A crise financeira começa a apresentar a conta aos trabalhadores brasileiros. As quase 700 mil demissões ocorridas em novembro e dezembro foram uma mudança muito ruim não somente para aqueles que perderam o emprego, mas também para as famílias e para os amigos, o que amplifica a sensação de deterioração do mercado de trabalho. Infelizmente, tudo indica que a tendência será mantida no primeiro trimestre, mesmo que o ritmo seja ainda uma incógnita.
Para as empresas, demitir deve ser o último ato, pois cada funcionário é parte do capital tangível e intangível acumulado pela companhia. Em cada especialista, operário, gerente ou técnico foram investidos tempo e recursos em recrutamento, seleção, educação e treinamento. Essas equipes detêm um histórico de conhecimento e de solução de problemas e sabem navegar na cultura da empresa. Demitir significa jogar esse capital humano fora – e são as pessoas que levam as companhias para frente, que as suportam em momentos de crise.
Os impactos da crise financeira trarão desafios para empresas e funcionários. De um lado, é preciso gerenciar custos, inclusive com redução da força de trabalho, e, ao mesmo tempo, manter motivação e foco das equipes para superar uma nova realidade, mais negativa e estressante. De outro, há um conjunto de novas competências que passam a ser admiradas e requeridas pelas companhias – e que precisam estar no raio de visão das pessoas, estejam elas empregadas ou em busca de uma nova colocação.
O Brasil continuará a receber investimentos. A atividade será mantida, mesmo que em outro ritmo. A História demonstra que os períodos de crise e de bonança não são eternos – e as empresas sabem disso. Quem conseguir reter os talentos e absorver outros que estiverem disponíveis estarão na vanguarda quando a curva voltar a se inverter. Do outro lado, o mesmo ocorrerá com as pessoas que conseguirem aproveitar o momento para reciclar e desenvolver novas competências.
A crise não inaugura o fim do mundo, mas certamente será uma reordenação de estratégias relacionadas aos negócios das empresas e ao estilo de vida das pessoas, que terão de repensar formas de produção e investir em conhecimento da própria estrutura, do mapeamento cultural, com indicadores de desempenho internos e referências externas. Os melhores exemplos, agora, devem ser observados mais do que nunca. Todo esse conhecimento sobre o DNA de cada organização é e será cada vez mais imprescindível.
Os departamentos de recursos humanos precisam liderar essa reorientação organizacional, com coragem, informação, estratégia e harmonia. É uma grande oportunidade para demonstrar valor. Os gestores de RH têm nas mãos o bem mais valioso, que são as pessoas. O desafio é focar na preparação das competências duráveis, no resgate dos propósitos e da missão, no trabalho de lideranças educadoras, na formação dos jovens, na geração e consolidação do conhecimento, na construção de redes de profissionais, equipes de alto desempenho e fundamentos como confiança mútua e reciprocidade. Isso exige, por parte do RH, vitalidade no planejamento e na execução, com a introdução de metodologias e instrumentos de inteligência. É o momento para quebra de paradigmas nas políticas de remuneração e benefícios concedidos aos executivos, na distribuição de renda interna, na revisão dos sistemas de recompensa, na flexibilização da jornada de trabalho.
A revolução intramuros não exime as autoridades brasileiras. Os custos com pessoas sempre foram elevados nas empresas brasileiras e a razão disso é a legislação trabalhista, que precisa se adequar às novas exigências da sociedade, cada vez mais lastreada no valor e na educação.
Quando a crise econômica passar – e ela vai passar -, terão os melhores resultados as empresas que tomarem decisões a respeito da gestão de pessoas baseadas em metodologias e instrumentos inteligentes de planejamento e de avaliação da força de trabalho. Números sobre a qualidade e o perfil da força de trabalho passam a ser fundamentais na reordenação de processos, de metas e de rumos.
kicker: Dispensar pode significar jogar fora capital humano, ainda mais útil na crise