OMinistério da Fazenda concentra esforços para adiar ao máximo uma elevação da taxa básica de juros da economia (Selic) pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC). O objetivo do ministro Guido Mantega e sua equipe é fazer com que, se possível, a taxa básica de juros suba apenas no fim do segundo semestre. Depois da redução da alíquota da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) cobrada sobre os combustíveis, o Ministério se prepara agora para lançar novas medidas preventivas, para evitar um aumento da inflação que force a uma postura mais agressiva do BC na definição dos juros.
Mantega considerou positiva a reação do mercado ao anúncio da redução da Cide na noite de quarta-feira, às vésperas da divulgação da ata do Copom. Mesmo com tom conservador, como o mercado esperava, as taxas de juros no mercado futuro caíram (ao contrário das expectativas dos analistas econômicos). Isto ocorreu, pelo menos em parte, em resposta à decisão do Ministério da Fazenda de trabalhar em conjunto com o BC para evitar um processo de aceleração da inflação. “O ministro está conseguindo administrar as expectativas e isso é muito bom. A Fazenda vai monitorar de perto o mercado e agir sempre antecipadamente”, assegurou uma fonte da Fazenda.
Com essa estratégia, o ministro não quis esperar a divulgação da ata na quinta-feira para anunciar a mudança na Cide, para que não se consolidasse no mercado a avaliação de que o aumento da Selic em março e abril seria inevitável. Além do efeito político em ano de eleições, o momento de uma eventual subida da taxa Selic é considerado fundamental para dar tempo de maturação dos projetos de novos investimentos, que podem evitar o risco de um descompasso entre a demanda e a capacidade de produção da indústria nacional para atender ao aumento do consumo, que é a principal preocupação do BC.
No arsenal de medidas que a Fazenda tem nas mãos estão, além da já implementada redução da Cide, a possibilidade de reduções setoriais de imposto de importação (II) e maior ênfase no discurso e no efetivo cumprimento da meta fiscal cheia de 3,3% do Produto Interno Bruto (PIB) de superávit das contas do setor público. Mantega e os técnicos também consideram que o BC, caso veja um risco importante de desvio da inflação da meta de 4,5%, pode primeiro lançar mão de aumentar o recolhimento compulsório dos bancos antes de elevar a Selic. O ministro, inclusive, já começou a conversar esta semana com o presidente do BC, Henrique Meirelles, sobre a importância de se aumentar os compulsórios dos bancos antes de um movimento de elevação dos juros básicos.
A principal vantagem do aumento do recolhimento do compulsório é que não gera impacto fiscal para o governo na rolagem da dívida pública, ao contrário da alta da Selic. Além disso, ajuda a conter a demanda interna – já que encarece o custo do crédito bancário -, mantendo em níveis mais baixos os juros das aplicações financeiras (referenciados na taxa Selic), o que, teoricamente, favorece o ímpeto dos empresários para investir, em vez de deixar o dinheiro parado para ganhar juros.
Apesar de buscar alternativas para o controle da inflação que deixem a Selic como o recurso final da política anti-inflação, a Fazenda avalia que ainda não se pode dizer que está se desenhando um cenário de inflação de demanda ou mesmo de desvio do IPCA da trajetória de meta. Os técnicos avaliam que a deflação dos IGPs em 2009 ajuda a conter os preços administrados e de serviços em 2010. Além disso, o fim das desonerações tributárias e o cumprimento da meta cheia (sem abatimentos) de superávit primário das contas do setor público contribuem para o arrefecimento da demanda e para o controle inflacionário.
SEM PRESSÃO. Mantega reiterou na quinta-feira sua avaliação de que o Brasil está crescendo de maneira equilibrada e sem pressões inflacionárias. Em balanço sobre o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o ministro disse também que conversou na véspera com o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, que também estaria “tranquilo” com o ritmo da economia.
Perguntado se, diante da atividade em recuperação, os depósitos compulsórios subiriam antes do juro no País, Mantega disse que este é um assunto do Banco Central e do Conselho Monetário Nacional (CMN). “Não há nada previsto nesse sentido neste momento.”
O ministro também foi questionado sobre o tom da ata do Comitê de Política Monetária (Copom), mas disse que ainda não havia lido o documento. O colegiado do BC avaliou na ata que, em meio aos sinais de retomada da demanda doméstica, os riscos para a inflação podem aumentar, e que a política monetária precisa ser “especialmente vigilante”.
Mais cedo, Mantega destacou que o investimento “floresce” no País e estimou expansão de 16% a 20% nesse indicador. Sobre o crédito, o ministro disse que “estamos crescendo em um ritmo de 15% e vamos crescer a 20%”. O ministro também reafirmou o compromisso com a meta de superávit primário de 3,3% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano. “Vamos ter todo esse sucesso econômico mantendo o equilíbrio das contas públicas.”
A ata do Copom levou os economistas a rever suas projeções para o início do ciclo de aperto monetário. De quatro economistas entrevistados pela reportagem, três não descartam uma possível alta dos juros básicos já em março, e não mais em abril; já outro economista alterou sua projeção para alta dos juros em junho, e não mais em setembro.
BAIXA RENDA. A alta de 1,32% da inflação das famílias de baixa renda em janeiro, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor – Classe 1 (IPC-C1), foi a mais intensa desde maio de 2008, quando avançou 1,38%, segundo o economista da Fundação Getúlio Vargas (FGV) André Braz. O IPC-C1 mede o impacto de preços percebido por famílias com ganhos mensais entre um e 2,5 salários-mínimos.
Em fevereiro, a inflação no varejo deve seguir bem menos pressionada, não só para as famílias de baixa renda, mas para todas as faixas de renda. Braz lembrou que reajustes de preços realizados no mês passado já foram captados pelo índice e não devem pressionar novamente, de forma expressiva, a inflação ao consumidor. “Temos outros reajustes previstos, como de tarifa de gás no Rio e de metrô em São Paulo, mas estes são de menor magnitude do que os realizados em janeiro. A previsão é de que a taxa do IPC-C1, e de outros IPCs (calculados pela FGV) deve cair pela metade em fevereiro, em relação a janeiro”, comentou.
Um dos maiores impactos para o avanço da inflação da baixa renda foi a disparada no preço de tarifa de ônibus urbano (de 0% para 5,39%), que representa 90% da inflação do grupo Transportes. Isso porque houve um reajuste de 15% na tarifa de ônibus em São Paulo, que impulsionou a movimentação de preços no grupo. Segundo Braz, a inflação em Transportes, em janeiro, foi a mais intensa desde dezembro de 2006, quando o grupo teve alta de 6,06%.