A não-aprovação ontem de três itens das novas regras do Novo Mercado fez com que Armínio Fraga, presidente do Conselho de Administração da Bolsa de Valores, Mercadorias e Futuros (BM&F Bovespa), refletisse negativamente sobre a mentalidade das empresas brasileiras. “A evolução da mentalidade não acontece da noite paro o dia. Ainda vejo um Brasil antigo”, disse Fraga.
O principal item não aprovado, para os executivos da Bolsa, foi em relação à Oferta Pública de Aquisição de Ações (OPA) por Atingimento de Participação Acionária Relevante, em que era proposta uma oferta na hipótese de acionista ou grupo de acionistas atingir participação acionária relevante de 30% de uma determinada companhia.
“Foi um item muito discutido. Não tivemos tempo para uma reflexão definitiva sobre esta proposta”, afirmou Fraga. Todo o processo de alteração do Novo Mercado, Nível I e Nível II de governança teve cerca de 1 ano e meio para sua conclusão, tendo tido início em meados de 2008.
A aprovação desse item poderia possibilitar o fim das empresas familiares, cujos principais acionistas são membros da família fundadora da empresa.
Outro ponto destacado pelo presidente do Conselho da BM&F Bovespa foi a não-aprovação da exigência de um comitê de auditoria, composto por no mínimo 3 membros eleitos pelo Conselho, sendo, no mínimo um deles, conselheiro independente.
“A criação do Comitê de Auditoria daria auxílio ao Conselho Fiscal, trabalhando paralelamente. Precisamos de um comitê que olhe para o futuro, não só para o passado, como é o caso do Conselho Fiscal”, acrescenta Fraga.
Em outro ponto, Fraga afirmou que a exigência de um Comitê de Auditoria dificultaria que empresas tivessem tento prejuízo cambial com negociação de derivativos durante a crise como ocorreu em 2008. Uma das empresas que votou contra a criação do Comitê de Auditoria foi a Fibria, companhia derivada da união entre a Votorantim Celulose e Papel (VCP) e a Aracruz, que amarga uma dívida bilionária por conta de investimentos em derivativos.
Por fim, o terceiro e último item não aprovado pelas empresas de capital aberto foi a obrigatoriedade do aumento de 20% para 30% da participação de conselheiros independentes e inclusão do número mínimo de cinco membros, sendo pelo menos 20% de conselheiros independentes.
“As empresas entenderam como um aumento de custo, mas acho que merece uma nova discussão”, diz Fraga. O presidente do Conselho da Bolsa disse também que percebeu uma “mentalidade de pensar coletivamente” das companhias, querendo dizer que a minoria conseguiu votos da maioria por solidariedade.
Conforme os regulamentos em vigor, as alterações – que foram apresentadas para votação em blocos – somente poderiam ser implementadas se não houvesse manifestação contrária de mais de um terço das companhias listadas em cada segmento, ou seja, até 35, para o Novo Mercado, no máximo 11 para o Nível 1, e até 6 para o Nível 2.
“Nós tivemos, por parte das empresas, uma aprovação muito importante para o amadurecimento do mercado. Foram discutidos temas importantes para a construção do mercado de capitais”, disse Edemir Pinto, presidente da BM&F Bovespa.
Segundo Fraga, a bolsa já sabia que veria algumas propostas derrubadas antes mesmo do resultado final. O executivo relatou que, durante o processo de audiência restrita que durou cerca de dois meses, recebeu um grupo de 15 a 20 empresas -“de primeira linha e muitas delas com orgulho de pertencer ao Novo Mercado”- cujo entendimento era de que não estavam prontas para aceitar as mudanças. “Decidimos arriscar, mas não temos nenhum arrependimento”, afirmou.
Mesmo se mostrando muito contrário à não-aprovação dos três principais itens, Armínio Fraga descartou a criação de um novo padrão que pudesse abrigar normas mais rígidas. “O Novo Mercado, agora reforçado, já introduz um padrão excelente para as empresas”, avaliou o presidente do conselho de administração.
Fraga destacou os principais itens que foram aprovados pelas empresas, como: proibição à acumulação de cargos de presidente do Conselho de Administração e diretor presidente; proibição à cláusula que impeça o exercício de voto favorável ou imponha ônus aos acionistas – “cláusula pétrea” -; obrigação do conselho de administração de divulgar manifestação, no prazo de 15 dias a partir do edital da oferta pública de aquisição de ações; e criação da política de negociação de valores mobiliários.