O mercado tem visto com bons olhos o fato da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) ter recusado uma proposta do governo visando encerrar o processo que investiga um suposto descumprimento da União Federal do artigo 115, da Lei das S.A.. O descumprimento teria ocorrido durante a participação do governo na assembleia geral extraordinária da Eletrobras em dezembro de 2012, que teria aprovado a renovação de concessões de acordo com a Medida Provisória 579/2012. Essa medida determinou que fosse antecipada a concessão de geração e transmissão de energia e teria gerado prejuízos à Eletrobras no ano seguinte.
O Termo de Compromisso que o governo apresentou em abril na tentativa de extinguir o processo indicava a realização de um evento com tema relacionado ao mercado de capitais e à economia brasileira, com a participação de Mantega e de líderes do setor.
O artigo 115, parágrafo 1 da Lei das S. A., diz que o acionista deve exercer o direito a voto no interesse da companhia e que será considerado voto abusivo aquele exercido com o fim de causar dano à companhia ou a outros acionistas ou a obter vantagem ou que possa resultar em prejuízo para a empresa ou outros acionistas. De acordo com o professor Aureliano Bressan, doutor em Economia aplicada, é difícil saber o que a União pode sofrer casos seja responsabilizada pela acusação de descumprimento desse artigo, visto que é possível que o caso não possua precedentes no mercado brasileiro. “Cabe ressaltar que, mesmo que ele se arraste por mais algum tempo nas esferas decisórias da CVM, ainda é possível uma Ação Coletiva de Responsabilidade Civil, por parte dos acionistas minoritários, via Procuradoria Geral da República, para responsabilizar a União por prejuízos aos investidores minoritários, com uma possível ação indenizatória”, lembra.
Para o professor, a decisão da CVM de não aceitar a proposta que o governo apresentou foi correta, dado que a decisão do acionista majoritário teria entrado em claro conflito de interesses com os acionistas minoritários. “A mudança das regras para renovação antecipada trouxe benefícios ao controlador (União), mas prejuízos à empresa e, consequentemente, a seus acionistas minoritários”, explica.
Antes da recusa, a Procuradoria Federal Especializada (PFE) havia sugerido que o evento fosse realizado até o final de 2014 e teria dito ainda que a proposta ofertada pela União para a celebração de Termo de Compromisso estaria em consonância com a finalidade da CVM. A PFE teria dito ainda que o evento poderia ser considerado suficiente para desestimular práticas assemelhadas e para bem nortear a conduta dos participantes do mercado de capitais.
Sobre esse evento voltado para o mercado de capitais e à economia brasileira recusado pela CVM, o professor Bressan acredita que não seria uma boa forma de compensar as possíveis perdas sofridas. Porém, diz que seria sim, uma boa oportunidade para o debate de políticas de transparência e respeito ao acionista minoritário em empresas controladas pela União. “seria interessante a participação de especialistas de mercado, não só da própria CVM, mas também do IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa) IBRI (Instituto Brasileiro de Relações com Investidores), Apimec e Anbima”, enumera.
Bressan pontua também que para falar se os prejuízos calculados pelos acionistas minoritários são condizentes com a realidade é importante ter primeiro acesso aos dados e aos critérios utilizados pelos conselheiros para elaboração destes cálculos. “Mas é certo que o prejuízo é significativo, não só para a Eletrobrás, e compromete a imagem das companhias abertas controladas pela União”, diz.
Sobre o panorama geral do caso, o professor diz que não há dúvidas que está havendo um represamento nos preços da gasolina e da energia elétrica para segurar a inflação. “A estratégia do governo de segurar preços administrados para contrabalançar a alta na inflação dos serviços (na casa de 10% a.a.) é fato já reconhecido no mercado, e precificado nas ações da Petrobrás e das distribuidoras de Energia”, afirma.
Contudo o governo continua negando sua possível atuação na administração dos preços da gasolina e da energia elétrica. Em maio, um mês após a entrega do Termo de Compromisso pelo governo, o ministro Guido Mantega declarou que o governo não está segurando preços para conter a inflação. Mantega rebateu as acusações dizendo que foram feitos reajustes recentes de gasolina e da alta da energia elétrica.