0,23%. No mercado futuro brasileiro, os juros projetados para janeiro de 2011 caíram 0,67%, para 10,36% ao ano.