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2 de setembro de 2024Os processos de falência, desde a votação do Projeto de Lei 03/2.024 pela Câmara dos Deputados, foram objeto de inúmeras notícias de jornais e trabalhos acadêmicos, os quais abordaram a ineficiência do sistema de insolvência e a baixa taxa de recuperação do crédito concedido às empresas que tiveram a sua falência decretada.
Os trabalhos de jurimetria sobre a eficácia dos processos de falência não são animadores, pois um processo de falência dura, em média, dez anos até o seu encerramento, com os credores recebendo, em média, apenas 6% dos créditos concedidos à empresa falida.
No entanto, é indiscutível que a Lei 14.112/2.020 dará maior celeridade e eficácia aos processos de falência. Ainda assim, os efeitos dessas recentes mudanças não são visíveis na prática cotidiana. Isto porque estas mudanças são novas e os próprios credores, administradores judiciais e membros do Poder Judiciário estão se adaptando as alterações.
Com efeito, apenas a título de ilustração, sabe-se que, após as alterações introduzidas pela Lei 14.112/2020, o administrador judicial deve proceder à venda de todos os bens da massa falida dentro do prazo de 180 dias, o credor deve apresentar seu pedido de habilitação ou reserva de crédito no prazo máximo de três anos após a decretação da falência, eis que as obrigações do falido se extinguem após este período.
Essas mudanças, em tese, acelerariam o recebimento do crédito dos credores habilitados e permitiriam o encerramento da falência com a extinção das obrigações do falido, reabilitando-o à vida empresarial dentro do prazo de três anos.
A reabilitação do falido e a extinção das suas obrigações, que antes da reforma da LRF de 2020 eram muito lentas, agora podem ocorrer em um período significativamente menor.
Contudo, a reforma também trouxe risco aos credores, os quais, caso não habilitem o seu crédito dentro do prazo de três anos a contar da decretação da falência, poderão ser alcançados pela decadência do seu direto. Com efeito, o encerramento das obrigações do falido, nesta hipótese, não decorreria do pagamento das obrigações, mas sim do decurso do prazo de três anos.
O Fresh Start nada mais é do que a possibilidade de o falido encerrar seu processo de falência e ter suas obrigações extintas após três anos da decretação da falência. Assim, se aplicado em larga escala pelo Poder Judiciário, esse mecanismo pode implicar em uma profunda mudança cultural e fomentar o empreendedorismo, permitindo a reabilitação rápida do falido à vida econômica, nos termos do inciso III do artigo 75 da LRF.
Como se sabe, qualquer mudança cultural é um processo de transformação dos valores, crenças e práticas de uma sociedade, sendo estas alterações legislativas o resultado destes legítimos anseios da sociedade quanto a maior celeridade e eficácia nos processos de falência. Isto porque um processo moroso, caro e ineficaz não é do interesse nem do falido, tampouco dos credores.
Estes anseios sociais já são vistos nos processos de falência anteriores a reforma da LRF de 2.020, eis que foram inúmeros casos em que os falidos pediram a extinção das suas obrigações pelo decurso do prazo de três anos.
O Poder Judiciário, infelizmente, não pôde aplicar a extinção das obrigações do falido naqueles processos de falência que foram decretados antes da reforma da LRF de 2020.
Isto porque o Poder Judiciário, em grande parte dos casos, não conseguiu contornar o início da vigência da reforma da LFR de 2020, não podendo o novo artigo referente à extinção das obrigações do falido ser aplicado as falências decretadas antes da vigência da LRF de 2020, sob pena de trazer grande insegurança jurídica ao sistema de insolvência brasileiro.
Todavia, o mais curioso é que, na hipótese dos processos de falência que foram decretados antes da reforma da LFR de 2020, nos quais a arrecadação dos bens foi negativa, o Poder Judiciário poderá aplicar o Fresh Start pela patente ineficácia do processo de falência.
Nesta hipótese, pouco importa se a falência foi decretada ainda na vigência do Decreto Lei 7.661/1945, ou, após a vigência da Lei 11.101/2005, pois, como o processo de falência não teria qualquer utilidade aos credores, este deverá ser encerrado com a reabilitação do falido.
Cumpre notar, entretanto, que qualquer mudança cultural pode encontrar resistência, aqui, nos próprios credores que se insurgirão contra o encerramento mais célere da falência. Essa insurgência não é fenômeno novo no sistema de insolvência brasileiro, pois já ocorreu em vários casos de encerramento do processo de recuperação judicial dois anos após a sua concessão.
Ademais, o próprio fisco é a primeira exceção ao mecanismo de Fresh Start, eis que ele não está sujeito a extinção dos seus créditos pelo decurso do prazo de três anos. Sem um maior aprofundamento sobre o tema, é certo que a extinção do crédito fiscal e a reabilitação do falido deverá ser, no futuro, um relevante ponto a ser tratado pelo Poder Judiciário, pois, em grande parte das falências, a dívida fiscal será um grande empecilho ao restabelecimento empresarial do falido.
Por todo exposto, a Lei 14.112/2020 representa um avanço significativo na modernização do sistema de insolvência brasileiro, especialmente com a introdução do conceito de Fresh Start. No entanto, a plena realização dos benefícios dessa reforma ainda depende de uma adaptação cultural por parte dos credores, dos administradores judiciais e o próprio Poder Judiciário, devendo este último, modernizar a sua posição quanto ao crédito fiscal e o Fresh Start, sob pena de eventual resistência cultural inviabilizar os mecanismos de reabilitação do falido.
Fonte: Conjur