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18 de abril de 2024As empresas podem usar o valor de juros sobre o capital próprio pagos aos seus associados para reduzir os valores de Imposto de Renda (IR) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSSL) a pagar, mesmo quando esses juros tenham sido acumulados em períodos anteriores ao do seu pagamento. O “leading case” é uma decisão da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que interessa, principalmente, às multinacionais, empresas que comumente pagam juros sobre o capital próprio em substituição à distribuição de dividendos como forma de planejamento tributário. No caso, a empresa havia ajuizado um mandado de segurança preventivo para não ser autuada por ter aproveitado juros acumulados de 1997 a 2000, e pagos só em 2002, para diminuir o IR e a CSLL a recolher.
Os juros sobre capital próprio são uma ferramenta para remunerar sócios e acionistas em substituição à distribuição de dividendos. A empresa faz aplicações desses valores e usa os juros recebidos para pagar seus associados. É possível usar o valor equivalente a até 50% dos seus lucros acumulados ou correntes para pagar juros sobre capital próprio e depois tomar esse montante como despesa dedutível da base de cálculo do IR e da CSLL, segundo o advogado Carlos Augusto da Cruz, do Machado Associados Advogados e Consultores. O usual é a multinacional acumular juros sobre capital próprio para usá-los no pagamento dos associados somente quando tiver lucros acumulados ou estiver com problemas de caixa para pagar impostos.
No pagamento de juros aos associados, a empresa paga uma alíquota de 15% de IR retido na fonte, mas deixa de pagar uma alíquota de 34% de IR e CSLL incidentes sobre o valor total dos juros pagos. Assim, se a empresa paga R$ 1 milhão de juros, por exemplo, deverá recolher R$ 150 mil de IR retido na fonte. Por outro lado, essa empresa poderá diminuir seu lucro tributável em R$ 1 milhão e economizar R$ 340 mil de IR e CSLL. “A decisão do STJ é relevante porque garante a legalidade do mecanismo”, afirma o advogado Júlio de Oliveira, do Machado Associados.
A Receita Federal baseia suas autuações na Instrução Normativa nº 11, de 1996, que determina que seja observado o regime de competência, segundo o qual basta o registro contábil dos juros para haver efeitos fiscais, ainda que não haja movimentação do caixa da empresa. Com isso, os fiscais interpretam que as empresas só podem usar os juros sobre capital próprio como despesa dedutível da base de cálculo do IR e da CSLL no mesmo ano em que tais juros foram registrados. No caso da empresa que ajuizou o mandado de segurança: em 1997, 1998, 1999 e 2000. O advogado Luiz Roberto Peroba Barbosa, do Pinheiro Neto Advogados, explica que o STJ acolheu a tese da empresa, que se baseou na Lei das SA. “A lei societária permite que o pagamento dos juros ocorra a qualquer momento, ainda que anos depois de registrados”, defende.
O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) já havia proferido decisão sobre o tema. O advogado Gilberto de Castro Moreira Júnior, do escritório Vella Buosi Advogados, lembra que no conselho a questão foi polêmica por anos até o julgamento do processo da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). A empresa acumulou R$ 589 milhões em juros sobre capital próprio de 1996 a 1999. Em 2001, a companhia resolveu pagar os juros e usou os valores como despesa dedutível do IR e da CSLL, mas foi autuada. “A decisão do STJ é importante porque é o posicionamento do Judiciário a respeito dos juros sobre capital próprio”, diz Castro.
Com a decisão, outras empresas que foram autuadas e tiveram o recurso administrativo rejeitado no conselho ou em instâncias inferiores da Justiça passam a ter um forte argumento para tentar reverter a situação. Mas para a advogada Mariana Lima Miranda, do escritório Lobo & De Rizzo Advogados, a maior repercussão é ver empresas conservadoras interessadas em usar a ferramenta dos juros sobre capital próprio como forma de planejamento tributário. “Antes, mesmo com a decisão do CARF, muitas empresas não sentiam segurança jurídica para substituir a distribuição de dividendos pelo pagamento de juros”, comenta. A decisão deixa claro que, segundo o STJ, a legislação não veda que os juros sobre capital próprio sejam acumulados para ser usados como despesa dedutível do IR e da CSLL no futuro. A advogada explica que não há nenhuma alegação de inconstitucionalidade que justifique um recurso do fisco ao Supremo Tribunal Federal (STF). Procurada pelo Valor, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou apenas que “atuará quando o tema chegar pela primeira vez na Segunda Turma do STJ”.