O risco do Brasil percebido pelos investidores globais nunca foi tão
baixo se comparado ao dos Estados Unidos, considerado referência em
segurança financeira. Na semana passada, a diferença entre as medidas de
risco dos dois países alcançou o menor nível da história: 0,60 ponto
porcentual. Segunda-feira à tarde, estava em 0,62 ponto porcentual.
Esses números foram extraídos das negociações com um derivativo
financeiro amplamente negociado no mercado, chamado CDS (Credit Default
Swap, em inglês). Esse papel é um tipo de seguro vendido a investidores
que querem se proteger de um eventual calote.
Se alguém quer comprar títulos públicos brasileiros e, ao mesmo
tempo, se proteger, utiliza o CDS. Ontem, pagava 1,1% ao ano em dólar
para este fim. Para se proteger de eventual problema nos EUA, a taxa
estava em 0,48% ao ano. O mercado de CDS movimenta trilhões de dólares
mundo afora e o do Brasil é um dos mais negociados.
O que ocorre hoje é fruto de três movimentos. “De um lado, espelha a
melhora da percepção de solvência do Brasil. De outro, é fruto da enorme
liquidez global”, explica o economista Dany Rappaport, sócio da
InvestPort Consultoria e Gestão de Recursos. “Ou seja, em relação
especificamente ao Brasil, há uma razão estrutural e outra conjuntural,
que catalisa a estrutural.”
Ontem, a agência de classificação de risco Standard & Poor’s e o
ex-presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) Alan
Greenspan jogaram luz sobre um terceiro fator: uma deterioração na
confiança de os EUA honrarem sua dívida. Ninguém está dizendo que a
maior economia do mundo vai dar um calote amanhã ou mesmo nos próximos
anos. Mas o risco de isso acontecer tem crescido.
Do ponto de vista do Brasil, estruturalmente, as contas públicas
apresentaram expressiva melhora nos últimos anos. A relação entre a
dívida líquida do setor público e o Produto Interno Bruto (PIB) saiu de
60% em dezembro de 2002 para os atuais 39,9%. Isso significa que a
probabilidade de o governo brasileiro não honrar o pagamento dos títulos
que emite é muito baixa.
Além disso, a dívida externa foi drasticamente reduzida nos últimos
anos em decorrência, principalmente, do acúmulo de reservas
internacionais. Atualmente, o País tem um colchão superior a US$ 320
bilhões. Segundo analistas, um montante desses assegura ao investidor
uma porta de saída quando – e se – decidir deixar o Brasil.
A melhora da solvência interna e externa foi reconhecida mais uma vez
há duas semanas, quando a agência de classificação de risco de crédito
Fitch elevou o chamado rating do Brasil. O País está agora em um degrau
ainda mais alto na escala que procura medir a capacidade de solvência de
um emissor de dívida.
Liquidez. Do ponto de vista conjuntural, o mundo
vive situação ímpar, que se caracteriza por enorme injeção de dinheiro
no mercado pelos países desenvolvidos. Após o estouro da crise, os
bancos centrais dos EUA e da Europa decidiram fazer o que se chama em
economia de imprimir dinheiro. Com isso, inundaram o mundo com recursos.
Como o Brasil é visto como um porto seguro – pela solvência e também
pelas taxas de crescimento expressivas se comparadas às do resto do
planeta -, tornou-se um natural receptor de uma parte dessa liquidez.
“Na realidade, a queda do risco Brasil é resultado desse fluxo de
capitais para cá”, afirmou o economista-chefe do Banco Santander,
Maurício Molan.
Em termos práticos, esse cenário significa que governo e empresas
brasileiras nunca se financiaram pagando tão pouco. Mesmo quando a farta
liquidez começar a secar, a expectativa é de que o País continue bem
situado.
“Ainda que as contas públicas não sejam uma maravilha e o governo
venha aumentando os gastos ano após ano, nossa situação fiscal é melhor
que a da maioria dos países desenvolvidos”, afirma um analista que pede
anonimato. “Não há hoje risco de solvência no País. A situação fiscal
pobre vai ‘apenas’ atrapalhar nosso desenvolvimento.”