Se há uma coisa que o secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Timothy Geithner, aprendeu ao observar o Japão afundar numa estagnação econômica de uma década, é: não vacile.
Geithner está deixando os erros de Tóquio bem presentes na mente agora que ele e o resto da equipe econômica do presidente Barack Obama lidam com a profunda recessão e a persistente crise de crédito dos EUA. Lembrando como as autoridades japonesas prolongaram a letargia ao se equivocarem nas medidas de gastos públicos, taxas de juros e socorro aos bancos, Geithner está liderando o ataque em favor de uma resposta de grandes proporções à crise americana, que inclui um pacote de estímulo de quase US$ 890 bilhões, ajuda aos mutuários da casa própria e um renovado esforço para ajudar as instituições financeiras a se livrar de seus investimentos ruins.
A crise dos EUA \”está drasticamente pior hoje porque as autoridades foram coletivamente um pouco lentas para ampliar (suas medidas) tanto no lado fiscal quanto no financeiro\”, disse Geithner numa entrevista recente ao Wall Street Journal. Ele recorda os debates de 2008 sobre qual era o maior risco, a inflação ou a crise, e sobre se as autoridades deveriam \”tentar ensinar uma lição às pessoas ou salvar o país (…), que tornaram o medo e o pânico piores do que deveriam ter sido\”.
Com seu novo plano, o governo \”vai fazer o máximo\” para aplicar a lição japonesa, disse Geithner. \”Certamente, a política monetária tem sido muito agressiva, e a política fiscal está para ficar muito agressiva.\”
Ainda assim, observou, é inevitável alguma dor. \”O Japão teve uma enorme bolha antes\”, disse. \”E ia ser um processo de ajuste doloroso, demorado, de qualquer maneira.\”
Geithner deve delinear as bases da estratégia do governo para lidar com a crise no começo da semana que vem. Seu discurso deve cobrir uma gama variada de temas, de um novo resgate dos bancos a um plano de prevenção das execuções de hipotecas e uma reforma do sistema de regulamentação financeira. Incluindo o pacote de estímulo, o governo Obama deve comprometer trilhões de dólares em dinheiro do contribuinte para dar um empurrão na economia.
Geithner era um funcionário principiante do Departamento do Tesouro – o Ministério da Fazenda americano – em 29 de dezembro de 1989, quando o índice Nikkei de ações japonesas atingiu seu recorde histórico de 38.915,87 pontos, alimentado por preços estratosféricos de imóveis, e a partir daí começou um mergulho do qual nunca se recuperou. (Ontem, fechou a 7.825,51 pontos.) Alguns meses depois, Geithner chegou a Tóquio e assumiu o cargo de adido financeiro assistente da Embaixada dos EUA.
Não ficou logo evidente que a economia japonesa, que havia inspirado temor e assombro nos EUA durante os anos 80, estava entrando num declínio prolongado.
Durante os dois anos de Geithner em Tóquio, e depois que ele retornou para uma série de cargos de mais alto escalão em Washington, ele e outros funcionários do Tesouro se convenceram de que o Japão estava enfrentando uma dose tripla de problemas econômicos que seus líderes relutavam em combater. A economia do país estava estagnada. Seus bancos e corretoras estavam carregados de créditos de liquidação duvidosa. O iene estava tão forte que diluía a estratégia de crescimento puxada pelas exportações.
Lawrence Summers, na época o chefe e mentor de Geithner, hoje chefe do Conselho Econômico Nacional de Obama, pressionou insistentemente os japoneses a tentar impulsionar sua economia com mais gastos, juros mais baixos e limpeza dos créditos podres dos bancos.
\”O Japão estará muito melhor posicionado para reparar a saúde de seu sistema financeiro e desfrutar dos benefícios de um sistema financeiro mais liberalizado se o governo adotar com sucesso políticas para cumprir seu compromisso com o crescimento puxado pela demanda interna\”, disse Summers num discurso de 1997 na Sociedade Japão de Nova York.
Como um dos poucos especialistas em Japão no Tesouro, Geithner esteve entre os que passaram esse recado. Durante anos, houve pouco efeito. Por medo de inflação, as autoridades japonesas foram tímidas no corte das taxas de juros. Por medo de déficits, fizeram aumentos de impostos depois de grandes pacotes de gastos públicos, anulando qualquer estímulo.
\”A política monetária foi muito lenta para responder\”, disse Geithner. \”A política fiscal foi muito hesitante e depois fazia muito ziguezague.\”
Da mesma maneira, as autoridades japonesas hesitaram em reconhecer o óbvio – que os bancos japoneses foram erguidos sobre um castelo de cartas – e em adotar medidas impopulares para deixá-los sobre bases mais sólidas. Foi só relativamente tarde na década, quando os bancos começaram a quebrar, que as autoridades japonesas injetaram dinheiro público no sistema e estabeleceram uma entidade para dar cabo dos créditos podres.
\”O instinto inicial é sempre de apostar na esperança, não na realidade\”, disse Geithner, referindo-se à tendência dos bancos de minimizar seus problemas.
Assim como a crise japonesa, a americana foi provocada por um colapso dos preços de imóveis. As inadimplências e execuções judiciais que se seguiram enfraqueceram ou mesmo destruíram bancos e firmas de investimento que haviam aplicado pesadamente em títulos lastreados por créditos imobiliários. Apesar das injeções de centenas de bilhões de dólares pelo Federal Reserve, o banco central, e de um pacote de socorro do governo de US$ 700 bilhões, muitas instituições ainda resistem a emprestar, o que deixa as empresas e as pessoas incapazes de obter crédito e a economia numa recessão profunda.
\”Há uma enorme tentação a ver a luz no fim do túnel antes que ela esteja realmente lá, e portanto de meio que mudar para a contenção antes que a recuperação esteja plenamente estabelecida\”, disse Geithner.