Giuliano Mendes O presidente do Sindicato da Indústria de Adubos do Rio Grande do Sul (Siargs) e vice-presidente do Conselho de Administração da Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda), Torvaldo Antonio Marzolla Filho, esclarece nesta entrevista os motivos do aumento nos preços dos fertilizantes, assunto que vem provocando polêmica no meio agrícola, tanto que já mereceu a instalação da CPI dos Insumos Agrícolas na Assembléia Legislativa gaúcha. Apesar das críticas, ele afirma que o valor do adubo deverá se manter aquecido enquanto as commodities estiverem valorizadas. O dirigente se revela indiferente ao assunto, pois os preços seguem na esteira do mercado internacional. Jornal do Comércio – O preço do fertilizante vem sofrendo alta nos últimos meses e há muita especulação em relação ao percentual. De quanto foi o aumento? Torvaldo Marzolla Filho – De janeiro até abril houve um pico de 100% em dólares. Em reais subiu menos em comparação com a moeda norte-americana. A diferença é a variação cambial. A indústria compra os insumos da matéria-prima em dólar e vende na moeda brasileira. E, quando a indústria vende, ela já repassa com a defasagem da variação cambial. JC – Por que o preço do fertilizante subiu tanto? Marzolla – O que a gente olha no mundo são a energia, que envolve elétrica e petróleo, que bateu a casa dos US$ 125 o barril, e os alimentos. Todos eles serviram de base para o aumento nos preços dos insumos para fertilizantes. O Brasil produz 30% de sua necessidade de fertilizantes e o Rio Grande do Sul importa 100% de matéria-prima. Então, o Estado é 100% dependente do mercado internacional na composição de preços. JC – Mas com a desvalorização do dólar, o preço dos fertilizantes não deveria estar mais baixo? Marzolla – Não, porque o valor da matéria-prima não é estável. Mas os preços dos insumos subiram 100% em dólar e os fretes marítimos tiveram alta de 125% também na moeda norte-americana. E a variação cambial de janeiro até agora, quanto variou? No máximo 10%. Com isso, a desvalorização da moeda norte-americana nem aparece no preço final. JC – Este aumento de 100% que o senhor se refere é das matérias-primas lá fora. E de onde o Rio Grande do Sul adquire os insumos? Marzolla – São vários os países de que o Brasil adquire os insumos, em especial podem ser citados Canadá, Estados Unidos, Rússia, Marrocos, Tunísia, Alemanha e Israel. Nós importávamos da China, mas agora o governo daquele país não permite que o Brasil importe fertilizantes por causa do imposto de 135% para exportação. O valor se tornou inviável. JC – E o insumo chinês de certa forma contribuía para baixar os preços no País? Marzolla – Não, porque o preço é o mesmo no mundo inteiro. Todos os insumos como nitrogênio, fósforo e potássio são commodities com preços internacionais. É como ocorre com o preço do barril de petróleo, da soja, do suco de laranja e do café, que tem como parâmetro o mercado internacional. JC – Existe uma estimativa de quanto possa ser o aumento nos preços do adubo para o produtor? Marzolla – Eu não tenho uma previsão, mas enquanto a cotação dos alimentos estiveram lá em cima, não há dúvida que o preço dos insumos vai acompanhar. Também não tenho dúvida que assim que os preços dos alimentos começaram a cair, o preço dos insumos também vai cair, uma coisa é dependente da outra. JC – E, em relação ao petróleo, que é o principal insumo dos fertilizantes, vai continuar influenciando o preço do adubo? Marzolla – Com certeza. E nós vimos uma estimativa que o barril possa atingir US$ 200 até o final do ano. Quando o barril estava a US$ 40, se dizia que quando atingisse US$ 100 seria o fim do mundo, mas o mundo não acabou (risos). JC – E a tendência é o de preço do barril continuar aumentando… Marzolla – É muito difícil fazer uma previsão, pois é o mercado que vai determinar o valor. Eu só tenho uma certeza: energia, alimentos e insumos modernos para produzir alimentos subiram e não vão voltar nunca para aqueles padrões de um ou dois anos atrás. O barril de petróleo não vai retroceder para US$ 40. Os alimentos também não vão recuar a valores de um ou dois anos atrás. E os insumos, da mesma forma. Isto é uma lei internacional, e nós temos que acompanhar este processo e estar atentos. JC – Como está o Brasil em volume de venda de adubos? Marzolla – Em 2007, o Brasil teve uma demanda de 24,6 milhões de toneladas, foi o recorde histórico. No Rio Grande do Sul, a demanda foi de 2,7 milhões em 2007 e o recorde foi em 2004 de 2,9 milhões de toneladas. Em 2005 e 2006 a estiagem prejudicou os produtores e conseqüentemente a indústria de fertilizantes, e agora estamos buscando a recuperação. No primeiro quadrimestre do ano, o Brasil cresceu 20% e o Rio Grande do Sul aumentou 57%. JC – E, para este ano, como deve ser o desempenho? Marzolla – No Estado existe a expectativa de que o volume bata a marca de 2004, ou no mínimo se equipare. Para o País, existe a possibilidade de um novo recorde, pois as estimativas mostram um incremento de 6% a 8%, o que representa 1,96 milhão de toneladas. E, mesmo com o desempenho positivo, a indústria de fertilizante não tem nenhuma proteção do governo brasileiro. JC – No que isso atrapalha? Marzolla – O Blairo Maggi (governador do Mato Grosso e produtor rural), por exemplo, importa vários navios por ano de NPK, o grão complexo, lá pelo porto de Itacoatiara, no Amazonas, e leva até o Mato Grosso em detrimento de comprar pela indústria nacional. E desde 2004 qualquer um pode importar o produto de qualquer lugar do mundo. A indústria automobilística tem uma proteção de 35%, e a de fertilizante não tem nenhuma proteção. É a indústria menos protegida de todo o Brasil. JC – E o que a indústria vem fazendo para que haja proteção? Marzolla – Seriedade, melhor produto, preocupação para que não falte o produto, porque o adubo mais caro é aquele que você não tem. JC – Existe algum risco de faltar fertilizante neste ano com a demanda aquecida? Marzolla – O Brasil não sofre risco algum porque nós temos contratos com fornecedores internacionais, e não tenha dúvida de que eles honrarão. A única coisa que não temos como saber é o preço, que é um grande problema para a indústria de fertilizantes, pois compramos um navio com um determinado preço, e o outro chega com o preço totalmente diferente. Temos dificuldades de repor a nossa própria prateleira. Vendemos num determinado valor e a matéria-prima chega num preço muito mais alto no navio seguinte. JC – Os produtores do Mato Grosso estavam reclamando que a indústria de fertilizante estava segurando o produto para elevar os preços. O que o senhor tem a dizer sobre esta afirmação? Marzolla – Isto é uma mentira. Eu sou vice-presidente do Conselho de Administração da Anda e sei o que vem acontecendo no Brasil. A indústria de fertilizantes nunca fez isto, não é uma característica e eu acredito que nunca deverá fazer. O produto que nós temos está à disposição, está à venda. Nós não especulamos com o produto. Nós servimos à agricultura. JC – O senhor é favorável à CPI dos Insumos Agrícolas na Assembléia Legislativa? Marzolla – Não sou nem favorável e nem contrário porque eu conheço a matéria e esses valores todos com que eles estão preocupados são impostos pelo mercado internacional. A exemplo da energia, do combustível, dos alimentos e dos insumos. E, talvez porque são pessoas que não estão habituadas a isso, estão com esta pergunta. Eles estão imaginando, talvez, que as indústrias brasileiras mandam no preço do mercado internacional. Na realidade, o Brasil vai a reboque do mercado não só no caso dos insumos, mas no preço do barril de petróleo e das commodities agrícolas. JC – O que vai representar para o setor o aumento no consumo mundial de alimentos? Marzolla – A população no mundo hoje é de 6,7 bilhões de habitantes. A FAO nos ensina que, sem os fertilizantes, 50% da população estariam passando fome, ou seja, cerca de 3,5 bilhões de pessoas. E mais de 4 bilhões de habitantes estão na Ásia, como China, Coréia do Sul e Vietnã. Esses países vêm crescendo de forma sustentada há mais de uma década. Isto faz com que o dinheiro deles tenha cada vez mais valor. E o que faz uma pessoa quando tem um pouco mais de dinheiro? Come mais e melhor. E a comida vem da agricultura. Então a demanda cresceu muito, porque o mundo está comendo mais.