Em mais uma decisão acertada, o Juízo competente pelo Anexo Fiscal de Ribeirão Pires/SP acolheu a tese amplamente divulgada pelo escritório Édison Freitas de Siqueira, de ser o sócio parte ilegítima para figurar no pólo passivo de Execução Fiscal movida contra a empresa, tal entendimento se deu no julgamento de Exceção de Pré-Executividade na Execução Fiscal nº 505.01.2004.006846-5, proposta pelo escritório em defesa de seu cliente/contribuinte, in verbis:
DECIDO. Inicialmente, no que concerne à alegada ilegitimidade passiva dos sócios, vê-se que a matéria em discussão, em suma, cinge-se em saber da possibilidade da automática inclusão do sócio-gerente no pólo passivo de execução fiscal em que seja executada a sociedade, nos termos do art. 135, III, do CTN, mediante a consideração da mera inadimplência como infração à lei a que alude o dispositivo em questão. Veja-se que é indiscutível a possibilidade da responsabilização dos diretores, gerentes e representantes da sociedade em caso de gestão abusiva e fraude. Eis a norma do CTN, art. 135, III: “São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: (…) III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado”. A questão é, em suma, definir-se a mera inadimplência como infração à lei apta a ensejar a extensão da responsabilidade na forma da regra supra, o que acarretaria a automática possibilidade de inclusão dos sócios-gerentes no pólo passivo em qualquer caso em que restar inadimplida a obrigação tributária. Conforme leciona Hugo de Brito Machado a matéria constitui objeto de tormentosa discussão doutrinária e jurisprudencial que não é recente. Há quem entenda, inclusive com apoio em decisões proferidas pelo antigo Tribunal Federal de Recursos, que o não recolhimento do tributo representa infração à lei capaz de ensejar a aplicação do art. 135, III, do CTN (cf. Curso de Direito Tributário. 26º ed., São Paulo, Malheiros, 2005, p. 167). Apesar disto, não nos parece seja esta a melhor exegese do texto legal. É que a assim considerar-se a norma em questão, e estaríamos a verdadeiramente nulificar a doutrina da separação da personalidade e patrimônio entre sócios e sociedade, de construção tradicional sólida no ordenamento pátrio. Trata-se de garantia que se oferece àquele que se lança ao negócio, como contraprestação ao risco que assume. Garante-se que em caso de eventuais inadimplências, seu patrimônio pessoal estará resguardado das incursões de credores. É certo que se formou a teoria da desconsideração para casos de uso abusivo e fraudulento da personalidade jurídica (espécie de abuso do direito – CC, art. 187). Ocorre que ao considerarmos toda e qualquer inadimplência como infração da lei capaz de admitir a desconsideração da personalidade jurídica estaremos simplesmente negando por completo a doutrina em questão, não só em matéria tributária. Há que se distinguir a simples mora no pagamento, decorrente de circunstâncias de mercado, daquela decorrente da gestão fraudulenta e abusiva. A estes casos é que se reserva o art. 135, III, do CTN.
A decisão acima colacionada, em seu trecho onde reconhece a ilegalidade em incluir o nome do sócio em execução fiscal, pormenorizou os requisitos tutelados no artigo 135 do Código Tributário Nacional, que é taxativo quanto a possibilidade de o sócio figurar no pólo passivo, o aludido artigo assim refere:
Art. 135 – São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:
I – as pessoas referidas no artigo anterior;
II – os mandatários, prepostos e empregados;
III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado
A União Federal, ao propor a Execução Fiscal visando desde seu início a responsabilização conjunta do sócio, não respeita a individualização do patrimônio da pessoa jurídica e da pessoa física, ferindo gravemente o diploma que rege as relações tributárias, pois é evidente que a inadimplência no pagamento de tributos não pode de forma alguma ser vista como ato praticado com excesso de poder ou infração de lei, contrato social ou estatuto, requisitos para a legitimação passiva do sócio.
O notório motivo da inadimplência é a pesada carga tributária que vige em nosso país, que torna quase impraticável o exercício da atividade empresarial, fonte de geração de empregos, riquezas para o povo, e por conseqüência, de tributos para o Estado, que, não fosse a forma predatória com a qual atua o FISCO não necessitaria ingressar com ações judiciais contra os contribuintes, estes, se vêem sem condições de adimplir com suas obrigações tributárias tendo em vista a incidência de multas e juros exorbitantes.
O simples inadimplemento não pode caracterizar a “infração à lei” disposta no inciso III do artigo 135 do CTN, ou estaríamos diante da anulação de todo o entendimento consolidado em nossa doutrina e jurisprudência no que tange a separação do patrimônio do sócio e da sociedade, geraria uma insegurança tamanha que não seria valioso correr o risco de se lançar à atividade empresarial, pois mesmo sem culpa ou dolo, poderíamos ter nosso patrimônio pessoal esbulhado pelo Estado, aquele que deveria nos oferecer proteção e incentivo.
Saliente-se que o presente caso não traz o uso abusivo da personalidade jurídica, como saliente o artigo 187 do Código Civil, que assim disciplina:
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
Estamos diante de um caso de inadimplência por circunstâncias alheias a vontade do sócio, por ocasião de mercado, de aplicação exorbitante de multas e juros e não por simples fraude, o que seria tipificado como ato ilícito (art.187/CC), fazendo jus a aplicação do disposto no artigo 135 do CTN.
Ademais, imperioso ressaltar que o presente entendimento se encontra pacificado no Superior Tribunal de Justiça, que editou na data de 24 de março do corrente ano a Súmula de nº 430, que tem a seguinte redação:
Súmula n.º 430/STJ – “O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente.”
Apesar de ser prática comum da Fazenda a tentativa de incluir sócios no pólo passivo de execuções fiscais, é de bom grado que trazemos ao público decisões como a presente, que garantem a incolumidade da lei, de forma que o contribuinte possa perseguir seu sonho empreendedor, gerando riquezas e empregos, cumprindo com suas obrigações da forma menos onerosa para sua manutenção. É neste sentido que o Escritório Édison Freitas de Siqueira seguirá trabalhando.
Dr. Thiago Lima